sábado, 24 de setembro de 2022

COMENTÁRIO LITÚRGICO - 26º DOMINGO COMUM - 25.09.2022

 

COMENTÁRIO LITÚRGICO – 26º DOMINGO COMUM – RICOS E POBRES – 25.09.2022


Caros Confrades,


Nas leituras litúrgicas deste domingo, encontramos uma sequência da mesma temática do domingo anterior: a responsabilidade na administração dos bens materiais. A imagem anterior foi a do infiel administrador com sua elogiável esperteza. Agora, Jesus usa a imagem do rico esbanjador, contando aos fariseus a parábola do homem, em cuja casa abundavam futilidades, fazendo o contraponto com o vizinho pobre, que não tinha nem o básico para viver. Mas Jesus não afirma que o rico deveria repartir os seus bens com o pobre vizinho e nem diz que o acúmulo da riqueza nas mãos de algumas pessoas seja algo intrinsecamente mau. Contudo, adverte que os bens dos mais abastados devem ser postos a serviço dos mais necessitados, pois eles são apenas administradores da riqueza.


A primeira leitura, retirada do Profeta Amós, contém uma advertência que é muito apropriada para os dias atuais, quando a polarização do embate político põe em evidência a disparidade existente entre as classes sociais. Este profeta, que viveu cerca de 800 anos antes de Cristo, era um agricultor, uma pessoa de baixa instrução e experimentou uma situação parecida com a de hoje, em que há grande concentração de riqueza nas mãos de uns poucos, enquanto a grande maioria da população sofre a falta dos bens essenciais. A diferença é que o governo hebreu não distribuía “bolsas” de ajuda financeira para melhorar a situação da pobreza e muitos chegaram a ser escravizados, por não terem como pagar as dívidas. Em tempos passados, a inadimplência podia transformar o devedor em escravo do credor, o que era uma situação desesperadora. Daí a grave advertência do Profeta contra “Os que dormem em camas de marfim, deitam-se em almofadas, comendo cordeiros do rebanho e novilhos do seu gado; os que cantam ao som das harpas, ou, como Davi, dedilham instrumentos musicais; os que bebem vinho em taças, e se perfumam com os mais finos ungüentos e não se preocupam com a ruína de José. ” (Amós 6, 4-6) O reino de Israel (naquela época, o povo hebreu estava dividido em dois reinos – Israel ao norte e Judá ao sul) passava por um momento de prosperidade, tendo vencido os inimigos e auferido grandes riquezas, no entanto, apenas alguns privilegiados usufruíam disso, em detrimento da maioria da população. Por isso, o Profeta dirige sua ira contra a elite dos hebreus os que dormem em camas de marfim e deitam-se nas almofadas para se banquetear, sem tomar conhecimento da carência dos demais cidadãos. Vemos que Amós não condena a riqueza dos israelitas abastados, o que ele recrimina é a falta de solidariedade com os carentes, com aqueles que estavam sendo escravizados por não poderem pagar suas dívidas. Sendo Amós um agricultor, ele conhecia bem a situação dos camponeses. Deus o chamou a profetizar por causa da sua vida justa, mas também por causa do conhecimento que ele possuía sobre a situação dos mais necessitados. Porque sua pregação incomodava as autoridades políticas e religiosas, Amós foi expulso da cidade, não sem antes rogar uma praga no Sumo Sacerdote que o expulsara, além de anunciar a ruína que viria sobre eles.


Na segunda leitura, retirada da primeira carta de Paulo a Timóteo, o Apóstolo continua chamando a atenção do seu discípulo para manter a fidelidade da sua vocação. “Combate o bom combate da fé, conquista a vida eterna, para a qual foste chamado e pela qual fizeste tua nobre profissão de fé diante de muitas testemunhas.(1Tim 6, 12) E acrescenta: “guarda o teu mandato íntegro e sem mancha até a manifestação gloriosa de nosso Senhor Jesus Cristo.(vers. 14) Timóteo fora consagrado bispo por Paulo, para cuidar da igreja de Éfeso, que era uma comunidade cheia de muitas tensões, por causa da grande força dos pagãos do lugar. Paulo exorta Timóteo a guardar a coerência das suas atitudes, não se deixando levar pelas pressões que viesse a sofrer da parte dos poderosos. Consta-se na história que Timóteo terminou sendo apedrejado por esses infiéis, por questões religiosas. Fiel a Paulo e a Cristo, ele morreu e não fraquejou na sua fé.


