domingo, 12 de fevereiro de 2012

6.º DOMINGO COMUM – SUPERAR O PRECONCEITO – 12.02.2012



Caros Confrades,

A liturgia deste domingo (6º do tempo comum) nos traz para reflexão a questão dos preconceitos sociais, da discriminação das pessoas por causa da sua condição pessoal ou social.

Na primeira leitura, retirada do Levítico (13, 1), temos o caso do leproso, que devia se apresentar ao sacerdote e depois afastar-se do convívio social, usar roupas rasgadas e passar a morar fora dos limites da cidade. E quando alguém, inadvertidamente, se aproximasse, ele deveria gritar 'impuro, impuro', para que a pessoa se afastasse. Assim estava prescrito na lei hebraica (antigo testamento).

Ao lermos o livro do Levítico, devemos atentar para o fato de que o seu conteúdo trata de uma espécie de código de condutas para o povo, como hoje nós temos as leis baixadas pelos governos. É lá também no Levítico (cap 15) que existe aquela norma onde está prescrito que a mulher menstruada fica impura durante todo o período em que correr o fluxo, não podendo frequentar o templo. E todos aqueles que nela tocarem, também ficarão impuros e sofrerão as mesmas restrições. O Levítico, assim como o livro dos Números, são na verdade tópicos da legislação hebraica que foram colocados na Torah como regras divinas, quando de fato são regras de conduta social, padronização de costumes. O fato de constarem na Bíblia significa que, naquela época, qualquer lei era entendida como norma dada por Javeh, devido à natureza religiosa da nação hebraica. Era como se fosse um Estado religioso. Nos dias de hoje, nós temos ainda alguns exemplos de países que têm essa mesma estrutura político-religiosa, onde a lei religiosa se confunde com a lei civil. É o caso, por exemplo, do Irã, do Afeganistão, onde a lei religiosa (o Corão) como que substitui as leis e a constituição do país. Hoje em dia, nós conhecemos o direito hebraico através dessas normas legais misturadas com preceitos religiosos que existem esparsos na Bíblia, mas se concentram no Levítico, nos Números, no Deuteronômio.

Pois bem. A lei hebraica, portanto, excluía da sociedade as pessoas portadoras de lepra. Era como se fosse uma regra de saúde pública. A lepra era uma doença para a qual não existiam remédios e a cura dificilmente acontecia. Ao mesmo tempo, era uma doença de alto contágio. Essa regra da exclusão social dos leprosos prevaleceu na sociedade mundial até bem pouco tempo. Todos os Confrades se lembram da Colônia de Antonio Diogo, que era assistida pelas Irmãs Capuchinhas e os Frades de Guaramiranga celebravam missa lá. Eu tive oportunidade de visitar na companhia de Frei Timóteo, ainda nos anos 60. isso deve ter acontecido com vocês. Tinha também a Colônia do Carpina, em Parnaíba, quem morou lá em São Sebastião deve se lembrar. Atualmente, não existe mais esta segregação por causa da lepra, que passou a ser uma doença muitas vezes curável e, em geral, controlada por medicamentos.

Mas a 'lepra' dos nossos dias é a AIDS. Aquela mesma atitude de nojo e afastamento que antes a sociedade dirigia aos leprosos, hoje é comum em relação às pessoas aidéticas. Todos sabem que a AIDS não se comunica pelo ar ou pelo contato com a pele, mas existe um grande preconceito e uma grande ojeriza das pessoas em geral em relação aos aidéticos ou portadores do vírus HIV. Este é o maior drama vivido pelas pessoas acometidas dessa síndrome: a solidão em que se veem colocadas, o afastamento dos amigos, o desprezo e a exclusão da sociedade. Não conseguem emprego, tornam-se verdadeiros mortos-vivos.

Mas nós vemos, na leitura do evangelho de Marcos (1, 40), a atitude de Jesus em relação ao leproso que se aproximou dele e demonstrou toda a sua fé. “Se queres, disse ele a Jesus, tens o poder de curar-me”. E Jesus disse: “quero, fica curado”. E na mesma hora, ele ficou limpo. Porém, cumpridor da Lei, Jesus mandou aquele homem ir se apresentar ao sacerdote e não contar nada a ninguém. Ora, quanto a ir apresentar-se ao sacerdote, isso era fácil. O difícil era ficar calado diante daquele fato. E o homem curado saiu mostrando a todos e contando a todos o que lhe tinha acontecido, atraindo cada vez mais multidões para ver Jesus e ouvir seus ensinamentos, ao ponto de, mesmo Jesus ficando fora das cidades, nos lugares desertos, as pessoas iam lá procurá-lo.

Meus amigos, o que vemos nesse exemplo de Jesus em relação ao leproso é a lição do amor ao próximo acima de qualquer preconceito. Obviamente, Jesus conhecia a Lei que mandava o leproso de afastar. Com certeza, quando aquele homem se aproximou de Jesus, as demais pessoas se afastaram dele, porque estavam vendo que ele era um 'impuro'. Jesus não apenas permitiu que ele se aproximasse, como ainda o tocou. Diz o evangelista, no versículo 41: “Jesus, cheio de compaixão, estendeu a mão, tocou nele, e disse: 'Eu quero: fica curado!' Pela Lei hebraica, tocar num leproso significava ficar impuro igual a ele, mas Jesus passou por cima desse pre(con)ceito. Estaria Jesus, assim, descumprindo a Lei? Por certo que não. Ele estava, mais uma vez, demonstrando que veio para aperfeiçoar a Lei, para cumpri-la de um modo novo e mais completo.

