COMENTÁRIO LITÚRGICO – 5º DOMINGO
DA PÁSCOA – O DIACONATO – 14.05.2017
Caros Leitores,
Neste 5º domingo da Páscoa, a
liturgia nos traz uma leitura dos Atos dos Apóstolos, que relata a
criação do Diaconato na Igreja de Cristo. A função destes era
cuidar dos trabalhos assistenciais e sociais, enquanto os Apóstolos
se dedicavam à pregação e às funções sagradas. Por muitos anos,
a figura do Diácono ficou esquecida no ambiente eclesial, sendo
reativada pelo Concílio Vaticano II e tornava efetiva nas últimas
décadas. Os nossos confrades Ribamar e Batista Rios fazem parte
desse grupo dos novos diáconos do nosso tempo.
Nos Atos dos Apóstolos, consta o nome
dos primeiros sete diáconos (At 6,5): Estêvão,
Filipe, Prócoro, Nicanor, Timon, Pármenas e Nicolau de Antioquia.
De acordo com o texto lucano, a tarefa deles era “servir às
mesas”, o que eu entendo como as obras de caridade material e
assistencial. No texto de Lucas, eram todos homens. No entanto,
Paulo, na carta a Romanos (16,1), refere-se a “Phoebe,
nossa irmã, diaconisa da igreja de Cencréia”, o que implica
entender que havia mulheres também exercendo a diaconia. O site
“prebiteros.com.br” explica que “eram mulheres de conduta
irrepreensível chamadas a participar dos serviços que a Igreja
prestava a pessoas do sexo feminino, principalmente por ocasião do
Batismo (ministrado por imersão). Recebiam o seu ministério pela
imposição das mãos do Bispo, que não conferia caráter
sacramental. – Com a rarefação do Batismo de adultos, foi-se
extinguindo a figura da diaconisa na Igreja a partir do século VI.”
Não apenas o diaconato feminino, mas também o masculino tornou-se
esquecido por muito tempo, até ser restaurado pelo Concílio
Vaticano II, porém somente o diaconato masculino, deixando de lado a
figura feminina, evidenciando este fato um injustificável
preconceito por parte dos padres conciliares. Se na antiguidade
cristã, havia as diaconisas, por que não reabrir essa possibilidade
nos dias atuais? Aqui em Fortaleza, lembro que nos anos 90, Dom
Aloísio nomeou uma freira (Irmã Elizabeth) para oficiar casamentos,
batizados e celebrações da palavra na Paróquia do Conjunto Ceará,
por causa da escassez de ministros ordenados, e ela oficiou nessa
função por bastante tempo, causando espécie até mesmo no
Vaticano. Uma pessoa admirável a Irmã Elizabeth Stumpfler, quem a
conheceu certamente concordará comigo. Uma jovem alemã que fugiu da
Alemanha Oriental na época da segunda guerra mundial e veio
trabalhar, até o fim dos seus dias, entre as comunidades carentes do
Ceará. Minha homenagem a ela neste domingo que coincide com o Dia
das Mães, porque ela foi mãe adotiva de inúmeros jovens e adultos,
que buscavam seu apoio e seus conselhos.
Na segunda leitura, temos outro trecho
da carta de Pedro aos judeus dispersos e perseguidos (1Ped 2, 4-9).
Conforme já comentei antes, as cartas de Pedro eram dirigidas aos
novéis convertidos judeus, da região da Ásia Menor, que eram
ofendidos e perseguidos pelos judeus legalistas, por causa da sua
conversão ao cristianismo. Isso não deixa de ser um fato curioso,
porque no texto dos Atos, lido hoje, Lucas se refere a “numerosos
sacerdotes judeus convertidos” (Atos 6, 7), o que talvez explicasse
a perseguição por parte dos judeus ortodoxos. Pedro procura
levantar-lhes o moral, dizendo que eles são as pedras com as quais
Cristo constrói o seu edifício, que é a Igreja, e que essas mesmas
pedras, para os que não creem, são tropeço e ignomínia. “Vós,
como pedras vivas, formais
um edifício espiritual, um sacerdócio santo, a fim de oferecerdes
sacrifícios espirituais, agradáveis a Deus, por Jesus Cristo.”
(2, 5) Enquanto Paulo dirigia suas cartas às comunidades do
território grego, Pedro atendia aos
fiéis da Ásia Menor,
região que corresponde à Turquia.
Na
leitura do Evangelho de João (Jo 14, 1-12), continuamos a observar
as dificuldades pedagógicas de Jesus com os seus rudes discípulos.
Depois de passar três anos, convivendo diuturnamente com eles e
ensinando-lhes a sua Boa Nova, para que eles a espalhassem pelo
mundo, Jesus
ainda passou cinquenta dias após a sua ressurreição, dando aulas
de reforço. Quem já atuou professor, sobretudo em classes de
reforço, já deve ter sentido
na pele aquela desanimadora
atitude do(a) aluno(a) que, depois de você explicar um assunto já
em repescagem, faz uma pergunta que demonstra que ele não entendeu
nada e você tem de começar a explicar tudo do começo. Dá vontade
de sair correndo da sala. Pois é, Jesus passou por isso também.
