COMENTÁRIO LITÚRGICO – 2º DOMINGO
DO ADVENTO – LEVANTA-TE, JERUSALÉM – 06.12.2015
Caros Leitores,
No segundo domingo do advento, a
liturgia traz outra vez a figura da nova Jerusalém, agora na palavra
do profeta Baruc. Este profeta, que era também escriba e antes fora
secretário do profeta Jeremias, viveu durante o exílio da Babilônia
e descreve a alegria de Jerusalém, com o retorno dos seus filhos.
Outra leitura evoca o tema da pregação de João no deserto:
endireitai os caminhos, aplainai as veredas. Ele veio materializar a
profecia de Isaías (40, 3): a voz que clama no deserto.
O livro da profecia de Baruc teria sido
sugerido pelo próprio Jeremias, quando aquele o acompanhara na fuga
para o Egito, a fim de não serem compelidos a ir para a Babilônia.
Depois da morte de Jeremias, Baruc passou a escrever também as suas
profecias, certamente a partir do que aprendeu com o mestre,
mostrando a presença de Javeh nos fatos históricos. Assim, ele diz
que Jerusalém verá o retorno triunfante daqueles que foram levados
cativos e humilhados algum tempo atrás. E o nome Jerusalém passará
a significar “paz da justiça” e “glória da piedade”. A bem
da verdade, é importante destacar que existem dúvidas entre os
estudiosos sobre a autoria destes escritos, se teriam sido do próprio
Baruc ou apenas atribuídos a ele. Trata-se de um livro
deuterocanônico, isto é, que não estava na lista antiga dos livros
bíblicos, tendo sido reconhecido como autêntico e incluído no rol
somente tempos depois. De todo modo, o contexto referido é o mesmo
em que viveu o profeta Jeremias, no tempo do cativeiro babilônico. O
profeta Baruc declama a alegria de Jerusalém, ao ver o retorno de
seus filhos que foram levados pelo inimigo: “Saíram
de ti, caminhando a pé, levados pelos inimigos. Deus os devolve a
ti, conduzidos com honras, como príncipes reais.”
(Br 5,6) Por isso, ele diz: Levanta-te, Jerusalém, despe de uma vez
por todas as vestes de luto e reveste-te para sempre dos adornos da
glória. A Nova Jerusalém, a igreja de Cristo, está representada
nesta figura desenhada pela profecia de Baruc.
O profeta Baruc também antecipou as
palavras que seriam repetidas por João, no deserto, na sua pregação
preparatória do Messias que estava para chegar: “Deus
ordenou que se abaixassem todos os altos montes e as colinas eternas,
e se enchessem os vales, para aplainar a terra, a fim de que Israel
caminhe com segurança, sob a glória de Deus.”
(Br 5, 7) Foi a mesma temática recolocada por João Batista, quando
pregava: “'Esta
é a voz daquele que grita no deserto: 'preparai o caminho do Senhor,
endireitai suas veredas.”
(Lc 3, 4) Na visão de Baruc, ele se referia à Jerusalém
geográfica, capital do reino de Judá. Mas dentro do simbolismo que
está presente na adequação entre o antigo e o novo testamentos,
João explicava que os caminhos a serem preparados não eram as
estradas de pedra da Palestina, mas as vias internas do coração de
cada um. Desse modo, João convertia os judeus para um novo sentido a
ser encontrado nas palavras da promessa de Javeh e por isso João é
considerado o último profeta do Antigo Testamento.
Na carta de Paulo aos Filipenses (Fl 1,
4-11), o Apóstolo se congratula com a comunidade de Filipos, a
primeira onde ele pregou o evangelho, de modo que a sua lembrança
dos filipenses era sempre cheia de muito carinho e gratidão. A
cidade de Filipos recebera este nome em homenagem a Filipe da
Macedônia, seu conquistador, e era uma das comunidades mais queridas
por Paulo. Lá ele encontrou muita receptividade, quando foi pregar o
evangelho, e obteve muitas conversões. Foi a partir de Filipos que o
cristianismo começou a se espalhar pela Europa, até porque na época
dessa carta, Paulo já estava preso e ele não tinha mais condições
de sair pregando, como fizera antes. Os filipenses foram os
continuadores do seu apostolado e Paulo os considerava uma espécie
de comunidade modelo do cristianismo.