Temos, assim, dois exemplos de como lidar com o preconceito. O modo veterotestamentário, que adota o preconceito e faz dele uma regra de convívio social, excluindo os irmãos desventurados. De outro lado, temos o modo evangélico, do novo testamento, através da atitude pedagógica de Jesus, no sentido de quebrar o preconceito em nome da solidariedade, demonstrando que o amor ao próximo deve estar acima de qualquer barreira, mesmo daquelas legalmente impostas. Ou seja, Jesus vem ensinar que a lei maior, que está acima de todas as leis, não é a constituição do país, e sim a lei do amor ao próximo, esta sim é a lei básica e geral que deve dirigir a conduta de todos nós.

São Paulo, na primeira carta aos Coríntios (10, 31), corrobora este ensinamento de Jesus, sobre a lei máxima do amor ao próximo, quando diz: “Não escandalizeis ninguém, nem judeus, nem gregos, nem a igreja de Deus. Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus.” O 'escândalo' aqui deve ser entendido como tudo aquilo que pode por em risco a fé do irmão. Cada um de nós deve sempre agir de acordo com a nossa consciência, sem dúvida. Mas há algumas pessoas que, por diversas circunstâncias, têm a fé pouco madura e podem não compreender as nossas palavras ou atitudes. Então, precisamos ter cuidado para não falar coisas que possam deixar o irmão em dúvida quanto às nossas boas intenções. Isso quer dizer que o mandamento cristão de falar sempre a verdade não significa que tudo deve ser dito em qualquer ocasião e sem as devidas cautelas. Dizendo bem claramente, através de um exemplo: mesmo que um de nós saiba que um sacerdote não tem bom procedimento, isso não deve ser declarado publicamente perante pessoas que não tenham o discernimento de entender que a nossa intenção, quando assim falamos, não é faltando com a caridade, mas zelando pela integridade da nossa Igreja. Então, o respeito ao irmão cuja fé pode ser posta em perigo por um ato ou uma palavra imprópria dita por nós está também relacionado com a lei máxima do amor ao próximo, acima de qualquer preconceito ou fato social.

Enfim, caros Confrades, a liturgia nos convida a refletir sobre nosso comportamento social e a rever nossas atitudes preconceituosas, que devem ser expurgadas, em homenagem à nossa condição de autênticos cristãos.

5º DOMINGO COMUM – 05.02.2012 – SOFRIMENTO PEDAGÓGICO



Caros Confrades,

A liturgia deste 5º domingo comum nos convida a refletir sobre o sofrimento e o seu valor pedagógico. É possível encarar o sofrimento como uma forma de ascensão para um novo patamar da existência.

Quado se fala em sofrimento, a figura emblemática que nos chega à lembrança é a de Jó, toda a tradição hebraico-cristã tem nesse personagem o protótipo do justo sofredor. A finalidade do livro de Jó é demonstrar que o sofrimento não é consequência do pecado, como era o entendimento comum dos hebreus, ou seja, só os pecadores sofrem, os justos não devem sofrer. Então, a figura de Jó, o justo que sofre, perde tudo que possui e depois readquire tudo novamente, é o símbolo da pedagogia do sofrimento, isto é, da visão do sofrimento como um período de reflexão para nos levar a um estado de vida mais purificado e mais santificado. É do livro de Jó a primeira leitura.

Diz a leitura: (Jo 7,2) “tive por ganho meses de decepção, e couberam-me noites de sofrimento. Se me deito, penso: Quando poderei levantar-me? E, ao amanhecer, espero novamente a tarde e me encho de sofrimentos até ao anoitecer.” Este trecho mostra um momento em que Jó ainda não tinha entendido o verdadeiro valor do sofrimento. Esta é aquela sensação mais comum que acomete qualquer pessoa diante de uma situação dolorosa: Deus se esqueceu de mim. E a pessoa então se desmancha em queixumes e lágrimas. Esta leitura faz lembrar um texto que circula pela internet, com certeza os Confrades já o leram, cujo tema é 'pegadas na areia'. Para os que não leram, vou resumir em poucas palavras. Uma pessoa teve o privilégio de ver um retrospecto de toda a sua vida com Jesus andando a seu lado. Então, no chão ficavam as marcas de dois pares de pés: dele próprio e de Jesus. Inexplicavelmente, em alguns momentos, havia apenas um par de pés e essa pessoa observou que isso acontecia nos momentos em que ela passava por dificuldades. Então, reclamou de Jesus: por que me abandonaste todas as vezes em que me sentia em apuros? E Jesus lhe respondeu: filho, aquelas marcas eram dos meus pés, eu estava te carregando nos braços... É nesse sentido que eu falo sobre a pedagogia do sofrimento. Quando tudo parece dar errado e nós não conseguimos entender aquelas coisas e nos sentimos desprotegidos, é nestes momentos que Deus mais cuida de nós.

Na segunda leitura, da primeira carta de Paulo aos cristãos de Corinto (1 Cor 9,16), ele comenta sobre as agruras suportadas por causa de sua missão de pregar o Evangelho: sem descanso, sem salário, sem reconhecimento, com perseguições, e mesmo assim, fazendo isso como uma necessidade interna que ele sentia. E diz: ai de mim se eu não pregar. Por causa do Evangelho, ele se tornou um escravo de todos. Faz-nos lembrar a nossa missão de cada dia, a qual temos sempre de encarar e nunca fugir dela. Exorta-nos a aceitar as dificuldades como etapas necessárias para conseguir melhores resultados.

No evangelho de Marcos (Mc 1,29), vemos Jesus fazendo milagres em Cafarnaum, no início de sua missão. Começou curando a sogra de Pedro, que estava com febre e apenas com o toque da sua mão, a curou. A notícia se espalhou e logo a frente da casa de Pedro estava tomada por uma multidão de pessoas doentes e possessas, pedindo para serem curados, e Jesus curou a todos. Nunca é demais lembrar que as referências a pessoas possessas, em geral, diz respeito aos portadores de enfermidades psíquicas, cuja disfunção do comportamento era confundida com ação demoníaca.