Estando a se aproximar o dia em que Ele, definitivamente, iria deixar
o grupo e encerrar a sua missão, Ele está passando as últimas
informações, recordando as lições antigas e fazendo a reciclagem.
O apóstolo João faz questão de mostrar a cabeça dura daqueles
antigos pescadores de peixes,
que Jesus pretendia
transformar em pescadores de homens e não economiza as palavras:
“Vou
preparar um lugar para vós e, quando eu tiver ido preparar-vos um
lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver
estejais também vós. E, para onde eu vou, vós conheceis o
caminho”.
(14, 3-4) Então, vem Tomé com aquela desconcertante pergunta:
“Senhor,
nós não sabemos para onde vais. Como podemos conhecer o caminho?”
Até parece
que a gente escuta
Jesus responder: “pelamordedeus”, Tomé, o caminho sou eu,
ninguém vai ao Pai senão por mim. Aí chega
o Felipe com uma
ainda mais desanimadora pergunta:
“Senhor,
mostra-nos o Pai, isso nos basta!”
E Jesus, em vez de sair correndo de desespero com tamanho despreparo,
vai pacientemente explicar de novo. Como é que tu dizes: mostra-nos
o Pai... Felipe, quanto tempo eu estou com vocês e ainda não me
conhecem? Quem Me vê, vê o Pai, porque Eu estou no Pai e o Pai está
em Mim. Se não acreditam no que digo, acreditem ao menos nas obras
que fiz. Meus amigos, ao refletir sobre essas situações, temos a
certeza da origem divina da Igreja. Só mesmo o poder divino pôde
conseguir que uma dezena de pessoas incultas e de limitado
entendimento construíssem todo esse arcabouço de fé e doutrina,
que nos legaram através dos tempos. Alguém poderia até argumentar:
mas depois eles receberam o Espírito Santo e ficaram inteligentes...
não é bem assim. O Espírito ilumina e vivifica, mas não
acrescenta recursos intelectuais a quem não os possui pela natureza.
A difusão da Igreja de Cristo só se explica mesmo pela promessa que
Ele fez: ide pelo mundo e Eu estarei convosco até o fim do mundo.
Nesse trecho do
evangelho, João também coloca na boca de Jesus uma frase que é
muito conhecida e interpretada das mais diversas maneiras: Na casa do
meu Pai há muitas moradas. (Jo 14, 2) Eu enxergo nessa afirmação
a raiz do ecumenismo. Até aprece que Jesus já sabia das divisões
que o cristianismo teria de enfrentar no futuro. Era como se ele
dissesse: haverá divisões entre vós, com entendimentos
diferenciados, criando múltiplas crenças religiosas, no entanto,
todas elas, quando exercidas com consciência e fidelidade, são
caminhos válidos para o encontro com Deus. Durante séculos, os
teólogos ensinaram (e os Papas tornaram isso quase um dogma) que
fora da Igreja Católica não há salvação, porque esta é a única
e verdadeira Igreja de Cristo. Muitos católicos ainda defendem esse
ponto de vista, sobretudo os grupos mais tradicionalistas,
fundamentalistas e carismáticos. É muito triste perceber que, nos
dias de hoje, existam pessoas que vivem mentalmente em época
anterior ao Concílio Vaticano II. Logo no início do seu
pontificado, o Papa Francisco fez uma afirmação chocante, que
causou grande alarde na imprensa e imensa dor de cabeça nos grupos
católicos tradicionalistas: ele disse, respondendo a um jornalista,
que também as pessoas de outras crenças, que têm atitudes
compatíveis com o evangelho, mesmo sem serem cristãs, merecem a
salvação. Pois é. Jesus já sabia que, no decorrer dos tempos,
haveria grandes dissensões de ideias e graves divergências
doutrinárias dentro da sua Igreja e, nem por isso, deixaria de haver
um só rebanho. As atitudes dos últimos Papas, fazendo visitas às
comunidades judaica e muçulmana, além de visitas às Igrejas
ortodoxas dissidentes vêm abrindo caminho para a formação dessa
unidade de todos os crentes. Patriarcas orientais, rabinos judaicos,
autoridades árabes, todos estão ansiosos com essa aproximação da
Igreja de Roma, porque isso demonstra uma extraordinária quebra de
preconceitos e tabus seculares, coisa que os Papas anteriores não
ousaram enfrentar. E assim estamos caminhando verdadeiramente, pela
via do diálogo e da mútua compreensão, para realizar o desejo de
Cristo: que haja um só rebanho e um só Pastor, que é Ele próprio.
Por fim, registro
um fato emocionante para toda a comunidade católica mundial, mas
sobretudo a do Brasil, que é o centenário da aparição de Maria em
Fátima, ocorrido ontem. O Papa esteve presente no local e celebrou a
canonização dos pastorinhos videntes: Jacinta e Francisco. Foi um
fenômeno de grande repercussão na época e os seus reflexos
continuam a ser sentidos nos dias atuais. Que a Virgem de Fátima nos
abençoe copiosamente.
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