COMENTÁRIO LITÚRGICO
– DOMINGO DA ASCENSÃO - AS NOVAS REDES – 12.05.2013
Caros Confrades,
Celebramos neste
domingo a festa da Ascensão do Senhor, prorrogado para o domingo
seguinte ao próprio dia, a quinta feira anterior, dentro do acordo
da CNBB com o governo acerca dos feriados religiosos. Neste domingo,
coincide com o dia mundial das comunicações sociais, levando-nos a
refletir sobre as novas redes sociais que, conforme recomendação do
Papa Bento XVI, devem ser utilizadas como os novos canais da
evangelização.
Na primeira leitura,
retirada dos Atos dos Apóstolos, como acontece em todos os anos
neste domingo, lê-se o trecho inicial (At 1, 1-11), no qual o
escritor sagrado narra a subida de Jesus ao céu, após despedir-se
dos apóstolos. Coincidentemente, a leitura do evangelho de hoje é
retirada do mesmo escritor dos Atos, o médico São Lucas e, se
observarmos com atenção os dois textos, veremos que ele comete uma
pequena incoerência acerca dos detalhes que cercam a ascensão de
Jesus. Em At 1, 4 e 1, 9, ele escreveu: “Durante
uma refeição, deu-lhes esta ordem: 'Não vos afasteis de Jerusalém
… Depois de dizer isto, Jesus foi levado ao céu, à vista deles.”
São Lucas gosta muito de falar nos detalhes das cenas que descreve,
mas desta vez ele (parece) se esqueceu do que havia escrito no
evangelho (Lc 24, 50-51): “Então
Jesus levou-os para fora, até perto de Betânia. Ali ergueu as mãos
e abençoou-os. Enquanto os abençoava, afastou-se deles e foi levado
para o céu.” Se fossem
escritos de diferentes autorias, esta inconsistência narrativa seria
melhor compreendida, mas visto que são textos do mesmo autor, fica
mais dificil de explicar. No entanto, eu chamo a atenção disso
apenas por uma questão de análise textual, pois na verdade, isso
não altera o conteúdo da mensagem: Ele subiu ao céu depois de
passar mais um tempo (40 dias) após a sua morte reforçando a
catequese com os seus discípulos, para que eles entendessem melhor a
doutrina que iriam pregar.
Um fato que me vem à
mente, associado a esse contexto, é que os seguidores do espiritismo
utilizam essa narração dos Atos para confirmar a sua crença de
que, após a morte, o “espírito” não vai logo para a sua morada
eterna, mas ainda passa algum tempo (tempos diferentes, de acordo com
as necessidades de cada um) numa situação intermediária em que já
não tem mais corpo material, mas ainda não chegou ao nivel
espiritual mais elevado. Provavelmente, seria isso que possibilitaria
que algumas pessoas “vejam os espíritos” dos mortos, porque eles
ainda estão na situação vacante, ainda não fizeram a viagem
definitiva até o outro mundo. Teoricamente, isso significaria que a
“missão” daquela pessoa ainda não terminou, assim como a missão
de Cristo não teria terminado e por isso ele necessitava ficar
aparecendo e ensinando ao seu grupo. Na minha opinião, trata-se de
uma simples acomodação do texto a uma posição doutrinária
diversa e considero o argumento uma mera coincidência. Eu não creio
que cada pessoa tenha uma “missão” e que essa deva ser sempre
terminada, sob pena de não poder o seu responsável desvincular-se
completamente do mundo terreno enquanto não a concluir. Essas
teorias reencarnacionistas são muito antigas, anteriores até ao
cristianismo e, provavelmente, Cristo as conhecesse. Entre os gregos,
havia defensores dessa doutrina, como os pitagóricos e os órficos.
Porém, Cristo nunca se referiu a essa possibilidade nos seus
ensinamentos e nem existe referência a isso nas cartas de Paulo, que
era o mais entendido de cultura grega entre os escritores sagrados.
Penso que a missão de Cristo era única e o seu exemplo não pode
servir de modelo para algo que ele nunca ensinou.
Ainda outro fato que
está associado à festa da Ascensão diz respeito a um trecho
conclusivo do escritor sagrado Lucas, quando ele escreveu (At 1, 11):
“Apareceram
então dois homens vestidos de branco, que lhes disseram: 'Homens da
Galiléia, por que ficais aqui, parados, olhando para o céu? Esse
Jesus que vos foi levado para o céu, virá do mesmo modo como o
vistes partir para o céu.”
