domingo, 15 de dezembro de 2013

COMENTÁRIO LITÚRGICO - 3º DOMINGO DO ADVENTO - MAIS QUE UM PROFETA - 15.12.2013

COMENTÁRIO LITÚRGICO – 3º DOMINGO DO ADVENTO – MAIS QUE UM PROFETA – 15.12.2013

Caros Confrades,

Sempre no 3º domingo, a liturgia sóbria do advento abre espaço para a alegria da próxima chegada do Senhor. O refrão latino antigo dizia: gaudete in Domino, iterum dico, gaudete. Alegrai-vos no Senhor, outra vez eu digo, alegrai-vos. Este é o tema dominante desta liturgia, que traz na leitura do evangelho o elogio que Jesus faz a João Batista: muito mais do que um profeta, dentre os nascidos, ninguém é maior do que ele. E, de carona, faz outro rasgado elogio a todos nós, seus seguidores.

A primeira leitura, do profeta Isaias (35, 1-10), expressa a alegria dos cativos ao serem libertados da Babilônia e retornarem a Jerusalém: “Dizei às pessoas deprimidas: 'Criai ânimo, não tenhais medo! Vede, é vosso Deus, é a vingança que vem, é a recompensa de Deus; é ele que vem para vos salvar'. Então se abrirão os olhos dos cegos e se descerrarão os ouvidos dos surdos. O coxo saltará como um cervo e se desatará a língua dos mudos. Os que o Senhor salvou, voltarão para casa.” (Is 1, 4-10) Esta alegria do retorno para casa é comparada com a alegria da Igreja pela chegada do Senhor, que se avizinha. A liturgia relembra a festa dos hebreus celebrando a sua libertação do cativeiro babilônico, fazendo alusão com o júbilo que deve tomar conta de todo o mundo cristão, com a chegada da libertação trazida por Cristo. Se aquela libertação terrena foi motivo de tanto regozijo para os hebreus, então para nós, que recebemos de Cristo a salvação eterna, a alegria deve ser muito maior. A parte final do versículo 10 é bem sugestiva: “Eles virão a Sião cantando louvores, com infinita alegria brilhando em seus rostos: cheios de gozo e contentamento, não mais conhecerão a dor e o pranto.” Sião, a Jerusalém terrestre, é a Igreja de Cristo, da qual nós fazemos parte. A ela, nós nos dirigimos cantando louvores e com intensa alegria brilhando nos nossos rostos, tal como os hebreus libertados. O livro de Isaías, ao mesmo tempo em que descreve a tristeza do povo cativo, do meio para o fim, passa a retratar o grande contentamento daqueles que puderam voltar à sua terra. É uma leitura recorrente no tempo do advento, era também uma leitura preferida por Cristo, quando comparecia aos cultos na sinagoga e lhe era dada a palavra.

Na segunda leitura, retirada da carta de Tiago (Tg 5, 7-10), ele exorta os cristãos sobre a vinda do Senhor, que está próxima. Sabemos que, naquele tempo, tanto os apóstolos quanto as comunidades primitivas, esperavam para “os próximos dias” o retorno de Jesus, como ele havia prometido, na sua ascensão, que retornaria em breve daquele mesmo modo. A interpretação que os primeiros cristãos davam a essa passagem bíblica era totalmente literal. Então, a exortação de Tiago tinha outro sentido daquela referida pelo profeta Isaías, pois no tempo deste Profeta, o Messias ainda não havia chegado, portanto, ele se refere à sua chegada original. Mas na carta de Tiago, a espera é pelo seu retorno, para julgar o mundo. Daí percebermos uma certa ingenuidade nas palavras de Tiago, no versículo 9: “Irmãos, não vos queixeis uns dos outros, para que não sejais julgados. Eis que o juiz está às portas.” Essa queixa é também referida por Paulo na segunda carta aos Tessalonicenses, lida num domingo recente, em que ele repreendia os cristãos que já não queriam trabalhar só esperando o dia do Senhor voltar. Esse mesmo contexto é repetido por Tiago. Esta carta não é dirigida a uma comunidade particular, mas a todos os judeus da diáspora. Esta diáspora, ou dispersão dos judeus, ocorreu logo após a destruição de Jerusalém pelos romanos, levando-os a se espalharem por diferentes territórios da Ásia, África e sul da Europa. Em alguns destes locais, já existiam diversas igrejas cristãs, sobretudo aquelas fundadas por Paulo, tendo sido até motivo de atritos. Na verdade, os judeus ficaram sem um território próprio e isso perdurou por vários séculos, pois eles somente voltaram a ter um local geográfico com a criação do Estado de Israel, após a segunda guerra mundial. E, diga-se de passagem, a situação permanece insegura, com as constantes intrigas e guerras intentadas por seus vizinhos árabes, que nunca aceitaram essa decisão política, fruto da mediação, mais do que isso, da imposição dos norte americanos. Pois bem, a carta de Tiago reflete assim aquela ideia que era comum entre os primeiros cristãos, acerca da iminente volta de Cristo, para julgar os vivos e os mortos.