Temos no evangelho de Lucas (16, 19-31) aquela conhecida parábola de Cristo sobre o rico esbanjador frente ao pobre e pestilento mendigo, que esmolava na sua rua. Como de costume, a parábola narrada por Jesus era dirigida aos fariseus e Lucas realça os detalhes, para chamar a atenção dos seus leitores. É interessante observar aqui duas coisas: 1. esta parábola consta apenas no evangelho de Lucas, devendo ter sido colhida numa fonte que os demais evangelistas não conheceram; 2. Jesus não diz o nome do rico, apenas do pobre (Lázaro). É costume mencionar-se o “rico epulão” e isso pode levar alguém a imaginar que este é o nome dele, no entanto, “epulão” significa “comilão”, palavra derivada do verbo latino “epulor” (banquetear-se). São Jerônimo, na sua tradução da vulgata, escreveu que o rico se banqueteava diariamente (dives epulabatur cotidie). Jesus faz um paralelo bem contrastante entre os dois personagens, para chamar a atenção sobre o abismo social que os distanciava. Um deles possuía bens em demasia, enquanto o outro passava fome; o primeiro tinha uma casa luxuosa, o outro era um morador de rua; o primeiro era saudável, alimentava-se bem, já o outro era cheio de úlceras e esquelético de fome. A pedagogia dos contrastes, adotada por Jesus, tinha como objetivo chamar a atenção para a injustiça da riqueza que não é utilizada para atenuar o sofrimento do pobre. Tal como o profeta Amós, muitos séculos antes, Jesus não condenou o rico pelo fato de ele ser rico, mas sim por causa do seu egocentrismo, da sua falta de solidariedade. O pobre desejava pelo menos as migalhas que caíam da sua mesa, mas nem isso lhe davam. (Lc 16, 21) Na época de Jesus, os fariseus eram os ricos do povo, assim como no tempo de Amós, eram os sacerdotes de Israel que faziam parte da classe social mais elevada. Tal como Amós bradava contra o sacerdote Amasias, que terminou por expulsá-lo da cidade, Jesus clamava para que os sacerdotes judeus saíssem da sua redoma de autossuficiência e chegassem mais próximo do povo, que eles dirigiam, deixando-os assim cada vez mais irados. Tanto quanto a pregação de Amós incomodava o rei e os sacerdotes de Israel, também a exortação de Jesus incomodava os sacerdotes e doutores da lei do seu tempo. Por fim, nem os ricos do tempo de Amós se converteram, nem tampouco os fariseus, e ambos tiveram como resultado a destruição das suas cidade pelos inimigos.


Merece uma referência também aqui neste contexto o diálogo “post mortem” do rico com Abraão, junto de quem Lázaro foi morar, e que padecia no local dos tormentos. O rico fez dois pedidos, ambos recusados: 1. manda que Lázaro molhe o dedo e me refresque a língua; 2. manda que Lázaro vá avisar meus irmãos. Quanto ao primeiro pedido, Jesus disse ser impossível, porque há um grande abismo, intransponível entre eles; quanto ao segundo, Ele diz que os irmãos do rico não acreditariam em Lázaro. Aqui nós podemos fazer as seguintes reflexões: a) o rico não cedeu suas migalhas ao pobre, no entanto, queria que este fosse refrescar a sua língua com uma gota d'água, ele se sentia merecedor, sem ter realizado nenhuma ação meritória; b) o rico demonstrou solidariedade com os irmãos dele e queria que Lázaro fosse avisá-los, porém não teve solidariedade com o mendigo em sua porta; c) os fariseus, assim como aquele rico, não davam ouvidos aos profetas e às escrituras, mas criavam suas próprias regras religiosas, enquanto Jesus estava ali (como se fosse Lázaro que veio avisar) e eles não lhe davam qualquer crédito; d) o “lugar dos tormentos” (“inferno”, segundo o texto latino) não é um mar de fogo com o demônio empunhando um tridente, como aparece nas gravuras medievais, mas era a própria consciência do rico, que ardia em arrependimento.


Podemos ainda avançar nessa linha de raciocínio, para concluir o seguinte: Jesus disse que havia um grande abismo entre o local do gozo e o local dos tormentos, mas quanto o rico pediu para que Lázaro fosse avisar aos irmãos ainda vivos, Jesus não disse que isso era impossível, disse apenas que eles não acreditariam. Esticando um pouco essa interpretação, podemos alvitrar que Jesus não se posicionou contrariamente à possibilidade de comunicação entre as pessoas que estão no mundo do além com os viventes, apenas referiu-se à incredulidade destes. “`Se não escutam a Moisés, nem aos Profetas, eles não acreditarão, mesmo que alguém ressuscite dos mortos'.(Lc 16, 31) Isso é apenas um palpite, porque sabe-se que Lucas não escutou as pregações de Jesus, então não se pode dizer que ele tenha ouvido Cristo dizer isso. Considerando, por outro lado, que os evangelhos foram escritos com base em documentos produzidos na comunidade da época (as fontes esparsas), fica impossível afirmar-se com certeza que tenha sido esta a mensagem de Cristo ou se foi o entendimento da comunidade onde o texto original foi escrito. De qualquer forma, podemos concluir que as primeiras comunidades cristãs não viam como impossível a comunicação com o outro mundo, como posteriormente passou a ser afirmado pela doutrina teológica. A cultura grega, dominante no ambiente em que esse texto foi escrito, via essa comunicação entre o mundo dos mortos com o mundo dos vivos como uma possibilidade. Os filósofos gregos órficos faziam “sessões secretas” onde, segundo eles, isso acontecia.