Estes relatos do evangelista Marcos nos mostram a missão de Jesus como aquele que veio para retirar os sofrimentos das pessoas. Os portadores de quaisquer enfermidades eram curados e depois de fazer isso em Cafarnaum, Jesus quis ir com os discípulos para as cidades e aldeia vizinhas, a fim de ali também pregar sua palavra, pois para isso foi que ele veio. Essa imagem literária da ida às cidades e aldeias vizinhas significa o universalismo da doutrina cristã. Jesus demonstrou que Ele não deveria ficar em um determinado lugar e as pessoas virem a ele, mas que Ele mesmo deveria ir aonde as pessoas estivessem passando por necessidades.

Por extensão, essas cidades e aldeias se alongam até chegar aos nossos dias, às nossas cidades, às nossas casas. Jesus sinaliza que a sua mensagem não pode ficar restrita apenas a um determinado local ou a pequenos grupos, mas precisa alcançar também as redondezas e expandir-se pelo mundo inteiro. E sinaliza também que o nosso compromisso de cristãos não nos deve restringir a praticar o ensinamento de Cristo somente no templo ou no nosso pequeno grupo, mas deve nos acompanhar para onde quer que estejamos.

Uma outra referência do evangelho de Marcos, que não pode passar despercebida, é o comentário que ele faz sobre a oração de Jesus, na madrugada (Mc 1, 35): “De madrugada, quando ainda estava escuro, Jesus se levantou e foi rezar num lugar deserto.” Jesus passou todo o dia a curar e à noite foi rezar. A cura deve sempre estar acompanhada da oração. A boa ação praticada deve estar sempre acompanhada da boa oração, aliás, uma coisa chama outra. Ninguém será capaz de realizar boas ações se não se preparar para isso com a oração. Jesus, mesmo sendo Deus, estava sempre a orar, ou seja, através da oração, ele estava se unindo ao Pai e se preparando para as novas curas que iria produzir. Em toda a história do cristianismo, os santos que mais operaram milagres foram exatamente aqueles que tinham mais vida de oração. Aliás, todos os santos tiveram sempre uma exemplar vida de oração. Sem a oração, sem a comunhão com Deus, não conseguiremos realizar boas obras.

É muito comum as pessoas só se lembrarem de orar nos momentos de sofrimento, no entanto, a oração deve ser uma atitude constante, em qualquer situação. Jesus orou nos momentos de sofrimento também, mas ele orava sempre e a sua oração sempre foi mais de ação de graças do que oração-pedido. Exemplo melhor disso foi o que Ele deu quando os discípulos pediram que Ele os ensinasse a rezar: santificado seja o teu nome... venha o teu reino... faça-se a tua vontade... Que a oração do Pai Nosso não seja para nós um simples mote de repetição, mas uma fonte de inspiração para fazer da nossa vida uma contínua oração de ação de graças.

4º DOMINGO COMUM – PROFETAS DE ONTEM E DE HOJE – 29.01.2012



Caros Confrades,

A liturgia deste domingo (4º do tempo comum) nos convida a refletir sobre a vocação profética. De início, deixemos de lado aquele conceito genérico de profeta ser aquele que adivinha coisas futuras. Na verdade, a palavra profeta é formada pelas palavras gregas pro+femi, sendo pro=adiante de, em lugar de e femi=manifestar, falar, que no próprio grego forma a palavra prophetés=o que fala em lugar de, sendo desde o início entendido como um intérprete dos deuses. Portanto, compreendamos o profeta bíblico como aquele que fala em nome de Javé.

O primeiro profeta bíblico foi Moisés, aquele a quem Javé encarregou, lá no monte Sinai, de ir em nome dEle falar com o Faraó para que libertasse o povo. Moisés ficou todo atrapalhado, porque ele não sabia falar assim com desembaraço e além disso, quando estivesse diante do Faraó, a quem ele (Moisés) iria se referir? Lembremo-nos de que os hebreus não pronunciavam o nome de Javeh. Então, ele perguntou ao Senhor: quem és, para que eu diga ao Faraó. E Javeh respondeu: Eu sou. Essa história todos conhecem. Então, Moisés foi o primeiro a falar em nome de Javé, por ordem dele.

Na primeira leitura de hoje, do Deuteronômio, lemos a ordem de Javeh dizendo que vai suscitar no meio do povo um profeta, a quem o povo deverá escutar. E Javeh faz logo duas advertências muito graves e sérias: 1. para o povo - "eu mesmo pedirei contas de quem não escutar as minhas palavras que ele pronunciar em meu nome"; 2. para o próprio profeta: "se ele tiver a ousadia de dizer em meu nome alguma coisa que eu não mandei ou se falar em nome de outros deuses, morrerá". (Dt 18,19)

Vemos, assim, como a missão do profeta é importante e perigosa. Importante, porque ele fala em nome da maior autoridade que pode existir; perigosa porque quando Javeh mandar, ele irá falar seja onde for, pra quem for, o que for e isso pode levá-lo a alguma situação de risco, como de fato já levou; e perigosa tb porque se ele falar algo que Javeh não mandou, o próprio Javeh irá tomar satisfação com ele.

