domingo, 22 de julho de 2012

COMENTÁRIO LITÚRGICO – 15º DOMINGO DO TEMPO COMUM – O ENVIO – 15.07.2012


COMENTÁRIO LITÚRGICO – 15º DOMINGO DO TEMPO COMUM – O ENVIO – 15.07.2012

Caros Confrades,

Neste 15º domingo do tempo comum, o tema litúrgico em destaque é o envio dos apóstolos para pregarem o Evangelho a todos os povos. Numa visão hermenêutica trans-histórica, o mandado do envio se direciona, em primeiro plano, aos discípulos preparados pessoalmente por Cristo, mas num segundo plano, este envio se direciona a todos os discípulos de Cristo, em todos os tempos, alcançando-nos também nos dias de hoje.

A temática do envio encontra-se presente também na primeira leitura, retirada do profeta Amós (7, 12). Conforme está registrado no texto bíblico, o sacerdote do templo de Betel, de nome Amasias, mandou Amós ir profetizar em Judá e lá trabalhar para ganhar a vida, advertindo-o a não profetizar ali em Betel, porque neste local estavam localizados a corte do rei e o templo oficial, onde Amasias era o 'profeta' oficial. Em outras palavras, Amasias estava querendo se livrar de Amós, porque este, a mando de Javé, denunciava a tibieza e a exterioridade da religião oficial de Israel, cujos cultos não agradavam a Javé por causa da ausência de devoção e do excesso de formalismo. A resposta de Amós foi desaforada, como o sacerdote não esperava: eu não sou profeta nem filho de profeta, mas o Senhor me chamou quando eu estava pastoreando o rebanho e me mandou profetizar em israel.

Setecentos anos antes de Cristo, a vocação de Amós antecipava o envio que Ele iria transmitir aos discípulos, num contexto bastante similar, em relação às perseguições e às dificuldades inerentes ao cumprimento da sua missão. Jesus disse aos discípulos que eles deviam pregar em todos os lugares, sem levar nenhum dinheiro, nem alforje, nem muda de roupa, nada, devendo receber o seu sustento pelas pessoas da comunidade. E onde não fossem bem recebidos, deviam sacudir a poeira das sandálias contra eles em protesto. E deu a eles o poder de expulsar demônios e curar doenças.

O profeta Amós, como em geral todos os profetas do Antigo Testamento, são personificações antecipadas dos discípulos que Cristo iria preparar para a pregação do seu Evangelho, da mesma forma que os discípulos de Cristo em todas as épocas passaram a ser os profetas do seu tempo. Como resultado do cumprimento desta missão de envio, nós temos hoje a doutrina cristã presente em todos os recantos do mundo e os continuadores desta missão espalhados em todas as camadas da sociedade. Isto é, os profetas dos nossos dias somos nós, seguidores de Cristo e comprometidos com a nossa vocação de enviados.

Talvez o seguidor de Cristo que pode ser apresentado como modelo mais perfeito do cumprimento desta missão seja o nosso Seráfico Patriarca Francisco de Assis, sem dúvida, um grande profeta do seu tempo. Num momento em que a Igreja de Cristo passava por uma grande influência do secularismo e as suas autoridades estavam sucumbindo às ambições do ter e do poder, bem como às seduções dos pecados capitais, o Senhor tocou o coração de Francisco e o enviou para 'reconstruir' a sua Igreja. Enquanto outros reformadores históricos (como, por exemplo, Lutero) entraram em rota de colisão com as autoridades cujos desmandos denunciavam, Francisco, ao contrário, fez todas as suas ações de forma tranquila e obediente às mesmas autoridades, cujo comportamento atípico ele estava ali para denunciar. E o que Francisco fez? Exatamente aquilo que Cristo mandou, quando enviou os seus discípulos: sem preocupações com a aquisição e acúmulo de bens, sem necessidade de provisões de alimentos nem vestimentas, recebendo da própria comunidade o seu sustento, como fruto do seu trabalho. Todos nós nos recordamos que era isso o que estava contido na 'regra de vida' que Francisco deixou como herança para os seus frades. Por isso, podemos dizer que, se houve alguém que cumpriu fielmente o mandado de Cristo na pregação do Evangelho, este foi Francisco de Assis. Deste modo, o nosso compromisso com o engajamento na missão tem uma dupla fonte. De um lado, o envio de Cristo aos seus discípulos, conforme relatado por Marcos no evangelho; de outro lado, o exemplo modelar de Francisco, de cuja herança nós participamos, através da formação que recebemos no tirocínio da vida franciscana. Seguir a Francisco se equipara a seguir a Cristo, só que com maior entusiasmo e alegria, pois juntamente com o envio, temos o exemplo mais efetivo do seu cumprimento.

Na segunda leitura, retirada da carta aos Efésios (1, 3), Paulo elabora um inspirado hino de louvor ao Pai, que em Cristo nos escolheu, antes da fundação do mundo, para que sejamos santos e irrepreensíveis, sob o seu olhar, no amor. Vemos que Paulo celebra o dom da vocação que envolve todos os cristãos para serem profetas e evangelizadores, continuadores da missão salvadora de Cristo, através do envio que todos recebemos, como tributo do nosso batismo e da nossa adesão pela fé. Por Ele, nós fomos confirmados no Espírito, segundo o projeto do Pai, que assim nos predestinou para colocar a nossa esperança em Cristo e no seu evangelho da salvação.

Conforme a promessa de Cristo, são inerentes ao envio os poderes de expulsar espíritos malignos e curar os doentes. Estes poderes não devem ser interpretados literalmente, pois este linguajar representa o modo de pensar daquele tempo. Quem interpreta estas palavras no sentido fundamentalista é adepto da prática dos rituais de exorcismo, muito característicos de algumas organizações eclesiais não católicas contemporâneas, que até fazem demonstrações teatralizadas disso através da televisão. Dentro da Igreja Católica, temos essa forma interpretativa no entendimento dos carismáticos, que também simpatizam com as práticas exorcistas. No meu modo de entender, o poder de expulsar demônios deve ser entendido como o poder de vencer o mal, em todas as suas formas de manifestações, principalmente aquelas mais presentes na sociedade contemporânea, materializadas na discriminação de pessoas, na exclusão social, na exploração do próximo através das nefastas práticas capitalistas, que tanta indignação causam ás pessoas de boa fé. E o poder de curar doenças pode ser entendido como a aceitação e a promoção das pessoas mais necessitadas física e psicologicamente, levando apoio e auxílio aos irmãos mais frágeis e vulneráveis. Não existe uma receita ou um padrão de comportamento a ser indicado, mas isso será percebido pela sensibilidade de cada um, perante a sua consciência iluminada pela fé. Pelo batismo, esses poderes nos são conferidos, conforme a promessa de Cristo, e compete a cada um de nós encontrar a melhor forma de po-los em prática na nossa vida, com nossas ações e nosso testemunho.

Que o divino Mestre e o nosso Seráfico Patriarca nos ajudem no fiel cumprimento da missão que Cristo reservou e espera de cada um de nós.


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