Mas, voltando ao tema básico da liturgia, a lição que retiramos das leituras deste domingo é o uso responsável e caritativo dos bens que Deus nos dá, ou seja, a solidariedade com os mais carentes.


Cordial abraço.

Antonio Carlos


sábado, 17 de setembro de 2022

COMENTÁRIO LITÚRGICO - 25º DOMINGO COMUM - 18.09.2022

 

COMENTÁRIO LITÚRGICO – 25º DOMINGO COMUM – SERVIR A DOIS SENHORES – 18.09.2022


Caros Confrades:


As leituras litúrgicas deste 25º domingo comum colocam para a nossa reflexão um tema político muito apropriado para tempos de campanha política, quando mais do que em outros tempos: a honestidade dos dirigentes públicos, em todas as esferas do poder estatal. Isso ocorre não apenas no Brasil, mas é uma consequência da tecnologia de comunicação global, através da qual os cidadãos de todo o mundo discutem e exigem a probidade dos seus representantes nas casas legislativas. A liturgia deste domingo põe em destaque um tipo censurável de conduta que, embora lamentável, é bastante frequente nos homens e mulheres ligados à administração pública: aproveitar-se do mandato eletivo para promover a locupletação própria. Daí a advertência de Jesus: ninguém poderá servir de modo digno a dois interesses – o público e o privado.


Na primeira leitura, retirada do livro do Profeta Amós (Am 8, 4-7), o discurso do profeta até parece que se refere ao estereótipo do “político profissional” do nosso país, sempre mais interessados em esfolar os concorrentes e enganar os eleitores, em proveito próprio. Tudo vale para conseguir maior número de sufrágios, até mesmo eliminar o adversário moralmente ou pior, fisicamente. No tempo do profeta Amós, ainda não havia os modelos políticos do capitalismo nem do comunismo, nem a economia de mercado nem a globalização, mas um sistema social arcaico, baseado na teocracia, e um sistema econômico também arcaico, fundado em grande parte na modalidade do escambo. Mas lamentavelmente as práticas de corrupção e de engodo da população já existiam, assim como as práticas comerciais escusas de fraudar balanças, diminuir medidas, inflacionar o preço para conseguir lucrar sempre mais. Portanto, desde os tempos do Profeta Amós, cerca de 800 anos antes de Cristo, a cobiça dos governantes e dos comerciantes já era alvo de reprovação pelos arautos de Javeh. Isso mesmo continuou a ocorrer nos séculos seguintes, dominados pela tradição romanista e depois pelo mercantilismo, que se instalou a partir do Renascimento. As mesmas práticas reprováveis de certos líderes sociais, que frequentemente são noticiadas nos dias de hoje, já ocorriam naqueles tempos. No livro de Amós, o profeta condena a injustiça social e a exploração gananciosa dos mais humildes. Fazendo-se as contas, podemos avaliar há quanto tempo esse tipo de prática vem sendo condenada publicamente e apesar disso nunca deixou de ser vergonhosamente replicada.


Na segunda leitura, retirada da carta de Paulo a Timóteo (1Tim 2, 1-8), o Apóstolo exorta à comunidade para que reze pelos administradores, pelos governantes, pelos que ocupam altos cargos, pois Deus quer que todos sejam salvos. Verifica-se, nas entrelinhas das palavras de Paulo, que os administradores públicos eram tidos por pessoas inescrupulosas, cuja ação não era agradável a Deus, daí porque era necessário orar por eles, para que cheguem ao conhecimento da verdade e sejam salvos. A preocupação de Paulo com os dirigentes da comunidade se faz sentir na necessidade de que os cristãos que ocupam cargos elevados devem dar exemplo aos não cristãos, para que a sua virtude seja imitada por estes. E para que isso aconteça, é importante a oração da comunidade em seu apoio. Naquela antiga oração que rezávamos após a bênção do Santíssimo Sacramento, havia um trecho que dizia assim, depois de orar pelo Papa, pelos Bispos, pelos administradores eclesiásticos: “rezemos por todas as pessoas constituídas em dignidade, para que governem com justiça”. E os vários documentos expedidos pelo Magistério da Igreja ao longo dos últimos séculos, desde o Papa Leão XIII, com a encíclica Rerum Novarum, tem dado continuidade a essa missão iniciada por Paulo no sentido de orientar os governantes no caminho da verdadeira justiça social. O Papa Paulo VI, na encíclica Populorum Progressio (1967) escreveu uma frase emblemática sobre a situação econômica na metade do século XX: o desenvolvimento é o novo nome da paz. A situação das nações em relação ao desenvolvimento de cada uma é o mecanismo de equilíbrio para a manutenção da paz mundial. De um modo indireto, isso quer dizer que a consciência dos administradores públicos, sobretudo dos países mais ricos, será determinante para que todas as nações vivam em paz. E podemos ver diariamente isso, na prática, e constatar o quanto o Papa estava com a razão. As guerras que eclodem em diversas partes do mundo são o contraponto dessa doutrina e vem para comprovar a sua validade.