Meus amigos, assim foram os profetas de outrora, os do Antigo Testamento. Mas agora a leitura do evangelho de Marcos (1, 21) relata que Jesus falava na sinagoga e o povo o considerava um profeta, mas achava que era um profeta diferente, que falava como quem tem autoridade. Ora, eles não sabiam ainda, mas a diferença estava exatamente no fato de Jesus não falava em nome de Javeh, mas falava em nome próprio, porque Ele era um com o Pai. Daí porque, mesmo sendo considerado um profeta perante um povo acostumado a ouvir profetas, a voz de Jesus soava de um modo diferente dos outros profetas, de um modo novo, inaugurado por Ele. E quando Jesus mandou que os apóstolos saíssem pelo mundo evangelizando, então os transformou nos profetas dos novos tempos. Os apóstolos já não falavam em nome do Javeh do Antigo Testamento, mas em nome da Trindade, posto que, sobre eles, pela imposição das mãos de Jesus, estava depositada a autoridade do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

Quando nós fomos batizados em Jesus Cristo, nós recebemos dele esta mesma missão profética de ser sinal para os irmãos, de ser luz do mundo e sal da terra, está escrito tb no evangelho. Para os apóstolos e para os seus sucessores até hoje (bispos e presbíteros), a vocação profética é de liderança, de condução, de chefia. Mas para todos os batizados, a vocação profética é do testemunho, do exemplo, da vivência. Na carta aos Hebreus, está dito que Deus se manifestou, antigamente, de muitos modos, mas nos tempos atuais, Ele se manifestou de modo especial através de Jesus, seu Filho. Portanto, depois de Jesus, por força do seu evangelho, não será mais necessário que Javeh suscite um profeta dentro do povo, porque todo o povo agora é profeta, cada cristão manifesta, na sua vida, o testemunho da mensagem cristã para aqueles que não creem. Mas não podemos esquecer daquelas duas advertências de Javeh para os seus profetas, de ontem e de hoje: 1. falar sempre e nunca se omitir; 2. falar em nome dEle somente aquilo que Ele ensinou, não substituindo o seu ensinamento pelas suas próprias ideias, porque o que fizer assim sofrerá dano (será condenado).

Vejamos o que ensinou o Beato João Paulo II, na exortação apostólica Christifideles Laici, que tem como tema a vocação e a missão dos leigos no mundo e na Igreja (1988): "Por isso, a Igreja pede aos fiéis leigos que estejam presentes, em nome da coragem e da criatividade intelectual, nos lugares privilegiados da cultura, como são o mundo da escola e da universidade, os ambientes da investigação científica e técnica, os lugares da criação artística e da reflexão humanística. Tal presença tem como finalidade não só o reconhecimento e a eventual purificação dos elementos da cultura  existente, criticamente avaliados, mas também a sua elevação, graças ao contributo das originais riquezas do Evangelho e da fé cristã." O Papa falou aí em nome de Jesus para os seus profetas dos tempos atuais, ou seja, para nós. Na nossa vida pessoal e profissional, onde quer que estejamos, o batismo exige de nós a realização dessa vocação profética com a nossa prática, com o nosso exemplo, com o nosso testemunho.

Quero agora fazer um ligeiro comentário crítico ao que considero uma visão distorcida de Paulo, na epístola aos Coríntios, quando ele faz a comparação entre os casados e solteiros. É importante lembrar que este texto de Paulo é um dos argumentos da Hierarquia eclesiástica para obrigar o celibato aos que almejam ao sacerdócio. Parece-me que Paulo se contradiz quando afirma (1 Cor 7, 32): o homem não casado é solícito pelas coisas do Senhor; o homem casado preocupa-se com as coisas do mundo... Com todo respeito, eu penso que Paulo extrapolou o ensinamento de Jesus, que não fez distinção quanto a isso. Ora, eu entendo que a missão dada aos cristãos não pode se distinguir em razão do estado de vida escolhido. Será que o homem não casado só se preocupa com as coisas do Senhor, ou seja, não se preocupa tb com as coisas do mundo? e será que o homem casado só se preocupa com as coisas do mundo e não se preocupa com as coisas do Senhor? Com todo respeito, repito, mas me parece que Paulo foi preconceituoso, envolvido pelo mesmo preconceito que faz com que, ainda hoje em dia, exista o estigma de afastar a presença feminina dos lugares de destaque na Igreja, sobretudo ao sacerdócio. Argumenta-se que Jesus não quis, porque se quisesse, teria colocado mulheres no grupo. Bem, existe hoje uma corrente representativa de estudiosos que consideram que Maria Madalena tinha sim a chefia de uma comunidade, nos primeiros tempos do cristianismo, mas sua liderança foi aos poucos sendo escamoteada em razão de divergências doutrinárias com Pedro e Paulo e por causa de ciúmes mesmo que os apóstolos tinham da amizade que Jesus mantinha com ela. Foi daí que aquele espertalhão Dan Brown criou a fantasia de que Jesus tinha um 'caso' com Madalena e isso até se transformou num filme. Não se trata disso, mas acredita-se que Jesus tinha conversas reservadas com Madalena e devia falar para ela certas coisas que não dizia para os demais. Todos nós sabemos que as mulheres têm uma percepção das coisas que é diferente dos homens. Pois bem, não quero entrar nessa polêmica, pois este assunto é muito melindroso. Quero apenas destacar o aspecto do preconceito que, na carta aos Coríntios, ao meu ver, aparece bem claramente, em relação aos casados, como se somente os solteiros estivessem disponíveis para as coisas do Senhor. Ainda que, na época de Paulo, isso fosse coerente com a realidade, acho que nos dias atuais, tal não mais ocorre. Mas, como disse, é apenas um breve comentário sobre esse 'ato falho' de Paulo.
Meus amigos, reflitamos sobre a maneira como cada um de nós está pondo em prática a sua vocação profética no mundo de hoje e que o Mestre nos ensine e estimule cotidianamente a fidelidade à nossa missão de cristãos na sociedade.

