COMENTÁRIO LITÚRGICO
– 33º DOMINGO COMUM – COISAS FUTURAS – 18.11.2012
Caros Confrades,
Neste 33º domingo
comum, o penúltimo do ano eclesiástico, a liturgia nos convida a
refletir sobre as coisas que estão por vir, aquilo que a teologia
chama de 'parusia', isto é, a glorificação de Cristo no final dos
tempos. O próximo domingo, que será o último do ano litúrgico,
celebrará a festa de Cristo Rei do universo. Então, teremos o tempo
do advento e o início do ano novo eclesiástico. Tal como acontece
com outras religiões, o ano religioso não coincide com o ano civil
comum.
As leituras deste
domingo se referem aos acontecimentos futuros, que foram profetizados
já no Antigo Testamento, e que o evangelho de Marcos retoma com
aquela descrição bem explorada pela catequese tradicional como o
nome de juízo final: o
sol vai se escurecer, e a lua não brilhará mais, as estrelas
começarão a cair do céu e as forças do céu serão abaladas.
Então vereis o Filho do Homem vindo nas nuvens com grande poder e
glória. (Mc 13, 24-26).
Essa imagem descrita pelo evangelista foi tema de diversos quadros
pintados na Idade Média e na Renascença européia. Lembro bem que,
nos corredores do Seminário, havia reproduções de vários deles,
com aquelas significativas exortações de 'vigiai porque ninguém
sabe o dia nem a hora'.
No comentário que fiz,
por ocasião da celebração dos fiéis defuntos, expus algumas
ideias sobre o meu entendimento acerca desse episódio, de modo que
não vou repeti-las aqui. Sugiro a quem não leu ou não lembra que
leia o texto na página da internet http://cmachadobr.blogspot.com
onde coleciono todos os comentários. Farei aqui outras referências.
No Antigo Testamento, o
profeta Daniel já havia profetizado algo parecido, que o evangelista
aproveita no seu texto, aplicando a Jesus Cristo, com o intuito de
relacionar a profecia à Sua pessoa. Disse o profeta: Eu estava
olhando nas minhas visões noturnas, e eis que vinha com as nuvens do
céu um como filho de homem; e dirigiu-se ao ancião de dias, e foi
apresentado diante dele. E foi-lhe dado domínio, e glória, e um
reino, para que todos os povos, nações e línguas o servissem; o
seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o seu reino
tal, que não será destruído. (Dn 7, 13-14) Portanto, o
evangelho de Marcos não está trazendo novidade neste aspecto,
porque essa descrição era já conhecida na tradição hebraica. A
novidade, de fato, é a aplicação dessa figura a Cristo. Tanto
assim que a liturgia de hoje nem colocou este texto de Daniel como
leitura, mas um outro trecho, do cap. 12, 1-3, no qual ele diz: será
um tempo de angústia, como nunca houve até então, desde que
começaram a existir nações. Muitos dos que dormem no pó da terra,
despertarão, uns para a vida eterna, outros para o opróbrio eterno.
Mas os que tiverem sido sábios, brilharão como o firmamento; e os
que tiverem ensinado a muitos homens os caminhos da virtude,
brilharão como as estrelas, por toda a eternidade.
Vê-se, pois, que o trecho do evangelho deste domingo, que fala sobre
as coisas futuras, como se fosse algo novo dito por Cristo, de fato,
é uma reprodução parafraseada do que fora dito pelo profeta
Daniel.
A descrição dos astros que caem e do sol que
escurecerá já estava prevista em Isaías (Is 13,10): “Porque
as estrelas e constelações dos céus não darão a sua luz; o sol,
logo ao nascer, se escurecerá, e a lua não fará resplandecer a sua
luz.” E também em Isaías (Is 34,4): “Por esse tempo os
céus, em cima, como que se derreterão e desaparecerão; serão como
um rolo que se enrola. As estrelas cairão como folhas da videira e
como caem as folhas da figueira.” Novamente, observa-se que o
evangelho de Marcos faz adaptações dos textos de Isaías, colocando
as palavras na boca de Jesus.