No evangelho de Lucas, lemos hoje a conhecida parábola do administrador infiel. Esta parábola contém um forte paradoxo, destacando a pedagogia do contraditório, pois ao mesmo tempo em que Cristo elogia o comportamento do administrador inescrupuloso, Ele está querendo nos dizer: não façam assim como ele. No tempo de Cristo, a parábola se dirigia, como na maioria das vezes, aos fariseus e aos chefes do povo, que agiam de forma perdulária e opressora, transformando a religião judaica num emaranhado de regras e proibições, em que a prática exterior da religião era mais valorizada do que a intencionalidade do crente. No evangelho de Mateus (cap 23), Cristo faz essa mesma advertência com outras palavras, dizendo que os fariseus atam pesadas cargas e as colocam nos ombros do povo, enquanto eles mesmos não ajudam nem com o dedo para aliviar o peso. Noutro contexto, vemos repetida aí a mesma reprovação feita pelo Profeta Amós contra os administradores do tempo dele. E podemos encontrar semelhante atitude de reprovação no episódio em que Jesus expulsa do templo aqueles que vendiam rolinhas e carneiros para o sacrifício, chicoteando-os e quebrando suas bancas. “Ninguém pode servir a dois senhores. Porque ou odiará um e amará o outro, ou se apegará a um e desprezará o outro. Vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro”, diz o evangelista Lucas (16, 13).


Apesar dessa atitude de reprovação, Jesus utiliza o argumento do raciocínio inverso para elogiar o mau administrador, destacando a sua criatividade e inteligência: os filhos das trevas são mais hábeis nos seus negócios do que os filhos da luz (Lc 16, 8). E diz mais: usai o dinheiro injusto para fazer o bem... pois se não fordes fiéis no uso do dinheiro injusto, quem vos confiará o verdadeiro bem? (Lc 16, 9-11). Jesus está contrapondo as coisas da terra (dinheiro injusto) com as coisas do céu (verdadeiro bem). Aquele que possui bens materiais e/ou desfruta de poder social tem em mãos um 'dinheiro injusto', porque toda acumulação de bens nas mãos de alguém é resultado da falta daqueles bens nas mãos de outrem. Contudo, isso não é de todo mau, desde que a administração desses bens “injustos” esteja voltada para a satisfação das necessidades dos irmãos carentes. Este é o grande desafio que se põe para o cristão que administra bens particulares ou públicos. Jesus sabia que a sociedade sempre seria desigual, quando ele disse em João (12, 8): “pobres sempre tereis entre vós”. Ele sabia que mesmo a divulgação da sua doutrina não acabaria com as desigualdades sociais, mas, por outro lado, isso não seria empecilho para que os cristãos tivessem em suas mãos a responsabilidade de administrar bens materiais. Daí Ele dizer em Lucas (16, 8) que o dono do negócio elogiou a esperteza do seu administrador. Deus quer que nós tenhamos essa mesma “esperteza” com os bens injustos para que saibamos utilizá-los com sabedoria e disponibilizá-los em benefício dos pobres da comunidade.


A advertência de que “ninguém pode servir a dois senhores” não significa que existe uma incompatibilidade absoluta entre amar a Deus e administrar bens materiais, mas sim que o amor a Deus não pode competir com o amor desses bens, pois o amor a Deus não pode ter concorrência. A propriedade e a administração de bens materiais não nos deve desviar do amor a Deus, mas sim fazer-nos amá-lo ainda mais e isso ocorre quando os bens possuídos são postos a serviço da caridade e do amor ao próximo. Aquele cujo Deus é a riqueza ou o poder, este sim estará desvirtuando os bens recebidos e colocando-os a serviço do próprio egoísmo, tal como fez o mau administrador. Podemos dizer, em resumo, que a diferença entre o bom e o mau administrador está sintetizada naquele critério que Jesus já ensinara aos apóstolos e a todos nós, através da palavra do evangelista Mateus (6, 21): “porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”. Se o nosso tesouro estiver em Deus, o nosso coração não se apegará ao dinheiro injusto, mas nós saberemos administrá-lo para fazer amigos que nos receberão, depois, na morada eterna.


Que assim saibamos compreender a esperteza dos filhos deste mundo para conseguirmos colocá-la em prática no exercício da nossa fé.


Cordial abraço a todos.

