COMENTÁRIO LITÚRGICO
– 12º DOMINGO DO TEMPO COMUM (NASCIMENTO DE JOÃO BATISTA) –
ÚLTIMO PROFETA – 24.06.2012
Caros Confrades,
Neste 12º domingo do
tempo comum, a liturgia dominical cede a vez para a celebração do
nascimento de João Batista, o precursor do Messias. A importância
de João Batista, na história da salvação é ímpar, já que ele
se posiciona no meio termo entre o Antigo e o Novo Testamentos. Ele
foi o último dos profetas, dentre estes, o único que leva o agnome
de São. Conforme as palavras do próprio Cristo, dentre os nascidos
de mulher, foi o maior de todos. (Mt 11, 11)
Coube a João Batista a
tarefa de preparar o caminho para a chegada do Messias. O seu
nascimento está relacionado a fenômenos extraordinários. Conforme
o evangelho de Lucas (1, 5), Zacarias era sacerdote do templo. Ele e
sua mulher Isabel não tinham filhos e já tinham idade avançada.
Num certo dia, quando era a vez dele entrar no tabernáculo para
incensar a Arca da Aliança, lá dentro do tabernáculo recebeu a
visita do anjo do Senhor, o qual informou que a mulher dele iria ter
um filho. Ele duvidou e por causa disso ficou mudo durante toda a
gestação, vindo a soltar-se sua língua somente depois do
nascimento do filho (Lc 1, 64). Outro fato singular ligado a João
Batista foi o de que ele estremeceu no ventre de Isabel, quando Maria
foi visitar a prima, a ponto de a mãe sentir a vibração estranha.
Segundo uma tradição, João Batista teria sido instruído na
comunidade dos essênios, assim como se diz também que aconteceu com
Cristo. Lá ele teria estudado as escrituras. Mas mesmo que não
tenha sido, o pai dele era sacerdote, portanto, poderia tê-lo
instruído. O fato é que, quando ele começou a pregar, ele citava
Isaías: a voz do que clama no deserto – aplainai os caminhos do
Senhor, endireitai suas veredas, o reino de Deus chegou.
Todos os profetas, mas
principalmente Isaías, lançaram previsões acerca do futuro
Messias, mas foi João Batista o único que pôde apontar com o dedo
para Ele e dizer: aí está o Cordeiro de Deus. E dizia ao povo:
vocês vêm atrás de mim, mas no meio de vós está um que é maior
do que eu e do qual eu não sou digno nem de desamarrar a correia das
sandálias... é preciso que Ele cresça e eu diminua. Naquela imagem
da crucifixão, de Grunewald, que encaminhei antes, há uma
referência a este fato. E foi ele que mandou discípulos perguntar a
Jesus se era Ele o Messias esperado ou se deviam esperar por outro.
(Lc 7, 19) Evidentemente, isso não era porque João tivesse dúvidas,
mas para a tranquilidade dos próprios discípulos dele.
Mas o fato mais notável
protagonizado por João Batista foi o batismo de Jesus. Quando Ele se
apresentou para ser batizado, João disse: eu que devia ir a ti, e tu
vens a mim... e Jesus respondeu: deixa que as coisas aconteçam
assim. (Mt 3, 14) Foi então que, após Jesus ser batizado, houve a
primeira manifestação da Trindade, quando o Pai se fez ouvir e o
Espírito Santo apareceu em forma de pombo. Este foi o início da
vida pública de Jesus e por isso João Batista se situa no limiar
que separa o Antigo Testamento do Novo Testamento.
Conforme os Atos dos
Apóstolos (13, 24), João pregava ao povo o batismo da conversão.
Ele não inventou o batismo, este já existia e era praticado
regularmente pelos judeus, fazia parte dos seus rituais de ablução,
pelos quais eles buscavam a purificação. Mas o batismo tradicional
e comum entre eles era o auto batismo, ou seja, o penitente entrava
na água do Jordão e ele mesmo mergulhava, cobrindo todo o corpo,
para assim se purificar. Ainda hoje, algumas igrejas cristãs não
católicas fazem este batismo de imersão, para receberem seus fiéis.
