COMENTÁRIO LITÚRGICO
– 11º DOMINGO COMUM – PARÁBOLAS DO REINO – 17.06.2012
Caros Confrades,
Neste 11º domingo
comum, a liturgia nos propõe para reflexão os ensinamentos de
Cristo a respeito do reino de Deus, que ele veio inaugurar, explicado
através de parábolas, para forçar a compreensão dos seus
ouvintes. No trecho de hoje, são expostas duas parábolas
diferentes, mas com um mesmo núcleo de sentido: a semente lançada
na terra.
A imagem da semente tem
uma forte simbologia relacionada com o fenômeno da multiplicação
que está a ela associada e que encerra no seu conteúdo o próprio
milagre da vida. A semente é pequena, inerte, simples, mas quando
plantada, cresce, se torna dinâmica, fecunda e se multiplica em
incontáveis partes, que configurarão um novo ser. No entanto, há
uma condição para que a semente se torne fecunda: ela deve
'morrer', deve ser sepultada no limo da terra, para assim ganhar nova
vida. Sem essa 'morte', a vida não brotará dela. Podemos
vislumbrar, portanto, na imagem da 'morte' da semente o sacramento do
batismo. Através do batismo, o ser humano morre para o pecado, a fim
de viver em Deus. A sua existência anterior era inerte, pobre, sem
futuro; a sua nova existência é dinâmica e fecunda, pelos frutos
que o batismo faz brotar no coração de quem o recebe.
Em outra passagem do
evangelho (Jo 12, 24), Jesus faz outra alusão à semente, em outro
contexto, referindo-se à sua ressurreição, quando diz: se o grão
de trigo não morrer, fica só; mas se morre, produz muito fruto. A
imagem da semente associa-se, portanto, à morte do homem pecador e à
ressurreição do homem da graça, tanto no sentido da nova vida
trazida pelo batismo, quanto no sentido da outra vida, que virá
depois que deixarmos esta morada. E aqui o tema do evangelho se
interliga com o texto da segunda leitura, retirada da carta de Paulo
a Coríntios 2: “ enquanto
moramos no corpo, somos peregrinos longe do Senhor; pois caminhamos
na fé e não na visão clara ”
(2Cor 5,6) Ao deixar a morada do corpo, iremos morar junto do Senhor.
Portanto, neste primeiro momento, a imagem da semente se refere a
nós, cristãos, que temos a oportunidade de, pelo batismo, fazer
morrer em nós o ser humano pecador, para fazer viver o ser humano
da graça. E através dos demais sacramentos, vamos passando por um
processo de contínuo aperfeiçoamento do nosso ser para, depois, com
a morte corporal, termos a ressurreição prometida por Cristo, da
qual Ele já deu o exemplo.
Nas parábolas da
leitura deste domingo, Jesus compara o reino de Deus à semente que é
plantada. O plantador lança a semente na terra e passado algum tempo
vê surgir uma plantinha, que vai crescendo, produzindo frutos,
servindo de alimento para alguns e também servindo de morada para os
pássaros, e aquele que planta não sabe como foi que isso aconteceu.
Neste caso, a semente é a Palavra que é plantada no coração e na
mente das pessoas e vai germinar e produzir frutos e aquele que foi o
portador da Palavra não sabe como foi que isso aconteceu. E nem
precisa se preocupar com isso, porque o Pai toma conta de tudo. O que
Jesus quer de nós é que lancemos a semente, igual ao semeador da
outra parábola e o Pai cuidará do resto. E como é que nos
tornaremos lançadores de sementes? Com a nossa fala, em primeiro
plano, mas é sobretudo com o nosso exemplo que isso acontece. O
nosso comportamento de cristãos, a colocação em prática dos
mandamentos de Cristo nos atos da nossa vida cotidiana, o nosso
testemunho diante da pessoas do nosso convívio na família, no
trabalho, na sociedade, são os atos e atitudes pelos quais nos
tornamos lançadores da semente da Palavra.