Antonio Carlos.

sábado, 10 de setembro de 2022

COMENTÁRIO LITÚRGICO - 24º DOMINGO COMUM - 11.09.2022

 

COMENTÁRIO LITÚRGICO – 24º DOMINGO COMUM – A LÓGICA DE DEUS – 11.09.2022


Caros Confrades,


Nas leituras deste 24º domingo comum, sobressai o tema da misericórdia divina. O Papa Francisco, dirigindo-se aos peregrinos em Roma, abordou esse tema, afirmando ele que a alegria de Deus é perdoar. Isso me fez lembrar daquele oráculo do profeta Isaías, quando disse sobre Javeh que “os meus pensamentos não são os vossos pensamentos” (Is 55, 8), querendo dizer que a lógica de Deus é diferente da nossa. Para nós, seres humanos, perdoar nunca é uma alegria, ao contrário, o perdão é uma atitude dolorosa, que mesmo quando é exercitada de forma consciente, nem por isso deixa de passar uma sensação estranha de que algo está faltando. Precisamos evoluir muito na vivência dos ensinamentos de Jesus, para compreendermos essa lógica do perdão e mais ainda para conseguirmos pô-la na prática.


Na primeira leitura, do livro do Exodo (32, 7), Javeh se enfurece com os hebreus, que O substituiram por um bezerro de ouro e, na sua ira, quer exterminar o povo. Essa era a “personalidade” vingativa do Deus hebreu do Antigo Testamento, no entanto, ele recua diante das ponderações de Moisés. Se observarmos bem, temos aí dois comportamentos bem curiosos e atípicos. De um lado, a figura de um Javeh irado e violento, bem diferente do Pai que Jesus veio revelar na sua pregação. Para os hebreus, Javeh aparecia sempre como um pai raivoso, com o chicote na mão, mas mesmo assim, o povo teimava em desobedecê-lo, por isso era preciso que os profetas estivessem, a todo momento, recordando a promessa e o compromisso. Mas, por outro lado, Javeh aparece também como aquele pai compreensivo, manso e compassivo, dando ouvidos aos argumentos de Moisés, atitude que lembra a figura do Pai amoroso, apresentada por Jesus Cristo. Chega a ser um comportamento contraditório, pois Javeh, o todo poderoso, acima do qual não existe nenhum, no entanto, amolece diante de um subordinado. Essa é uma lógica totalmente diferente da nossa, como bem explicou o profeta Isaías: os meus pensamentos não são os vossos pensamentos.


Na segunda leitura, da carta a Timóteo (1, 12), Paulo humildemente se acusa e se penitencia por ter sido perseguidor da Igreja e agradece a misericórdia de Cristo, que o escolheu para a missão de pregador. E diz: “eu encontrei misericórdia porque agia com a ignorância de quem não tem fé”, para em seguida se classificar como o pior de todos os pecadores, aquele que está na cabeceira da fila do perdão. Do mesmo modo como Javeh, no Antigo Testamento, teve misericórdia para com o povo pecador, Cristo teve misericórdia para com ele, Paulo, e demonstrou-lhe a grandeza do Seu coração. Paulo tenta explicar, com outras palavras, a mesma lição de Isaías acerca dos pensamentos de Deus, que não seguem a lógica humana.


Porém, o exemplo mais perfeito dessa lógica diferenciada está no evangelho de Lucas (15, 1-32), em especial naquela conhecida história do filho esbanjador. Como em diversas outras ocasiões, Jesus usava figuras alegóricas para exemplificar o comportamento dos fariseus, os cumpridores da lei, que agiam assim como o filho mais velho da parábola, e não conseguiam entender o comportamento de Jesus, voltado para os pecadores (figura do filho esbanjador), algo totalmente diferente da lógica deles. Como é que Jesus, sendo filho de Deus (como se auto apresentava), ia reunir-se com os publicanos e pecadores, deixando de lado eles, os fariseus, os verdadeiros cumpridores da Lei, que nunca haviam abandonado a casa do Pai? Dentro da compreensão farisaica, publicanos e prostitutas eram pecadores públicos, ou seja, todo mundo peca, mas faz isso sigilosamente, de modo que as outras pessoas não ficam sabendo. Mas os publicanos e as prostitutas fazem isso abertamente, sem se incomodar que os outros saibam disso. As prostitutas, pela prática aberta da sexualidade, que sempre foi um tabu entre os hebreus e até o cristianismo, por muito tempo, também ensinava que o sexo existia apenas para a finalidade procriativa, não com finalidade recreativa. Os publicanos, pela natureza do seu ofício de cobrador de impostos, eram pessoas reconhecidamente corruptas, até mesmo aqueles que não recebiam propinas mas arrecadavam apenas o percentual regular, porque eles tiravam o dinheiro do povo hebreu para beneficiar os invasores romanos. Só isso já era o suficiente para eles serem considerados pecadores públicos. Para os judeus, o ato de tocar fisicamente nessas pessoas os deixava impuros também, era necessário fazer as abluções rituais, a fim de purificarem-se. O simples fato de estar junto com essas pessoas no mesmo ambiente físico, mesmo que involuntariamente, era também causa de impureza, havendo a necessidade das abluções purificadoras. Não obstante isso, Jesus se reunia com esse povo, comia com eles, conversava com eles sem qualquer cerimônia, sem receio de se contaminar, e não fazia as abluções purificadoras (nem Jesus nem seus discípulos). Os fariseus não entendiam como é que alguém, que se dizia cumpridor da lei, agisse assim. Sabendo do que se passava nos seus pensamentos, Jesus começou a contar as parábolas conhecidas como “da misericórdia”, que relatam a alegria pela recuperação de algo perdido (a ovelha perdida, a moeda perdida) ou de alguém que havia se perdido (o filho inconsequente). Jesus estava dizendo claramente, embora numa metáfora, para eles que o filho obediente, que se considerava justo e cumpridor dos deveres, eram eles próprios, os fariseus. Mas eles não conseguiam perceber isso, isso era muito difícil para eles compreenderem, e assim como aconteceu com eles, muitas vezes também os nossos pensamentos se embotam e nos impedem de descobrir o verdadeiro sentido das ações de Deus na nossa vida.