Os filipenses também estimavam muito
Paulo, por causa do intenso trabalho que ele realizara lá, de modo
que quando chegou a Filipos a notícia da sua prisão, a população
organizou uma coleta e a mandou para Paulo, pois sabiam que ele
passava necessidades. Daí que Paulo retribui, na carta, toda a
amizade e afeição que os filipenses lhe dedicavam. E principalmente
por saber que os filipenses se tornaram ardorosos divulgadores do
cristianismo, então isso deixava Paulo ainda mais entusiasmado com
os resultados do seu trabalho naquela comunidade. Daí ele dizer:
“Deus
é testemunha de que tenho saudade de todos vós, com
a ternura de Cristo Jesus. E isto eu peço a Deus: que o vosso amor
cresça sempre mais.
” E lhes recomenda que permaneçam fiéis até o “dia de Cristo”,
ou seja, até a sua segunda vinda. Essa referência constante de
Paulo à “segunda vinda” de Cristo bem denota o entendimento que
ele tinha (e os cristãos da época) sobre este retorno de Cristo em
breves dias. No nosso caso, o Advento nos convida a nos prepararmos
para a chegada comemorativa daquele que vem, não apenas uma ou duas
vezes, mas vem a nós todas as vezes que o buscamos. Com a liturgia
do advento, nós fazemos essa preparação para o retorno de Cristo,
espiritualmente, na vida da Igreja e nas nossas vidas de cristãos.
O evangelista Lucas, como de costume,
muito detalhista, faz referências históricas bem precisas sobre a
época em que João exerceu sua profecia: No ano décimo quinto do
império de Tibério César, foi a palavra de Deus dirigida a João,
no deserto. Tibério iniciou seu reinado no ano 14 d.C., portanto, o
décimo quinto ano seria o ano 29. Pouco tempo depois, quando Jesus
tinha 30 anos, ele foi batizado por João e assim iniciou sua vida de
pregador. Essa referência histórica de Lucas fundamenta a contagem
do tempo para o estabelecimento da data do nascimento de Jesus. E
Lucas diz que João percorreu toda a região do Jordão, pregando o
batismo da conversão, para o perdão dos pecados, a metanóia, ou
seja, a mudança de mentalidade, aplicando um novo modo de
compreender os textos sagrados, fazendo a passagem do antigo para o
novo testamento. Na liturgia, o tempo do advento, em todos os anos,
nos conclama a essa renovação interior, a viver a conversão
pregada por João, a despertar para o cumprimento da promessa de
Javeh aos patriarcas, fato que está para acontecer. Lucas se refere
também às outras autoridades da época: Pilatos, governador da
Judéia; Herodes, governador da Galiléia; Filipe, governador da
Ituréia; Lisânias, governador de Abilene; Anás e Caifás, os sumos
sacerdotes do templo. Ao contextualizar assim historicamente o início
da vida missionária de Jesus, Lucas nos dá um testemunho bastante
preciso não apenas deste fato, mas também da confirmação
histórica da vida terrena de Jesus, pois esses personagens, cuja
presença é bem viva nos textos dos evangelhos, tem existência real
indubitavelmente confirmada. Ainda assim, há pessoas que duvidam se
Jesus Cristo realmente existiu...
Podemos observar na exortação de
Paulo aos filipenses uma correlação com a pregação de João
Batista, acerca da preparação dos caminhos, da seguinte forma. João
se refere às ações iniciais da conversão, enquanto Paulo se
refere à continuidade desta. A conversão do coração não é algo
que acontece apenas uma vez na vida, não é um fenômeno único, mas
permanente, renova-se a cada dia. Quando Paulo diz que aquele que
começou em vós uma boa obra (a conversão), há de levá-la à
perfeição, quer dizer, há de sustentá-los na fé perseverantes
até o final. A isso chamamos de conversão contínua e que
representa o crescimento espiritual, tanto no conhecimento quanto no
discernimento. Essa é a mensagem que, a cada ano, o tempo do advento
vem nos trazer.
A exortação de Paulo aos Filipenses,
assim como a pregação de João Batista, se aplicam a todos nós. A
preparação do Natal do Senhor é um tempo oportuno de renovação
das nossas esperanças e dos nossos compromissos de cristãos, no
sentido de tornar o nosso mundo um lugar melhor para todos.
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