3º DOMINGO COMUM – 22.01.2012 – O TEMPO DA CONVERSÃO



Caros Confrades,

A liturgia deste 3º domingo comum nos convida a refletir sobre o tempo. Antes, porém, de abordar diretamente as leituras bíblicas de hoje, farei duas breves referências. Primeiro, quando falo sobre tempo, sempre me recordo de Frei Timóteo, que gostava de repetir: tempus salus mortalium ( o tempo é a salvação dos mortais), uma alusão às diversas possibilidades que a vida nos oferece para fazer as múltiplas coisas de que precisamos, porque não podemos fazer tudo ao mesmo tempo. Segundo, filosoficamente falando, eu considero que Kant foi quem melhor conceituou o tempo. Disse ele que o tempo não existe objetivamente, mas é uma criação da nossa subjetividade. Nas palavras dele, o tempo é uma intuição pura da sensibilidade. Isso se mostra da seguinte forma: quando estamos fazendo uma coisa agradável, parece que o tempo passa bem depressa; quando algo está nos preocupando e queremos ver logo o resultado, parece que o tempo passa bem devagar. Ou seja, Kant tem toda razão.

Passando ao comentário dos textos, na primeira leitura, temos a história de Jonas, que é muito conhecida. O profeta foi enviado por Deus para Nínive, mas tomou outro caminho. Foi então que o barco foi atingido por grande tempestade e ele foi arremessado ao mar, quando um grande peixe o engoliu e depois o vomitou perto da praia. Então, ele resolveu fazer o que Deus mandara e foi pregar ao povo de Nínive: Dentro de 40 dias, a esta cidade será destruída, se não vos converterdes. O povo se converteu e Deus suspendeu o castigo que iria mandar. Notem aqui aparecendo de novo a simbologia do numero 40, que já comentamos em outra oportunidade.

Nínive era a capital da Assíria, uma megalópole daquele tempo, talvez maior do que é Fortaleza nos dias de hoje, porque o texto afirma que eram necessários três dias para atravessar a cidade. Era um local de muitas perversidades, como toda grande cidade. O profeta Naum a chamara de cidade sanguinária, cheia de mentiras e de roubo (Na 3,1), por isso Javeh iria transformá-la num deserto. Mas com a pregação do profeta Jonas, o rei e os cidadãos se converteram e fizeram penitência, assim o castigo foi evitado.

Na segunda leitura, Paulo exorta os fiéis de Corinto para viverem o seu tempo, mas com os olhos na eternidade (1Cor 7,29): “os que têm mulher vivam como se não tivessem mulher; os que usam do mundo, como se dele não estivessem gozando. Pois a figura deste mundo passa.” Corinto foi uma comunidade fundada por Paulo e os coríntios entenderam a sua pregação como se a volta de Cristo fosse acontecer logo naqueles dias. Alguns não queriam mais nem trabalhar, deixaram tudo de lado só esperando a nova vinda de Cristo. Então, Paulo os adverte: não é bem assim, não se sabe o dia nem a hora, por isso, cada um deve viver no mundo e usar o mundo, mas sem se apegar a ele, porque isso passa e o tempo é breve. A tradução da CNBB diz 'o tempo está abreviado', mas não me parece muito fiel assim. Paulo diz, no texto latino, 'tempus breve est', literalmente, o tempo é breve, isto é, passa muito rápido, com isso todos nós concordamos. Então, é preciso viver com os pés no chão, mas com os olhos no futuro, isso significa uma metanóia, ou seja, literalmente meta=além e nóia=pensamento, portanto, pensar além, ter uma mudança de mentalidade, em outras palavras, uma conversão.

No evangelho de Marcos (1, 14-20) observamos uma ligeira incoerência com o evangelho de João, lido no domingo passado, acerca do chamado de Pedro. No texto de Marcos, Jesus estava passando pela praia e viu Simão e André, seu irmão, e os chamou. No texto de João (1, 42), André era discípulo de João Batista e viu quando este falou sobre Cristo: eis o Cordeiro de Deus, então passou a segui-lo e apresentou a Ele seu irmão Simão. Como isso se explica? Primeiro, temos que considerar que o evangelho de Marcos é bem mais antigo, foi escrito cerca de 40 anos antes do evangelho de João. Segundo, importa lembrar que o evangelho de Marcos é uma compilação de textos que ele conhecia e estes textos foram escritos em comunidades diferentes, ou seja, foram cópias de tradições orais, histórias que passavam de boca em boca, não eram como se fossem atas de reuniões ou relatórios, eram 'contos populares' orais. Em terceiro lugar, precisamos ver que na época de João, por volta do ano 100, muitas dessas divergências já haviam sido observadas e corrigidas, de modo que o texto de João é mais elaborado, mais pesquisado, mais coerente. Portanto, não devemos considerar como se o texto de Marcos esteja errado, mas apenas que se trata de uma incoerência textual que foi posteriormente corrigida. O que verdadeiramente importa não é se foi na beira do lago da Galiléia, como disse Marcos, ou num lugar qualquer, como disse João, mas o que interessa é que eles foram chamados e atenderam ao chamado, eles aceitaram a proposta de Cristo para mudarem de vida. Em vez de ser pescadores de peixes, passariam a ser pescadores de pessoas. Para isso, eles tiveram de mudar de vida, mudar o modo de pensar, fazer uma metanóia, ou seja, uma conversão.