Pois bem. Não irei repetir aqui a história do filho aventureiro, porque todos a conhecem bem. Quero concentrar-me no diálogo entre o pai e o filho resmungão, porque encontramos ali dois padrões de pensamento completamente antagônicos. O filho mais velho não gostou nada daquela festa, sentiu-se até ofendido, e passou na cara do pai: Tu nunca me deste nem um cabritinho sequer para eu festejar com meus amigos. Quando chegou esse teu filho, que esbanjou teus bens com prostitutas, matas para ele o novilho cevado'.” Vejam bem: ele não disse “quando chegou esse meu irmão”, disse “esse teu filho”, ou seja, não reconhecia aquele viajante como seu irmão, da mesma forma como os fariseus não reconheciam os publicanos e pecadores como irmãos deles. Mas o pai, em suprema compreensibilidade, não recriminou a raiva do filho mais velho e lhe respondeu mais ou menos assim: você tem razão de estar zangado, masera preciso festejar e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido, e foi encontrado'.” Por outras palavras: foi o teu irmão que retornou, isso já é motivo bastante para alegria. O perdão e a misericórdia devem estar acima de qualquer rancor.


Se nós observarmos pelo aspecto da lógica humana, o pai estava sendo injusto, porque afinal o filho mais novo havia recebido a parte dele na herança e, teoricamente, havia renunciado a tudo mais. Do ponto de vista estritamente jurídico, ele não tinha mais direito a nada da parte do pai, por isso, ele chegou pedindo para ser admitido como empregado. Foi também nesse sentido o raciocínio do irmão mais velho: ele já recebeu a parte dele e ainda voltou pra levar mais, aquela parte que me pertence, eu estou sendo injustiçado. Era mais ou menos assim que os fariseus se sentiam, em relação aos pecadores (pois fariseus não se consideravam pecadores, e sim observantes da lei). Esses pecadores se refestelam com coisas que eles (fariseus) renunciam em nome da lei, beneficiam-se das coisas erradas (esbanjam os bens) e depois vêm querer se beneficiar também das promessas contidas na lei, que eles não cumprem. Isso os deixava indignados com Jesus.


Se observarmos agora pelo aspecto da lógica daquele pai misericordioso, a totalidade dos bens materiais passou a ter um valor insignificante diante do arrependimento do filho pecador. A parcela dos bens que ele recebeu e esbanjou não tem termo de comparação com o seu reencontro, com a mudança que se operou na sua personalidade. É uma mensagem semelhante àquela que está também em Lucas (7, 6), a respeito da pecadora que beijava os pés de Jesus na casa de outro fariseu: muito lhe foi perdoado porque muito amou. Aqui nos lembramos do discurso do Papa aos peregrinos: a alegria de Deus é perdoar. Para aquele pai que recuperou o filho, a alegria do seu retorno é infinitamente superior ao valor material dos bens que ele desperdiçou. O fato de ele ter retornado já demonstra o grau de arrependimento e de amor que lhe passava na alma. “Eu não sou digno de ser chamado de teu filho, trata-me como um de teus empregados...”, que conversa mais besta, pensou o pai, o teu retorno é o que de fato interessa.


Meus amigos, precisamos nos acautelar para não fazermos igual aos fariseus, quando estamos em situação de aparente superioridade em relação a alguém. Não devemos repetir como o filho mal criado “esse teu filho”, mas devemos imitar a resposta do pai “esse teu irmão”... O irmão necessitado que nos procura deve ser para nós motivo de alegria, pela oportunidade que temos de praticar o bem.


Cordial abraço a todos.

