COMENTÁRIO LITÚRGICO
20º DOMINGO COMUM – FESTA DA ASSUNÇÃO DE MARIA – 19.08.2012
(MARIA MÃE DA IGREJA)
Caros Confrades,
Neste 20º domingo
comum, a liturgia eclesiástica abre espaço para a celebração da
festa da Assunção de Maria, uma concessão especial para o Brasil,
autorizada pela CNBB, dentro do acordo com o Governo brasileiro
acerca dos feriados religiosos. Visto que o dia próprio da festa, 15
de agosto, caiu numa quarta feira, transfere-se a celebração para o
domingo seguinte. Mesmo no caso específico de Fortaleza, que celebra
a festa da Assunção na data própria, por causa do feriado
municipal, a festa litúrgica é transferida para o domingo, seguindo
a orientação nacional da CNBB.
Esta concessão
especial para o Brasil através da CNBB é decorrente das alterações
litúrgicas aprovadas pelo Concílio Vaticano II, que deu autonomia
às conferências dos Bispos para fazerem adaptações para os cultos
locais. O mesmo Concílio autorizou e o Papa Paulo VI proclamou Maria
Mãe da Igreja, em 21.11.1964, ao encerrar a sua terceira sessão e
ao promulgar também a Constituição Dogmática Lumen Gentium (sobre
a Igreja no mundo de hoje). O título de Maria Mãe da Igreja foi
justificado, pelos padres conciliares, pelo fato de que os cristãos
compartilham com Cristo a paternidade de Deus e a maternidade de
Maria. Esta nova designação foi também um prolongamento de uma
proclamação anterior, feita pelo Concílio de Éfeso, em 431,
reconhecendo em Maria a Mãe de Deus (Theotókos), contra a heresia
de Nestório que afirmava que Maria era apenas a mãe de Cristo
enquanto homem, mas não de Cristo Deus, porque Este não teve mãe,
uma vez que sua existência é eterna. O Concílio de Nicéia (ano
325) já havia proclamado as duas naturezas (divina e humana) de
Cristo e o Concílio de Éfeso, em complementação, afirmou que
Maria é Mãe de Cristo homem e Deus, portanto, Mãe de Deus. E na
sequência do pensamento teológico desenvolvido pelo apóstolo
Paulo, acerca da Igreja como Corpo Místico de Cristo, a tradição
católica passou a venerar Maria como Mãe da Igreja, título que foi
proclamado oficialmente pelo Concílio Vaticano II.
No discurso de
encerramento da terceira sessão do Concílio Vaticano II, o Papa
Paulo VI afirmou: “Com efeito, é a primeira vez — e
dizê-lo enche-Nos a alma de profunda emoção — é a
primeira vez que um Concílio Ecuménico apresenta síntese tão
vasta da doutrina católica acerca do lugar que Maria Santíssima
ocupa no mistério de Cristo e da Igreja”. E na Exortação
Apostólica “Signum Magnum”, publicada pouco depois, o mesmo
Paulo VI voltaria a repetir o fato: “Está ainda
viva, Veneráveis Irmãos, no nosso ânimo a recordação da grande
emoção sentida ao proclamar a augusta Mãe de Deus como Mãe
espiritual da Igreja e portanto de todos os fiéis e sagrados
Pastores, a coroar a terceira sessão do Concílio Ecuménico
Vaticano II, após ter solenemente promulgado a Constituição
Dogmática «Lumen Gentium». ”
Meus amigos, eu estou
fazendo este preâmbulo sobre Maria, lembrando-me da primeira leitura
da liturgia de hoje, retirada ao Apocalipse (12, 1), que fala do
grande sinal (signum magnum) visto por João no céu: uma
mulher vestida com o sol, calçada com a lua e coroada com 12
estrelas. Ela estava grávida e, ao lado, apareceu um grande dragão,
com sete cabeças e dez chifres (João não diz como era a disposição
desses 10 cornos nas 7 cabeças, podemos então imaginar), que ficou
ali esperando a criança nascer, para a devorar. De acordo com a
interpretação teológica desde os tempos mais antigos, o Apocalipse
trata das coisas que hão de vir, portanto, uma visão escatológica,
mas de um futuro sem data prevista e que, podemos admitir, não
acontece apenas uma vez, mas costuma se repetir. Refiro-me aos
diversos 'dragões' que já se postaram diante da Igreja de Cristo,
prontos para a devorar, em épocas passadas, e de vez em quando
aparecem.