Muitas vezes, nós utilizamos a palavra 'conversão' apenas no sentido de alguém deixar uma vida de pecado e passar a viver cristãmente. Isso também é conversão, claro, mas não apenas isso. Todas as vezes que nós procuramos compreender melhor o que Deus espera de nós, todas as vezes que nós refletimos sobre o chamado que recebemos e buscamos dar uma resposta sempre melhorada, está ocorrendo em nós uma conversão. Como os confrades puderam observar, a origem desta palavra está no vocábulo grego metanóia, que significa levar o nosso pensamento para uma dimensão além daquela que estamos acostumados a fazer, significa procurar ver a mensagem de Deus através dos acontecimentos da nossa vida e mudar nossas atitudes, significa uma busca contínua por ser um ser humano melhor, mais humanizado, mais sensível aos chamados e às necessidades dos irmãos. Nessas ocasiões e em diversas outras mais, estaremos exercitando uma mudança de mentalidade, uma nova forma de pensar, estaremos levando o nosso pensamento para além da sua fronteira atual, ou seja, estamos realizando uma metanóia (conversão).

Por isso, eu comecei este comentário com aquele bordão de Frei Timóteo: o tempo é a salvação dos mortais, porque nós precisamos estar sempre reavaliando nosso modo de ser e, para isso, Deus está sempre se manifestando a nós de diversos modos. Muitas vezes, nós não percebemos bem isso e deixamos passar aquela oportunidade. Então, acontece um outro fato a nos chamar a atenção e nos é dada nova chance. Isso não seria possível sem a dimensão temporal, sem a sucessão dos fatos, sem a sequência dos acontecimentos. Por isso, a frase de Frei Timóteo, dita de outro modo, significa que sempre é tempo de conversão, sabendo aproveitar as diversas oportunidades que Deus nos dá através do tempo, alcançaremos a salvação.

2º DOMINGO COMUM – FALA SENHOR - 15.01.2012



Caros Confrades,

Retornando às nossas casas, após o nosso agradável e fraterno II ENSESE no bucólico Mosteiro da Serra do Estêvão, é tempo de refletir sobre o tema litúrgico deste 2º domingo comum, centrado no chamado ou na vocação. Na homilia da missa do sábado, dia 14, o nosso confrade Frei Wilson destacou alguns pontos importantes deste tema, por isso, sem ser repetitivo, eu gostaria de abordar outros destaques.

De início, quero lembrar aquela melodia do nosso confrade Gregório, que o Frei Higino gostava muito de nos ouvir cantando: "Falai, Senhor, que vossos servos vos ouvem e desejam instruirem-se para melhor conhecer-vos e mais ardentemente amar-vos", homenageando o nosso fradeco falecido. Ele tomou como tema exatamente o mote bíblico de 1 Sm 3, 10, o chamado de Javeh a Samuel. Este era um jovem que nunca havia tido contato com o Senhor e por isso não identificou, de início, o chamado. Quantas vezes, isso tb acontece conosco, que embora não sejamos jovens de idade como o Samuel da leitura, mas não conseguimos ouvir ou identificar o chamado que nos chega da parte de Deus. Este chamado nem sempre é assim tão claro e insistente, como sugere a 1a. leitura, às vezes, ele é sutil e delicado, que é quando o chamado vem através da voz do irmão necessitado, por exemplo. Outrora, nós fomos conduzidos até o Seminário, por termos ouvido um chamado através dos nossos pais, parentes, sacerdotes ou através de acontecimentos marcantes, que nos impulsionaram até lá. O fato de termos saído do seminário não significa que nós renunciamos a seguir o chamado, mas apenas que Deus nos deu oportunidade de seguir este chamado, através de outras atividades, que não as da vida religiosa consagrada.

Esses dois encontros realizados em Quixadá, 2011 e 2012, deixou bem claro este fato. Eu achei muito curioso o depoimento do nosso confrade Frei Joao Batista, que nao participou do encontro anterior, na hora em que o Frei Leão perguntou o que tinha significado o Seminário para a vida dele e ele respondeu simplesmente: TUDO. Se nos lembrarmos bem, foi exatamente essa a impressão que todos deixaram no encontro do ano passado, quando cada um dos participantes teve seu momento de depor para o grupo. Se ele tivesse ouvido os depoimentos dos outros, poderíamos até dizer que ele teria sido sugestionado a dizer isso, mas não, ele falou isso de própria inciativa. Ora, meus amigos, o que significa esse TUDO senão que todos nós continuamos seguindo o chamado, cada um percorrendo o seu próprio caminho? E as nossas esposas, induzidas por nós, também estão participando e colaborando neste seguimento, ou seja, o chamado dirigido a cada um de nós não ficou apenas em nós, mas se estendeu e multiplicou sobre nossas esposas e nossos filhos. Quando a gente se comunica com um colega que há muito tempo não vê e sabe que ele atua, de alguma forma, nas atividades da paróquia, nos grupos de oração, nas tarefas pedagógicas, percebe-se que esse é o seu modo pessoal de seguir e atender ao chamado do Senhor.

Na leitura do evangelho de João (1, 42), vemos a narração do chamado especial de Cristo dirigido a Pedro. Pelo que se deduz da narrativa joanina, logo na primeira vez que Pedro foi apresentado a JC pelo irmão dele, André, JC foi logo dizendo: teu nome é Simão, mas serás chamado Kéfas. Não é de admirar que só o olhar para Pedro já foi suficiente para JC entender que ele era um grande cabeça-dura, como depois ele demonstrou com seus atos. Mas era exatamente esse cabeça-dura que JC queria para ser o chefe (kéfas) da sua ekklesia.

Observem alguns aspectos interessantes da análise do vocábulo KÉFAS. No próprio texto do evangelho (1,42), o evangelista João se preocupa logo em traduzir kéfas. Lembremo-nos que o evangelho de João foi escrito por volta do ano 100 d.C. e nessa época a figura de Pedro já estava consolidada como chefe da Igreja. No texto latino, diz assim: quod interpretatur Petrus - Petrus com letra maiúscula (tradução literal: que se interpreta como Pedro). No texto grego original está escrito: ó hermeneuetai Petros, isto é, igual ao texto latino, Pedro. A palavra kéfas não é grega, mas aramaica, a língua falada por Cristo. Segundo a internet, kéfas em aramaico significaria 'rochedo esburacado'. Por isso, João disse que Kéfas se interpreta como Petros, ele não disse que era sinônimo de pedra. E João fez isso, como escrevi acima, cerca de 30 anos após a morte de Pedro, certamente lembrando a passagem de Mateus (13, 18). Isso significa que se trata de uma reflexão do próprio João, lembrando das palavras de Cristo e ao mesmo tempo vendo como essas palavras tinham se realizado historicamente no desenvolvimento da comunidade cristã.