Antonio Carlos

sábado, 3 de setembro de 2022

COMENTÁRIO LITÚRGICO - 23º DOMINGO COMUM - 04.09.2022

 

COMENTÁRIO LITÚRGICO – 23º DOMINGO COMUM – O DESAPEGO – 04.09.2022


Caros Confrades,


Neste 23º domingo comum, a leitura do evangelho proclama a necessidade do desapego dos bens materiais, ou seja, ser pobre em espírito, esta que deve ser a atitude padrão de quem quer ser discípulo de Jesus. Desapegar não significa renunciar ou desprezar os bens materiais, mas colocá-los no segundo plano, deixando em primeiro plano os bens espirituais. No caso, o desapego não abrange apenas os bens de consumo e os objetos de valor, mas tudo aquilo que, de alguma maneira, impede ou dificulta a nossa vida cristã, inclusive as relações familiares. Este tema está presente também nas outras leituras: do livro da Sabedoria e da carta de Paulo a Filêmon.


Na primeira leitura, retirada do livro da Sabedoria (9, 13-18), o autor destaca uma doutrina que muito se assemelha com a teoria do filósofo grego Platão, quando ele contrapõe o mundo da matéria e o mundo das ideias. No versículo 15 do cap 9, lemos: “porque o corpo corruptível torna pesada a alma e, tenda de argila, oprime a mente que pensa.” A imagem do corpo como “tenda de argila que oprime a alma” faz eco com a narração da criação do homem, de acordo com o Gênesis, quando Deus fez o homem do limo da terra. O peso da matéria corporal impede a alma de alcançar os desígnios profundos de Deus. É o que diz no vers. 16: “Mal podemos conhecer o que há na terra, e com muito custo compreendemos o que está ao alcance de nossas mãos; quem, portanto, investigará o que há nos céus?” É curioso como essa doutrina filosófica, conhecida como dualismo, era comum entre os povos daquela época. O dualismo teve uma importância muito grande nos inícios do cristianismo, sendo defendida por vários teólogos cristãos, estudiosos de Platão. Santo Agostinho foi o principal deles e, anteriormente, ele tinha simpatia até pela doutrina da reencarnação, também ensinada por Platão, vindo depois a abandoná-la, pois observou que era incompatível com o cristianismo. Grande parte da catequese católica tradicional foi elaborada com base nessa doutrina, que ainda está presente também no catecismo oficial atual. Contudo, na época contemporânea, com a influência da filosofia fenomenológica, tanto a teoria de Platão quanto a de Aristóteles ficaram superadas com o conceito da subjetividade intencional, que procura unir corpo e espírito como uma realidade integrada, de modo que não se cogita mais em separação entre corpo e espírito. A doutrina filosófica contemporânea compreende o homem como um ser integrado de corpo e espírito, de tal maneira que este deve ser entendido como um corpo espiritualizado ou um espírito corporificado, não fazendo sentido referir-se a um sem incluir também o outro, assim como também não faz sentido falar-se em “separação” entre corpo e espírito, como se fossem duas realidades opostas e incompatíveis. A ressurreição de Cristo e também a assunção de Maria são fatos que demonstram, a título de antecipação, o que ocorrerá com todos os crentes, por ocasião de sua passagem para o plano da eternidade. Não é o espírito que “se salva”, mas a salvação abrande o ser humano inteiro, incluindo corpo e alma. Não o corpo-matéria, mas o corpo glorioso e desmaterializado, tal como sugere a estampa da efígie de Cristo no Santo Sudário.


Na segunda leitura, da carta de Paulo a Filêmon (9-17), o Apóstolo destaca a doutrina da reconciliação como uma atitude decorrente do desapego cristão. Nesta carta, encontramos três personagens em situações bastante diferentes: o apóstolo Paulo levando adiante a sua pregação do evangelho, o amigo dele Filêmon, um cristão rico que morava na cidade de Colosso e tinha uma igreja funcionando na sua própria casa, e o (ex) escravo Onésimo, que é o portador da carta. Paulo deixa entender, nas entrelinhas, que Onésimo tinha sido escravo de Filêmon e estava como fugitivo em Roma, onde o encontrou. Com muita discrição, Paulo não entra em detalhes sobre o provável motivo da fuga, no entanto, apenas a fuga por si mesma já era uma afronta ao patrão. O fato transparecido nas entrelinhas da carta é que Paulo encontrou Onésimo em Roma na prisão, onde ambos estavam enclausurados, e este aceitou o batismo, após a catequese de Paulo. Vindo a saber do vínculo anterior de Onésimo com Filêmon, de quem Paulo era amigo, este fez questão que Onésimo fosse reconciliar-se com seu antigo senhor, não para que ele retornasse à condição de escravo, mas dando seu aval ao amigo Filêmon da conversão de Onésimo e da sua nova condição de irmão na fé, a fim de que o ex-patrão o recebesse na sua casa como se fosse o próprio Paulo, reforçando desse modo aquela comunidade eclesial que Paulo bem conhecia. Ao pedir a Filêmon que aceitasse Onésimo como se fosse ele próprio (Paulo), estava solicitando a ele uma dupla atitude: primeiro, que perdoasse a má conduta do seu ex-escravo e, mais do que isso, que o aceitasse como irmão na fé, recomendado pelo Apóstolo para trabalhar com ele na comunidade. O texto da carta demonstra o cuidado de Paulo na redação, para que Filêmon entendesse bem o seu pedido e demonstra mais a grande confiança que Paulo depositava nele, porque era um pedido muito delicado. Vejamos o que Paulo diz no vers. 14: “eu não quis fazer nada sem o teu parecer, para que a tua bondade não seja forçada, mas espontânea. ” E mais adiante, no vers. 17: “se estás em comunhão de fé comigo, recebe-o como se fosse a mim mesmo. ” A carta desenvolve a teologia do perdão e da reconciliação que cada um de nós deve ter para com o irmão que peca, assim como Deus tem para conosco, quando pecamos. Não ficou registrada a atitude do destinatário, mas por certo, Filêmon concordou com Paulo e recebeu Onésimo, conforme a recomendação dele.


