COMENTÁRIO LITÚRGICO
– 33º DOMINGO COMUM – VIGILÂNCIA E PRONTIDÃO – 17.11.2013
Caros Confrades,
A liturgia deste 33º
domingo comum, o penúltimo do ano eclesiástico, nos convida a
refletir sobre aquelas coisas que ocorrerão no final dos tempos, o
que nós aprendemos no catecismo com o nome de “novíssimos”, a
segunda vinda de Cristo. No próximo domingo, com a festa de Cristo
Rei do universo, encerrar-se-á o ano litúrgico de 2013. Então,
teremos o tempo do advento e o início do ano novo eclesiástico.
As leituras deste
domingo trazem como tema a vigilância e a prudência, que devem
marcar a vida do cristão, crente na promessa de Cristo de que
retornará no final dos tempos e, como não se sabe quando será tal
apoteose, deve-se estar sempre preparado. A conhecida descrição
evangélica dos últimos tempos já foi objeto de interpretações
variadas ao longo da história, em diversas ocasiões, as pessoas
perceberam, nos fatos do seu tempo, a identificação com as
predições de Cristo. Ainda hoje, isso ocorre. Sempre que alguma
notícia sobre fatos absurdos ou abomináveis é divulgada, os
“profetas” tentam identificar neles as catástrofes previstas por
Cristo. Porém, o próprio Cristo disse que somente o Pai sabe quando
será isso e nem ao Filho Ele o revelou. Naturalmente, ele assim se
referia ao “filho do Homem”, isto é, à sua natureza humana.
É interessante
observar que, desde o Antigo Testamento, já havia presságios dos
Profetas acerca de agouros maus que estariam por acontecer. Na
leitura de Malaquias (Ml 3, 19-20), este Profeta se refere ao “dia,
abrasador como fornalha, em que todos os soberbos e ímpios serão
como palha; e esse dia vindouro haverá de queimá-los, diz o Senhor
dos exércitos, tal que não lhes deixará raiz nem ramo.”
(Ml 3, 19). Desde que os Patriarcas antigos narraram que houve
outrora uma grande inundação (dilúvio) e o mundo todo sucumbiu
debaixo da água, as pessoas criaram a ideia de que, da próxima vez,
o mundo seria destruído pelo fogo. Isso é uma crença muito antiga,
mas ainda hoje é recorrente na nossa cultura religiosa popular. No
ano de 1910, quando estava se aproximando da terra o cometa Halley,
pelos poucos conhecimentos daquela época sobre esse fenômeno
cósmico, as pessoas viam aquela imensa “bola de fogo” se
tornando cada vez maior e ficaram esperando apenas o momento final da
destruição da terra. De repente, aquela luz se desfez, porque a
terra atravessou a cauda gasosa do cometa. Mas a notícia do fogo
destruidor permanece viva.
Na segunda leitura, de
Paulo aos Tessalonicenses (2Ts 3, 7-12), o Apóstolo bate cabeça com
aquela comunidade, onde se havia espalhado a informação de que
Jesus “estava para chegar”, na sua segunda vinda,
e assim as pessoas já não faziam mais nada, abandonaram os
trabalhos e viviam à toa, apenas aguardando o momento. Paulo
manda-lhes um recado desaforado: eu (Paulo), que até poderia me
prevalecer da função de pregador para obter o sustento pela
comunidade, me dedico ao trabalho dia e noite, a fim de obter o meu
sustento, então, quem não quer trabalhar, também não deve
comer. Diz ele: “Bem
sabeis como deveis seguir o nosso exemplo, pois não temos vivido
entre vós na ociosidade. De ninguém recebemos de graça o pão que
comemos. Pelo contrário, trabalhamos com esforço e cansaço.”
(2Ts 3, 7-8). Uma interpretação falsa da promessa de Cristo estava
atrapalhando a vida daquela comunidade, o que Paulo tentava
esclarecer na sua correspondência. Conforme vimos no domingo
passado, essa comunidade deu muito trabalho a Paulo. Circulou por lá
uma carta anônima, que era atribuída a Paulo e muito o preocupou
porque continha ensinamentos equivocados. Foi de lá que Paulo teve
de sair fugido, porque os judeus a quem ele desagradara o procuravam
para matá-lo. Enfim, uma comunidade trabalhosa, onde as pessoas
tinham dificuldade em compreender a sua doutrina, mesmo tendo
recebido instrução. Situações parecidas ocorrem ainda hoje,
quando vemos pessoas que leem a Bíblia mas, em vez de buscar retirar
da leitura o seu sentido mais coerente e produtivo, apegam-se a
detalhes insignificantes, que deturpam a mensagem.