Apenas para recordar, o evangelho de Mateus foi escrito originalmente em aramaico (a língua falada por Cristo) e só depois traduzido para o grego. Portanto, deduz-se que foi através desta passagem de Mateus (13,18 - tu es Petros e sobre esta Petra edificarei a minha igreja)  que a palavra kéfas foi introduzida no idioma grego e deste, transferida para o latim.

Um outro aspecto tb interessante da palavra kéfas, que por não ser grega nem latina, ela foi simplesmente transliterada nos dois idiomas - quero dizer: tanto em grego como em latim, foi copiada a sua pronúncia do aramaico. Mas por uma feliz coincidência, kéfas contém a primeira parte da palavra grega kefalé, que significa 'cabeça', então o chamado de Pedro foi especial porque JC o colocou, ao mesmo tempo, como fundamento (alicerce) e tb como chefe (cabeça).

Percebemos assim que as leituras de hoje abordam tanto o chamado individual, que JC faz a cada um de nós para segui-lo e dar testemunho dEle, a vocação de todos nós, como tb o chamado específico de Simão para ser o chefe, simbolizando, através da pessoa dele, que ele (Pedro) seria o Seu substituto para continuar a missão, depois que ele voltasse para o Pai. Indiretamente, JC está nos dando o sinal da obediência que a comunidade eclesial deve prestar a Pedro e aos seus sucessores, como se fosse obediência a ele próprio. E é assim que a Igreja de Cristo vem se mantendo firme e forte através dos séculos.

Conta-se (não sei se é verdade) que Napoleão Bonaparte, quando assumiu o trono como imperador da França, no final da Revolução Francesa, chamou o Bispo e disse a ele que tinha como objetivo destruir a Igreja. O Bispo fez um sorriso sarcástico e falou: pode até ser que Vossa Majestade consiga, porque os padres e bispos vêm tentando fazer isso faz anos e nunca conseguiram... e nem conseguirão. Os homens, mesmo os dirigentes eclesiais, passam e a ekklesia de Cristo vai se mantendo e se fortificando.

Aproveitemos para refletir de que modo cada um de nós, nas nossas vidas na familia, no trabalho, no lazer, no estudo, na educação dos filhos, prossegue com fidelidade sendo fiel ao chamado que nos foi dirigido.

DOMINGO DA EPIFANIA – 08.01.2012 - Os magos e a estrela



Caros Confrades,

Na festa litúrgica de hoje, celebramos o domingo da Epifania. A festa da epifania é repleta de simbolismos e carregada de polêmicas intrarreligiosas. No Brasil, por causa do acordo com o governo, não é mais celebrada no dia 6 de janeiro, a sua data básica, mas no domingo seguinte. A igreja grega celebra a festa do Natal neste dia, divergindo assim da igreja romana. Os colegas devem saber que a celebração do Natal no dia 25 de dezembro foi um aproveitamento de uma festa pagã mais antiga, em homenagem ao deus-sol e que os imperadores romanos cristãos transformaram na festa do nascimento de Cristo, por ser Ele o novo sol que nasceu para o mundo. Mas os padres da igreja grega não concordaram com esse aproveitamento da festa pagã e a celebração do Natal é feita lá em 6 de janeiro.

Etimologicamente, epifania (epi-fainow) é traduzida por manifestação, enquanto a palavras matrizes do nome significam: epi=através de, sobre, acerca de; fainow=verbo brilhar, aparecer, fazer-se notar. Portanto, epi-fainow seria literalmente aparecer através de, fazer-se percebido sobre, ou seja, o termo manifestação está bastante adequado ao significado das raízes etimológicas. No caso, a epifania do Senhor é a sua apresentação pública à comunidade não apenas local, mas a todos os povos. Aí entra a tradicional figura dos Reis Magos, carregada de muitos simbolismos e fonte de inspiração de muitas tradições.

Mas a grande questão é: quem eram? eram reis? eram mágicos? de onde vieram? quantos eram? o que vieram fazer? essas perguntas são respondidas de diversos modos e com muitas interrogações.
Sobre o tema, nesta semana o site Zenit, agência católica de notícias, divulgou uma entrevista com a professora Flavia Marcacci, professora de História do pensamento científico na Pontifícia Universidade Lateranense: Diz ela: "O Proto-evangelho de Tiago fala de uma "estrela" no Capítulo 21. Esta estrela teria precedido os Magos na sua viagem até ter parado acima da gruta da Sagrada Família.  Com relação ao Evangelho de Mateus (capítulo 2), que é o único que se refere à estrela, o Proto-evangelho adiciona um detalhe: tratava-se de uma “estrela grandíssima”, de notável esplendor, tão grande que obscurecia as outras estrelas do céu. Os outros Evangelhos não mencionam a estrela e nem os Magos. Por outro lado, Lucas fala de um anjo que surpreende com a sua luz os pastores (2,9) e da multidão do exército celestial que glorificava a Deus (2, 13-14). Agora, a luz, em geral, tem um valor simbólico muito importante – pensemos também no prólogo do Evangelho de João. Então se poderia dizer que também a estrela dos Magos certamente têm um significado simbólico, ainda mais porque na tradição judaica ela representava um sinal messiânico: tal interpretação é amplamente compartilhada hoje pelos exegetas."