A leitura do evangelho (Lc 14, 25-33), como antecipado, enfoca a atitude de desapego que deve ter o cristão em relação às coisas materiais. Na tradução latina desse texto, a exigência de Cristo é bem mais forte do que na tradução oficial. Diz assim: “si quis venit ad me et non odit patrem suum et matrem et uxorem...”, ou seja, se alguém vem a mim e não odeia seu pai, mãe, esposa... a tradução de São Jerônimo é literal do verbo grego “miseô”, que significa odiar, detestar. Porém, o sentido original desta palavra no hebraico (sanê) tem relação com “sentir ciúme”, “não dar a preferência”, ou falando numa expressão positiva, de “amar mais”, ou seja, sentir ciúme se alguém amar mais seu pai, sua mãe, sua esposa … do que a Mim... Daí porque a tradução da CNBB para a frase citada é “se alguém vem a mim, mas não se desapega do seu pai, sua mãe, sua esposa...” Neste caso, a tradução oficial está bem mais conforme o texto hebraico do que com a tradução latina. E é este o sentido mais autêntico da exigência que Jesus faz aos seus seguidores, ou seja, ele não quer dizer que o cristão deve literalmente “odiar” o pai, a mãe, a esposa, os irmãos, os filhos, mas sim que não deve dedicar maior amor aos familiares do que ao próprio Jesus. Não quer dizer que devemos rejeitar, detestar os familiares, mas sim que o amor que dedicamos a estes deve ser fruto do amor primordial a Cristo, amar os familiares no amor de Cristo, com o amor de Cristo. E, em último caso, se as relações familiares ou as relações de amizade forem motivo de afastar o cristão do seu verdadeiro ideal, então o fiel deve fazer a sua escolha radical pela adesão ao ensinamento de Cristo. Esta é a grande dificuldade de se ler a Bíblia nas traduções, sem ter conhecimento do significado dos termos na língua original, ou seja, pode conduzir a conclusões bem divergentes daquele que é o melhor significado da mensagem. Este é o grande problema que ocorre quando o fiel apenas “lê” a Bíblia. Ler não é bastante, é necessário “estudar” a Bíblia, a fim de obter da leitura o melhor aprendizado. Desse modo, num entendimento mais humanizado, a interpretação dessa exigência de Cristo se desloca mais para o sentido espiritual do desapego interior, na linha de pensamento da pobreza em espírito.


Os outros dois exemplos citados pelo evangelista vão também nessa mesma linha de raciocínio. Sobre o homem que queria construir a torre, mas não tinha economias suficientes para levar adiante a pretensão, Cristo quer dizer que devemos nos desapegar também de projetos mirabolantes, que estão mais a serviço da nossa vaidade do que da nossa fé. Qual o objetivo de alguém construir uma torre? Devia ser para tornar-se famoso, para ser visto e conhecido pelas outras pessoas. Mas, até que ponto isso irá contribuir para o bem do próximo, para o serviço da comunidade? Então, os nossos projetos devem estar coerentes com as exigências da nossa fé, não com a nossa vaidade pessoal. Sobre o outro exemplo do rei que vai guerrear com o rival, qual seria o seu objetivo, senão enaltecer o seu egoísmo e o seu orgulho, pensando na vitória sobre o outro? Ora, reconhecer a superioridade do outro é também uma atitude de desapego, de renúncia da própria vaidade. Embora a narrativa sugira que o rei evitou o confronto com receio de ser derrotado, visto que o rival tinha um exército mais numeroso, devemos nos lembrar que Cristo fazia essas preleções para pessoas do povo e usava exemplos simples de casos mais compreensíveis, porém depois ele explicava o verdadeiro significado para os discípulos.


O sentido cristão do desapego, portanto, não é simplesmente largar tudo e ir morar debaixo da ponte. Desapegar-se significa ser pobre em espírito, porque há pessoas extremamente pobres de bens materiais, mas que demonstram espírito rico e de exagerada avareza, invejando o que os outros possuem.


Cordial abraço a todos.

Antonio Carlos