Ao repisar a primeira
leitura de hoje, vieram-me à mente aqueles assombrosos fatos, dos
quais já temos falado aqui neste espaço, versando sobre a fuga de
documentos pessoais do Papa, façanha produzida pelos denominados
'corvos do Vaticano', que são os novos dragões apocalípticos dos
nossos tempos. Os dilemas e os desafios encarados pelo Papa Bento
XVI, cercado por uma verdadeira máfia dentro do Vaticano, nos
lembram a figura da mulher do Apocalipse enfrentando o dragão, que
está prestes a devorar o recém-nascido. No caso do dragão do
apocalipse joanino, a mulher se safou, porque fugiu para o deserto,
para um lugar que Deus tinha lhe preparado. Mas o nosso Papa não tem
um deserto para onde fugir, então ele deve mesmo ficar exposto às
labaredas que o dragão expele por sua enorme fornalha bucal e ainda
sair sorrindo para toda a humanidade, como se nada estivesse
acontecendo.
Firme na minha fé
teológica e historicamente fundamentada, eu creio que Deus sempre
prepara um lugar seguro em algum deserto espiritual, para onde levará
refugiada a mulher assolada pelo dragão, no caso, a nossa Mãe
Igreja. Tenho convicção de que a Igreja de Cristo não será
devorada pelo dragão da insensatez e da ganância demonstrada pelos
membros da sua própria hierarquia, mas que antes disso, o Papa ainda
terá que suportar muitas vicissitudes, disso eu também não tenho
dúvida. Num artigo publicado num jornal alemão (repassado pelo
nosso Confrade Gerardo-Frei Mário), em 11.06.2012, os jornalistas
fizeram a seguinte análise: “A velha guarda do Vaticano,
composta por cardeais italianos e os seus apoiadores,
acreditavam
que tinham encontrado um Papa de transição em Ratzinger. Mas agora
a
transição está em seu oitavo ano, e a Cúria está mais ou
menos onde ela estava, perto do fim
da vida
do Papa anterior (João
PauloII): não há ninguém à vista para assumir com firmeza o leme.
” E dizem mais: “O clima no Vaticano é apocalíptico. O
Papa Bento XVI parece cansado e mais incapaz e sem vontade de tomar
as rédeas, em meio a lutas ferozes e a um escândalo, enquanto os
controladores do Vaticano brigam pelo poder e especulam sobre o seu
sucessor.”
Meus amigos, nesse
contexto tão perturbador, a proclamação do Concílio Vaticano II
veio em muito boa hora, atribuindo a Maria o título de Mãe da
Igreja. Será realmente indispensável que Maria tome na mãos a
nossa Igreja, para conduzi-la ao seu lugar seguro no deserto
simbolizado por João no capitulo 12 do Apocalipse, porque o nosso
Papa já não tem mais idade nem saúde para enfrentar as difíceis
agruras com que se depara. Neste ano, em que se comemoram os 50 anos
da instalação do Concílio Vaticano II, a lembrança do título de
Maria Mãe da Igreja é por demais oportuna para que, nas nossas
orações, recomendemos insistentemente a nossa Igreja à sua materna
proteção. O Monsenhor Vitaliano Mattioli, articulista da revista
eletrônica Zenit (www.zenit.org),
em recente artigo (17.08.2012), recordou a profética declaração de
um jornalista italiano, nesses termos: “Em 1966, o jornalista
italiano Alberto Cavallaria escreveu em um livro-entrevista: "O
verdadeiro significado do Concílio Vaticano II só será reconhecido
depois de muitas décadas e toda conclusão rígida torna-se
imprudente" ” O tempo vem demonstrando que o jornalista
estava mesmo inspirado, ao fazer esta conclusão, porque passados
estes 50 anos, o verdadeiro sentido e a verdadeira lição trazida
pelo Concílio ainda está em fase de assimilação, o que tem gerado
as naturais dissidências de toda mudança estrutural em qualquer
organização, mas que tem se prejudicado por causa dos grupos
extremistas de uma e de outra vertente, que se debatem entre si, em
vez de buscarem através do diálogo, o melhor entendimento do
verdadeiro espírito do Concílio.
Tradicionalistas e
progressistas, grupos que começaram a se desenhar logo após o
encerramento do Concílio, situação que se esperava fosse
abrandando com o passar do tempo, só tem cada vez mais levado a
recrudescimentos de ambas as partes, causando intensa angústia em
todos os Papas, desde Paulo VI até Bento XVI. Essas posições
antagônicas e radicais, por si sós, já depõem contra a orientação
dada pelo Papa João XXIII, na abertura do Concílio, quando ele
conclamou toda a Igreja à união entre os próprios fiéis e também
com os irmãos separados. Além de essas atitudes não promoverem a
última parte dessa convocação do Papa, ainda estão criando uma
outra cisão, onde deveria haver a maior união.
Que Maria, a Mãe da
Igreja, inspire as nossas autoridades na busca do verdadeiro caminho
a ser trilhado. Rezemos nesta intenção.
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