E Jesus ainda nos anima
querendo dizer que não precisa fazer grandes pregações, nem
grandes sacrifícios nem enfrentar grandes desafios, mas mesmo nas
pequenas coisas isso acontece. É o que Ele pedagogicamente ensina
quando fala da semente de mostarda, ao dizer que é a menor semente
das hortaliças, no entanto, é aquela que produz a leguminosa mais
corpulenta, que serve até de pouso e arcabouço de ninho para os
pássaros. Pequenas sementes que produzem grandes árvores, assim
acontece também conosco, mesmo que a semente lançada seja de
tamanho apoucado. Falando nisso, quem não se lembra dos canteiros de
hortaliças que todos nós ajudamos a cultivar no Seminário de
Messejana, em Guaramiranga, em Parnaíba, em todos os conventos havia
essa prática. Além do trabalho em si, para exercitar o corpo e
desanuviar a mente, tinha o retorno em bons produtos para a cozinha e
o refeitório. E sem perceber, estávamos tendo uma demonstração
concreta dos aspectos físico e espiritual do ato de lançar a
semente e ver seus frutos, em todos os seus sentidos.
Tem ainda outro aspecto
interessante que este trecho do evangelho de Marcos nos traz para a
reflexão. Ao final, o autor diz que Jesus falava ao povo em
parábolas, mas para os discípulos depois, a sós, ele explicava
tudo. É o caso de perguntarmos: por que Jesus fazia assim? Porque
ele não explicava tudo logo para o povo, deixando para fazer isso
somente aos discípulos. Se os discípulos precisavam de explicação
para compreender, é óbvio que o povo também precisava, então por
que Ele fazia esse segredo? Ele não queria que o povo entendesse?
Parece algo contraditório.
Ao meu ver, essa
estratégia de Jesus tinha um objetivo certo, não era casualidade ou
displicência. Ele queria que os judeus o reconhecessem como Messias,
mas não aquele messias poderoso e guerreiro, que a tradição
judaica esperava ver. Ele mesmo chegou a dizer certa vez, quando os
discípulos perguntaram por que ensinava ao povo com parábolas (Mc
4,11): a vós é dado conhecer o reino de Deus, mas àqueles lá de
fora, faço tudo em parábolas, para que olhando não vejam e para
que ouvindo, não entendam. Essa estratégia Jesus usava em relação
aos fariseus e aos sacerdotes do seu tempo, que O seguiam esperando
para ver um milagre, um feito extraordinário e assim poderem
acreditar que Ele era mesmo o messias esperado. E Jesus não fazia
milagres quando eles estavam por perto, mas somente quando o povo
simples o rodeava, porque a ação miraculosa tinha de ser para a
glória do Pai, e não para a exaltação de Sua pessoa. Jesus sabia
que, no curto tempo de três anos, ele não conseguiria doutrinar
muita gente, então ele lançava a Palavra em forma metafórica e
explicava as metáforas aos discípulos para que estes, após a sua
morte e ressurreição, fossem explicar detalhadamente ao povo o que
ele queria dizer.
Ao falar em parábolas,
Ele fazia igual ao semeador que joga a semente e não se importa onde
ela está caindo, mas cada uma produzirá poucos ou muitos frutos, de
acordo com o terreno que a fecundar. Os fariseus e os mestres da Lei,
que esperavam um messias poderoso, apto a restaurar o reino de
Israel, não compreenderam a figura do Messias humilde e frágil, que
veio anunciar um novo Reino, deixando aos seus seguidores a tarefa de
espalhar a semente que ele trouxe. Jesus queria que as pessoas
acreditassem nele pela mensagem (Palavra) por Ele transmitida, não
pelas demonstrações de poder que ele fazia através dos milagres.
Essa era a 'primeira tentação' (transformar essas pedras em pão,
ou seja, faz milagres) que ele devia evitar, porque a sua missão era
outra e o seu reino não era deste mundo. Aos discípulos, porém,
àqueles que ele escolheu para continuarem a sua missão, a esses ele
revelou todos os mysterion, ou seja, todos os segredos e através
deles, esses segredos chegaram até nós.
Retomando o texto da 2ª
Carta a Coríntios (segunda leitura), enquanto moramos no corpo,
somos peregrinos que caminham na fé, ou seja, o reino de Deus para o
qual nós nos dirigimos, por enquanto é a promessa na qual nós
cremos. Mas quando deixarmos esta morada e comparecermos ao tribunal
de Cristo, para receber a nossa recompensa, então o reino de Deus
será visto claramente por cada um de nós, ou seja, tornar-se-á
realidade. Esta dupla dimensão do reino de Deus está implícita na
imagem da semente, que precisa morrer para assim germinar e produzir
frutos. Portanto, sejamos sementes e também lançadores de sementes,
enquanto formos peregrinos, pois os frutos serão colhidos na época
apropriada.
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