Porém, o batismo pregado por João era oficiado por ele, o fiel
recebia o batismo de suas mãos, em sinal da conversão. A palavra
conversão, todos sabemos, diz-se em grego 'metanoia', cuja
etimologia significa mudança de mentalidade, mudança no modo de
pensar. Não era um simples ritual de purificação como faziam os
judeus, porque saíam dali e voltavam a fazer as mesmas infidelidades
de antes. Para ministrar o batismo, João exigia a conversão, a
mudança de modo de pensar, isto é, a pessoa devia antes aplainar os
caminhos do pensamento e endireitar as veredas da mente. Essa atitude
significava a necessidade de abrir o entendimento para compreender as
graves e contundentes verdades que estavam por se manifestar na
pessoa e na pregação de Cristo.
Sim, porque os judeus
esperavam um Messias guerreiro, tal como fora Davi, que viria com a
espada afiada para derrotar e expulsar os inimigos. Está lá na
primeira leitura, em Isaías (49, 2), na verdade, no deutero-Isaías:
fez da minha palavra uma espada afiada, fez de mim uma flecha
aguçada. Isso era interpretado literalmente em relação ao Messias
esperado. Ele viria de espada em punho para libertar Israel. Daí se
entende o diálogo de Jesus com os discípulos de João, quando eles
perguntaram se Ele era o que havia de vir ou deviam esperar por
outro. (Lc 7, 19) Foi quando Jesus respondeu: ide dizer a João o
que tendes visto – cegos veem, coxos andam, surdos ouvem... e feliz
daquele que não se escandalizar por minha causa. Com isso,
Jesus estava já antecipando a dificuldade que os judeus,
principalmente os chefes destes e os fariseus, iriam ter em
reconhecê-lo e aceitá-lo. Eles iriam se escandalizar, ou seja,
iriam desacreditar, iriam lançar desconfiança em Jesus, porque o
Messias que eles esperavam era de outro tipo, lutador e guerreiro,
não um Messias fraco e sofredor. Daí também porque João dizia que
era necessária a conversão (mudança de mentalidade), era
necessário endireitar as veredas (do pensamento), aplainar os
caminhos (do entendimento), a fim de conhecer e aceitar o Messias
como Cordeiro de Deus.
Essa figura do cordeiro
era bem familiar para os judeus, por causa do símbolo da Páscoa, o
cordeiro que se imolava e que servia de alimento. Quando João diz
que Cristo é o Cordeiro de Deus, estava ali também se referindo à
sua paixão e já antecipadamente à eucaristia, o cordeiro imolado
que é dado em alimento. Para compreender isso, ou seja, para
entender a nova figura do Messias-Cordeiro era imprescindível mudar
o modo de pensar acerca dele. João fazia referência expressa à
figura do cordeiro também presente na profecia de Isaías, o
cordeiro que era levado ao matadouro e não abria a boca (Is 55, 3),
sinal de que João Batista conhecia bem as escrituras.
Na primeira leitura da
missa da vigília, a liturgia nos oferece o trecho do profeta
Jeremias, que tanto se refere a João Batista quando a Jesus Cristo
(Jr 1, 5): antes de formar-te no ventre materno, eu te conheci; antes
de saíres do seio da tua mãe eu te consagrei e fiz de ti profeta
das nações. E mais adiante, no versículo 10, completa: eu te
constituí hoje sobre povos e reinos com poder para extirpar e
destruir, devastar e derrubar, construir e plantar. E na primeira
leitura do domingo, a mesma imagem se encontra em Isaías (49, 6): eu
te farei luz das nações, para que minha salvação chegue até os
confins da terra.
Meus amigos, nós aqui
e agora somos fruto dessa promessa. Deus falou pela boca de Isaías:
Não basta restaurar Jacó e reconduzir o resto de Israel, isso é
pouco, tu vais unir todas as nações e levar a elas a minha
salvação. Nós somos a prova concreta de que a palavra de Deus,
pronunciada pelo Profeta, foi cumprida. E nos dias de hoje, nós
somos os sucessores do Profeta, para continuarmos anunciando a
salvação ao mundo inteiro. E para quem acha que não tem condições
de fazer isso, vale lembrar a advertência de Jeremias (1, 8): o
Senhor disse - não tenhas medo, pois estou contigo para
defender-te... eis que ponho minhas palavras na tua boca. Este é o
nosso desafio e a nossa missão de cristãos na sociedade.
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