Inclusive a comparação
feita por Marcos com os ramos da figueira, vê-se que já estava
presente no texto acima de Isaías. A imagem da figueira era algo
muito comum para os hebreus, porque essa árvore, que é típica da
região, tem uma característica curiosa: fica totalmente seca no
tempo do inverno e, quando vem se aproximando a primavera, é a
primeira planta que começa a brolhar. Então, os hebreus já sabiam,
pela sua tradição, que quando os ramos da figueira começam a
aparecer é porque a primavera está chegando. Da mesma forma que o
nosso sertanejo tem também as suas 'experiências' para adivinhar se
haverá muita chuva ou seca na próxima estação.
Os biblistas afirmam
que quando Jesus afirmou esta
geração não passará até que tudo isto aconteça
(Mc 13,30), Ele estava se referindo à destruição de Jerusalém,
que veio a ocorrer alguns anos após a morte dele, prognosticando
Jesus mais um grande castigo para o povo de Israel por não terem
acreditado que ele era o Messias. Portanto, meus amigos, não devemos
nos deixar impressionar com os sinais das grandes tribulações, que
a todo momento alguns 'profetas' dos tempos atuais estão a apregoar.
A próxima, conforme amplamente divulgado, estaria por acontecer no
próximo mês de dezembro. Ora, o evangelho de Marcos diz (e isso não
estava nas profecias do AT): Quanto
àquele dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho,
mas somente o Pai. (Mc
13,32) Esta afirmação é até contraditória, pois como é que o
Filho, sendo Deus, não saberia? A interpretação dessa passagem,
pelos biblistas, é no sentido de que essa verdade não fazia parte
da revelação do Pai que ele veio trazer aos homens, isso continua
sendo um segredo divino.
Nesse contexto, fecha o
raciocínio o texto da carta aos Hebreus, que está na segunda
leitura: Todo
sacerdote se apresenta diariamente para celebrar o culto, oferecendo
muitas vezes os mesmos sacrifícios, incapazes de apagar os pecados.
Cristo, ao contrário, depois de ter oferecido um sacrifício único
pelos pecados, sentou-se para sempre à direita de Deus.
(Hb 10, 11-12) Vejam bem o que está escrito: Cristo sentou-se para
sempre à direita de Deus, ou seja, com a sua morte e ressurreição,
ele encerrou as suas atividades temporais no tempo humano, daí em
diante, prevalece o tempo de Deus. Daí porque Ele não podia revelar
o dia e a hora, porque esse tempo não tem dia nem hora, ele já está
acontecendo, só que isso ocorre em outra 'moradia', aquela que
existe junto do Pai, onde se encontram os eleitos de Deus, aqueles
cujo nome está escrito no 'livro' eterno dos “que
tiverem ensinado a muitos homens os caminhos da virtude,”
(Dn 12, 3), dos 144 mil assinalados, de que fala João no Apocalipse.
O sacerdote comum se apresenta diariamente no templo para celebrar o
culto (e nós vamos dele participar), porque estamos no tempo finito.
Mas quando penetrarmos no tempo de Deus, o infinito, não será mais
necessária essa repetição, porque Cristo já fez isso uma vez por
todas.
Em suma, a mensagem que
devemos retirar das leituras deste domingo é a de que nós devemos
estar sempre atentos e firmes na nossa fidelidade ao evangelho de
Cristo, fortalecidos na fé e praticando as nossas obras de caridade,
pois é isso que Ele espera de nós. Se permanecermos assim, todas as
tribulações que possam advir não nos abalarão pois, como disse o
profeta Daniel, se
levantará Miguel, o grande príncipe, defensor dos filhos de teu
povo (Dn 12,1) e nada nos
afetará. Que para tanto nos ilumine o Seu Santo Espírito.
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