terça-feira, 17 de abril de 2012

COMENTÁRIO LITÚRGICO – DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR – 01.04.2012


COMENTÁRIO LITÚRGICO – DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR – 01.04.2012



A liturgia deste domingo celebra a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, por ocasião dos preparativos para a páscoa judaica. Já vimos nos domingos passados que não foi esta a primeira vez que Ele foi a Jerusalém nesse período, porém, nesta vez, como Ele já sabia que estava na Sua hora, as coisas ocorreram de forma diferente, com maior festejo. Ele sabia que os chefes dos sacerdotes estavam aguardando uma oportunidade para prendê-Lo, então Ele não chegou discretamente, mas o fez de forma a chamar a atenção dos inimigos.

Quem assistiu àquele filme (que foi inicialmente uma peça teatral exibida em Nova York) Jesus Cristo Superstar deve lembrar de como o diretor do filme retrata esse momento. Os chefes dos sacerdotes estavam espreitando a procissão que O vinha conduzindo e comentando entre eles: Ele é perigoso. Mas eles não podiam simplesmente prendê-Lo diante da multidão, porque isso ocasionaria uma revolta popular, ela preciso encontrá-Lo em um local reservado, para isso precisaram da ajuda de Judas, para indicar onde Ele estaria longe do povo.

A principal leitura deste domingo é a da paixão, no entanto, há a leitura opcional do evangelho de Marcos, onde ele narra os detalhes da entrada de Jesus em Jerusalém. Foi o próprio Jesus quem pediu aos discípulos para irem buscar um jumentinho, indicando precisamente onde o encontrariam. Depois de três anos pregando pelos territórios da Judéia, Galiléia, Samaria, Jesus tinha adquirido um número bastante grande de admiradores, embora nem todos fossem seguidores. E adquiriu também, óbvio, um outro número de inimigos, exatamente dentre aqueles para quem Ele veio confirmar a antiga aliança: os líderes do povo judeu.

Desde tempos imemoriais, a festa da páscoa era celebrada entre os povos orientais, sempre coincidindo com o início do período das colheitas, que no hemisfério norte corresponde à chegada da primavera. A saída dos hebreus do Egito, por volta de 1.800 anos antes de Cristo, já ocorrera numa dessas celebrações pascais, quando os umbrais das portas foram tingidas com o sangue do cordeiro. A escolha de Jesus para se apresentar aos seus inimigos, sabendo que eles iriam matá-Lo, foi também propositalmente direcionada para o período da páscoa judaica, porque Ele, sendo o novo cordeiro, iria ser imolado na mesma situação do primeiro cordeiro, que assinalou a libertação dos cativos do Egito. Geograficamente, esta data está referenciada com a primeira lua cheia após a passagem do equinócio da primavera (no hemisfério norte, pois para nós, é o equinócio do outono). O equinócio, evento geográfico que significa a mesma duração do dia e da noite, ocorre entre os dias 20 e 21 de março de cada ano. Se observarmos o calendário deste ano, veremos que a primeira lua cheia após o equinócio ocorrerá no dia 6 de abril, ou seja, cairá numa sexta feira. Este seria o dia da páscoa, pelo calendário judaico antigo. Mas como nós celebramos a páscoa sempre num domingo, então, o dia para nós será 8 de abril. A páscoa é a única data comemorativa que ainda nos dias de hoje se rege pelo calendário lunar.

No conjunto das leituras deste domingo, chama a atenção a precisão profética de Isaías, quanto aos sofrimentos que iriam castigar o Messias. No cap 15, vers 6, o texto não podia ser mais claro: “Ofereci as costas para me baterem e as faces para me arrancarem a barba; não desviei o rosto de bofetões e cusparadas. ” O mesmo se pode dizer em relação ao salmista, no Sl 21: “Cães numerosos me rodeiam furiosos, e por um bando de malvados fui cercado. Transpassaram minhas mãos e os meus pés e eu posso contar todos os meus ossos. ” No período quaresmal, é constante a leitura de trechos de Isaías, porque este profeta foi o que expressou com mais clareza os sofrimentos do cordeiro. E era também o texto que Jesus mais gostava de citar, quando se referia aos antigos profetas.

Meus amigos, todos os anos, a liturgia do domingo de ramos repete estas cenas e leituras, nós que somos habituais em frequentar a missa talvez até já saibamos de cor esses trechos. Qual o significado, então, dessa repetição, o que a liturgia da Igreja nos transmite com essas cerimônias da Semana Santa, em especial, do Tríduo Pascal a cada ano? Ora, nós sabemos que cada missa celebrada é uma realização da vontade de Cristo, que disse: todas as vezes, que fizerdes isso, fazei-o em minha memória. Portanto, não apenas na Semana Santa se celebra a morte e ressurreição de Cristo, mas em cada missa se faz isso. É o que nós rezamos após a consagração: anunciamos a Tua morte e proclamamos a Tua ressurreição... ou seja, em cada missa, temos uma síntese do Tríduo Pascal.

Concluímos, então, que a celebração destacada dos fatos históricos centrais relacionados com o mistério da salvação, que acontece na Semana Santa, tem o sentido pedagógico de nos lembrar de que, em cada missa que é celebrada, em qualquer lugar do mundo, a nossa salvação está se renovando. A liturgia da Semana Santa vem nos proporcionar um tempo mais específico e demorado para meditarmos nesse mistério, cuja memória ocorre em todos os lugares e muitas vezes por dia. Mas certamente pela constante repetição, podemos nos inclinar a não levar na devida consideração o conjunto desses fatos.

A tradição popular que cerca a sexta feira santa é por demais emotiva e deprimente. É comum verem-se pessoas chorando durante a Via Sacra. Mas não é esse o objetivo da comemoração litúrgica. De fato, Jesus não morre mais, isso aconteceu uma vez para sempre. A memória da sexta feira santa deve ser celebrada na perspectiva do conjunto dos atos litúrgicos que evoluem para a vigília pascal e depois para o domingo da Páscoa. A morte de Cristo celebrada na sexta feira santa é, como o catecismo ensina, de forma incruenta, isto é, sem derramamento de sangue. Ora, assim é também em todas as missas, sejam elas na semana santa ou durante o restante do ano. Não devemos, pois, encarar com sentimentalismos o tríduo pascal, mas com os olhos da fé esclarecida, que não separa a paixão e morte de Cristo da sua ressurreição.

A propósito da sexta feira santa, eu li hoje que o Papa, em visita a Cuba, solicitou ao governo que decretasse feriado nesta sexta feira, ao que o governo cubano aquiesceu, e então depois de mais de 50 anos (desde 1960), a sexta feira santa será feriado em Cuba, o que está sendo visto pelos observadores como um sinal de significativa mudança para os católicos cubanos. Pode ser este o reinício das tradições religiosas interrompidas com o governo de Fidel, o que denota também o grande prestígio do Papa.

Então, meus amigos, devemos aproveitar os feriados da semana santa não como ocasião para viagens e diversões extras, mas para reflexão sobre o mistério da nossa redenção, vivenciado historicamente na paixão/ressurreição de Cristo e revivenciado liturgicamente em cada missa que se celebra, com especial acento nesta semana que estamos iniciando.

Eu ainda hoje me lembro de uma oração que aprendi no Noviciado, a qual rezo sempre que entro no templo: Nós Te adoramos, santíssimo Senhor Jesus Cristo, aqui e em todas as igrejas que estão em todo o mundo e Te bendizemos porque pela tua santa cruz redimiste o mundo.


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