Na leitura de hoje do evangelho de Lucas (Lc 21,
5-19), Jesus faz aquela famosa previsão da destruição
do templo de Jerusalém, que era entendida pelos judeus como a maior
desgraça que lhes poderia acontecer. “Dias
virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído.'”
(Lc 21, 6) Esse fato histórico se deu no ano 70, quando o exército
romano invadiu Jerusalém e destruiu o templo. No entanto,
perguntando
os ouvintes a Jesus quando aquilo iria ocorrer, ele respondeu
evasivamente: “cuidado para não serdes enganados...” (Lc
21, 8), porque muitas pessoas irão dizer que o tempo está próximo,
mas não acreditem nessa gente. Muitas coisas irão acontecer:
guerras, revoluções, tsunamis, terremotos, desastres ambientais,
mas as piores são aquelas coisas perpetradas pela maldade dos
homens: “'Um
povo se levantará contra outro povo, um país atacará outro país.
Haverá grandes terremotos, fomes e pestes em muitos lugares;
acontecerão coisas pavorosas e grandes sinais serão vistos no céu.”
(Lc 21, 10-11). Até parece com as notícias veiculadas diariamente
na imprensa. Nas últimas semanas, circulou em Fortaleza a notícia
de uma grande onda do mar, que chegaria no dia 24 de novembro
(próximo domingo) em todo o nordeste brasileiro, inundando e
destruindo tudo. Muitas pessoas apavoradas, principalmente aquelas
que moram próximas da praia, já estão em polvorosa, algumas
colocando suas casas à venda e planejando a mudança para o interior
do Estado. Fico imaginando essas pessoas ouvindo as leituras
litúrgicas deste domingo, irão concluir que até a Igreja está
confirmando a notícia. Tudo isso é fruto do sensacionalismo
midiático (eu diria terrorismo midiático), associado àquela
vetusta catequese tradicional, que apelava sempre para a ameaça aos
castigos, como forma de convencer as pessoas a praticarem o bem.
Precisamos compreender
esse trecho do evangelho em concordância com os versículos que vêm
a seguir, pelos quais Jesus diz que, antes que isso aconteça, a
nossa fé passará por provações. “Antes,
porém, que estas coisas aconteçam, sereis presos e perseguidos;
sereis entregues às sinagogas e postos na prisão; sereis levados
diante de reis e governadores por causa do meu nome. Esta será a
ocasião em que testemunhareis a vossa fé.”
(Lc 21, 12-13) Meus amigos, no sentido histórico, Jesus se referia
aí às perseguições pelas quais passariam os Apóstolos e os
primeiros cristãos, como de fato a história documentou. Mas no
sentido trans-histórico, o texto se refere a nós, hoje. A nossa fé
está a enfrentar contínuas provações, perseguições, ameaças
dentro e fora do ambiente religioso. Hoje, eu li um texto terrível,
escrito por uma pessoa que se diz católica e que nós podemos
classificar como extremista e intolerante. Falando acerca da Teologia
da Libertação, disse esse intelectual: ou expulsamos os traidores
de dentro da Igreja, ou será impossível salvar o Brasil. Não estou
aqui a defender a Teologia da Libertação, mas me refiro à atitude
totalmente antirreligiosa de uma pessoa que se diz católica. Ou
seja, as ameaças contra a fé não se originam apenas dos inimigos
da religião, mas de dentro da própria comunidade eclesial. No
extremo oposto, está o Papa Francisco que, quando indagado sobre a
opinião dele acerca do homossexualismo, declarou: “quem sou eu
para julgar essas pessoas?” Fico aqui imaginando o volume de
ameaças que o Seráfico Papa recebe, de forma direta, dos seus
próprios pares no Vaticano, e de forma indireta, de alguns grupos de
fiéis, espalhados por todo o mundo.
Então, voltando ao
tema que propusemos no início, a vigilância e a prontidão que
devemos guardar não se refere apenas às ameaças externas, mas o
inimigo pode estar no meio de nós. Qual é a conduta a seguir para
nos mantermos vigilantes e preparados para enfrentar todas essas
provações? Em primeiro lugar, a retidão de consciência e a boa
vontade de progredir sempre mais como pessoa. Em segundo lugar, o
estudo e a reflexão sobre a autêntica religião de Cristo. Não
basta ler a Bíblia, é preciso conhecê-la e aprofundá-la pelo
estudo sério e bem fundamentado, evitando-se extremismos e
simplismos de toda ordem. A fé não se sustenta apenas com a oração.
Esta é necessária, mas o estudo da doutrina e de suas fontes é
igualmente indispensável.
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