No evangelho de Mateus (Mt 11, 2-11), lemos o episódio em que João Batista, encontrando-se preso a mandado de Herodes, ouviu falar de Cristo e enviou a ele alguns dos seus discípulos, a fim de colher informações: és Tu o que esperamos ou devemos esperar por outro? Lembremos que João Batista já havia batizado Jesus no rio Jordão, portanto, já o conhecia, inclusive foi naquela ocasião em que o Espírito Santo apareceu, portanto, João Batista tinha conhecimento da existência de Jesus, que era também seu parente. Mas, mesmo assim, visto que estava preso e não podia fazer isso pessoalmente, enviou seus discípulos para se certificarem do fato. Não deixa de ser curiosa essa referência do evangelho à atitude de dúvida de João Batista sobre o Messias. Será que ele não tinha certeza de que Jesus era o Messias? Creio que sim, no entanto, João Batista precisava que os seus discípulos tivessem essa certeza também . Sabemos que João Batista tinha seguidores, alguns deles depois se tornaram discípulos de Jesus. Então, eu entendo esse fato de João Batista enviar mensageiros para irem ter com Jesus como uma forma de dizer a eles algo assim: pronto, a minha carreira terminou, de agora em diante, vocês devem ficar com Ele. De fato, daquela prisão onde se encontrava, João Batista não mais saiu, vindo a ser decapitado a pedido da concubina de Herodes, como forma de vingar-se dele, que havia censurado a sua vida marital com Herodes, por ser uma união ilegítima. A vingança da imperatriz não demorou a acontecer.

Jesus não respondeu aos discípulos de João de forma direta, mas apenas indiretamente, ao afirmar: “Ide contar a João o que estais ouvindo e vendo: os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados.” (Mt 11, 4-5) Se observarmos bem, Jesus estava mandando o recado para João Batista mais ou menos nesses termos: vejam só, estão acontecendo aquelas coisas que o profeta Isaías dissera que iria acontecer com a chegada do Messias. Isto é, para um bom entendedor (e João conhecia as escrituras), ali estava uma resposta claríssima. João deve ter, então, se despedido dos seus discípulos, porque a sua missão tinha sido encerrado. E ele havia dito, em outra ocasião (João 1, 27), que ele era apenas o precursor e que, quando o Messias chegasse, ele (João) não seria digno nem de desatar as correias das suas sandálias. Deve ter sido algo parecido que João, por fim, esclareceu aos seus discípulos e os encaminhou para o seguimento de Jesus.

Mas o evangelista Mateus prossegue (11, 9) a história, contando o que Jesus falou aos seus ouvintes, após a saída dos discípulos de João: eu vos afirmo que ele é mais do que um profeta. Aqueles que ouviam Jesus conheciam os Profetas da Israel e os reverenciava, assim Jesus quis dar a eles uma noção da importância de João Batista. E citando o seu profeta preferido, Isaías, completou: “É dele que está escrito: 'Eis que envio o meu mensageiro à tua frente; ele vai preparar o teu caminho diante de ti'.” (Mt 11, 10) O “está escrito” quer dizer: Isaías escreveu isso. Em outra ocasião, Jesus havia utilizado outra passagem de Isaías para se identificar na sinagoga, perante os rabinos e os chefes do povo, quando foi convidado para fazer a leitura e escolheu um trecho de Isaias, conforme está relatado no evangelho de Lucas (4, 16). Após a leitura na qual Isaías falava sobre as qualidades do futuro Messias, Jesus disse: hoje se cumpriu essa escritura. Foi como se dissesse: Isaías estava falando a meu respeito. E complementando o elogio que fazia a João Batista, assim terminou o seu discurso: “de todos os homens que já nasceram, nenhum é maior do que João Batista.” (Mt 11,11) Vejam que Jesus exclui a si próprio dessa referência, fazendo assim uma alusão velada à sua divindade. Ele nunca falava de si mesmo diretamente, mas sempre de forma indireta. Porém, logo depois, Jesus faz um surpreendente elogio a todos nós, cristãos: “No entanto, o menor no Reino dos Céus é maior do que ele.” Ou seja, meus amigos, Jesus coloca os seus seguidores (João foi seu precursor), quer dizer, nos coloca acima de João Batista, porque ele não chegou a ver a revelação e a salvação, que nós conhecemos através dos seus ensinamentos.

Que nós realmente façamos por onde sermos dignos desse tremendo elogio que Jesus nos fez.


Nenhum comentário:

Postar um comentário