Entra em ação, outra vez, o detalhismo de Lucas, percebam: dois
homens vestidos de branco. Ele nem diz que são dois anjos, mas por
terem saído das nuvens e estarem trajando branco, a tradição
entendeu sempre que são dois anjos. Isso foi assim costumeiramente
interpretado pelos diversos pintores medievais, nos seus quadros de
arte sacra. Mas o que eu quero chamar a atenção também é para o
outro detalhe: “Ele virá do mesmo modo como o vistes subir.” Por
causa deste detalhe, muitos pintores da arte sacra têm mostrado
Jesus, com um semblante glorioso, descendo do céu para julgar a
humanidade, no final dos tempos. Contudo, de acordo com as
interpretações mais recentes dos biblistas, essa descrição deve
ser entendida metaforicamente, não do modo como está escrito. Esta
descrição corresponde ao modo como os primeiros cristãos entendiam
a mensagem de Jesus, quando Ele disse que retornaria para julgar a
todos. Por causa dessa compreensão do fato e por causa dessa
descrição de Lucas, muitos cristãos dos primeiros tempos viviam na
expectativa de ver Jesus voltando já naquela época. São Paulo até
adverte os cristãos de Tessalônica (II Tes 2, 1-12) para que
ninguém queira adivinhar o dia em que o Senhor voltará. Isso porque
alguns cristãos primitivos, achando que Jesus estava quase para vir,
deixaram até seus trabalhos e ficavam o dia ociosos só esperando a
volta de Jesus. Havia, dentre alguns, esse entendimento de que Ele
estava para retornar em breve e muito provavelmente o evangelista
Lucas transferiu essa ideia para o seu texto. A interpretação atual
é de que cada fiel é que vai encontrar-se com o Julgador por
ocasião da sua passagem, não havendo um determinado dia, no qual
todos os vivos e mortos fariam tal apresentação. Apesar disso, a
forma tradicional de interpretar essa passagem de Lucas ainda é
amplamente majoritária.
A respeito das novas
redes do mundo contemporâneo, fazendo uma paráfrase com as redes
dos apóstolos pescadores, veio em boa hora a sugestão do Papa para
que os cristãos aproveitem esse novo modo de pesca eletrônica,
através dos canais da comunicação do mundo moderno. O próprio
Papa Bento XVI utilizava a rede twitter e a página eletrônica do
Vaticano é muito bem elaborada, facilitando a pesquisa e a
divulgação dos documentos da
Igreja Católica, desde o próprio texto bíblico até os documentos
oficiais e não oficiais. Ou seja, a Igreja enquanto instituição
vem usando os modernos canais de comunicação a serviço da
evangelização e é isso que o Papa pede a todos os cristãos. Ainda
do ponto de vista institucional, todos os “padres artistas” têm
suas páginas na internet e divulgam seus “trabalhos”, mas não
me parece que seja esse o modelo de evangelização a que o Papa se
referiu. Aliás, esses “padres cantores” têm (parece-me) mais o
intuito comercial do que propriamente o interesse de evangelizar. O
pedido do Papa se dirige a nós, fiéis leigos, para que usemos o
espaço virtual como canal de evangelização. O que se observa, da
parte de muitos cristãos, é a divulgação de material devocional
dos mais diversos tipos, sobretudo imagens sacras e orações
convencionais. Ao meu ver, isso não se pode chamar de evangelização.
Quando muito, é uma demonstração unilateral do tipo de fé que
alguém pratica. Sempre que vou pesquisar algo relacionado com
assuntos bíblicos, encontro milhares de páginas de pregadores não
católicos, esses sim já estão usando a internet para a divulgação
dos seus credos em número muito mais elevado do que as páginas
católicas. Essas também existem, mas proporcionalmente, as não
católicas são bem mais numerosas.
O pedido do Papa, no
entanto, se volta especificamente para as redes sociais, que podem
ser transformadas em fortes canais de divulgação da mensagem cristã
e esse é um desafio para todos nós. É lamentável que muitos dos
nossos confrades não tenham desenvolvido o hábito de navegar nas
águas virtuais e lançarem-se nessas novas redes do mundo
contemporâneo. O nosso preclaro fundador, Gilberto Oliveira, de
tanto insistir nessa tecla (literalmente), já se acha meio sem jeito
de continuar os seus apelos, com receio de tornar-se inconveniente.
Poucos frequentam a sempre aberta sala de debates, na qual os mais
diversos temas circulam. Talvez por desinteresse, falta de hábito,
desconhecimento ou até preguiça, vários confrades, mesmo
acompanhando as mensagens, não as respondem. Alguns fazem isso
esporadicamente, a grande maioria mantém-se silenciosa.
Meus amigos,
consideremos o convite do Papa e nos integremos todos nas redes
comunicativas, exercitando a amizade e a fraternidade através dos
recursos técnicos que temos à nossa disposição.
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