A entrevista é longa e interessante, transcrevi apenas o pequeno trecho acima, porque está dentro do assunto que comecei a abordar. O que eu resumiria para vocês é o seguinte: eles eram sábios da Mesopotâmia, nem eram reis nem magos, como hoje nós entendemos essas palavras. De acordo com a Profa Flavia, eles eram estudiosos de astrologia, a ciência antiga que foi antecessora da astronomia, um misto de conhecimentos científicos, religiosos e místicos. A Mesopotânia era um local onde os estudos técnicos das ciências matemáticas (aritmética, geometria, álgebra e suas aplicações na engenharia, física e astrofísica) era muito desenvolvido, então esses 'cientistas' perceberam uma estrela diferente no firmamento e associaram isso às antigas profecias. Os sacerdotes de Herodes tb acertaram em cheio na profecia de Miquéias (5,1): em Belém, de Judá.

Há uma tradição que afirma que, quando eles chegaram perto de Jerusalém, a estrela desapareceu, por isso eles procuraram Herodes para se informar. Em Mateus, cap 2, isso não consta. Provavelmente eles foram procurar no palácio do rei, porque a profecia falava que nasceria o novo rei de Israel, então o mais lógico seria que ele fosse encontrado lá. Mas após a informação acerca de Belém, eles prosseguiram viagem seguindo a estrela em direção a Belém. Lá encontraram Maria e o Menino e ofereceram seus presentes (Mt 2,11): incenso, ouro e mirra. Talvez por causa disso, a tradição afirma que eram três os magos, mas no texto de Mateus, ele diz apenas que 'alguns magos do oriente chegaram a Jerusalém', não se sabe realmente quantos eram.

E outra grande incógnita: o que eles vieram fazer? de acordo com Mateus, eles vieram adorar o Salvador (2,11). Eu diria que eles vieram, de um lado, seguindo a curiosidade própria dos cientistas, com o objetivo de confirmar uma hipótese configurada nos estudos astrológicos deles; de outro lado, eu diria que eles vieram tocados pela luz divina, para chamar a atenção do mundo pelo nascimento do Messias. Se não fossem os 'magos', Herodes não saberia da sua existência, ou seja, por intermédio deles, o estado romano foi informado. A reação posterior de Herodes, mandando matar as crianças das redondezas, demonstra o aspecto político do nascimento do 'novo rei', um concorrente que não deveria sobreviver, conforme Herodes pensou ter feito. Devemos considerar ainda que a pregação de Cristo não chegou ao território da Mesopotâmia, mas o testemunho dos 'magos' deve ter transmitido a confirmação da notícia fidedigna do nascimento do novo rei dos judeus, portanto, mesmo nos povos não judaicos, a presença de Cristo foi anunciada, um prenúncio do que iria ocorrer tempos depois, com a difusão do evangelho.

Uma outra pergunta intrigante nesse contexto é: por que os outros evangelistas não se referem aos 'magos', mas apenas Mateus? Terá ele inventado essa história? Lucas fala de uma estrela muito brilhante que ofuscou os pastores e os impulsionou a procurar o estábulo onde o Menino nascera. João, mais tarde e de forma mais teologizante, fala que "não era ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz" (João 1,8). Alguns astrônomos, nos séculos posteriores, tentaram associar a estrela de Belém (dos magos e dos pastores) à passagem de algum cometa, talvez o cometa de Halley, fazendo cálculos retrógrados no tempo, mas não conseguiram demonstrar isso, porque a provável passagem deste cometa naquela época teria sido no ano 12 a.C., enquanto os historiadores apontam que Cristo teria nascido entre os anos 4 a 7 antes dele (vejam a contradição que o calendário nos faz mencionar). Mas essa hipótese do cometa teve muitos adeptos e foi muito forte na idade média, tanto que o pintor italiano Giotto compôs grandes painés incluindo um cometa no lugar da estrela de Belém, reforçando essa teoria, a qual porém não tem sustentação nos estudos científicos.

Penso que a explicação para o caso de apenas Mateus referir-se aos magos se deve ao fato de ele ter tido acesso a algum manuscrito que os outros evangelistas não conheceram. Os estudiosos dizem que o evangelho de Mateus foi o único escrito originalmente em aramaico, os demais foram escritos originalmente em grego. Isso denota que Mateus viveu em um local distante dos demais evangelistas e assim ele deve ter tido conhecimento de certas fontes desconhecidas dos demais. E tem ainda a confirmação do protoevangelho de Tiago, conforme citado na entrevista acima. Não deve, portanto, ter sido uma 'invenção' de Mateus, mas uma originalidade que somente por ele tivemos conhecimento nos textos canônicos.
Em resumo, meus amigos, não se pode dizer nem que foi nem que não foi. O que nos resta afirmar é que o simbolismo da luz associada ao nascimento de Cristo foi o responsável pela associação desta data com a festa pagã do deus-sol que colocou o Natal em 25 de dezembro. Que esta Luz que veio dissipar as trevas já estava prevista em Isaías (60, 1 - levanta-te Jerusalém porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor), aliás, é muito curioso como as profecias de Isaías são bastante transparentes em relação à chegada do Messias, parece que ele estava vendo, tal a fidelidade da descrição, sobretudo essas passagens do deutero-Isaías, como já mencionamos antes. Que essa Luz extraordinária ainda brilha para nós em cada celebração do Natal, porque embora esta festa seja celebrada todos os anos e não obstante todo o apelativo comercial em torno dela, ninguém fica indiferente a essa mística do Natal, que nos revigora a alma e nos faz de fato renascer a cada vez

E não podemos deixar de lembrar aqui tb a música do Tim Maia: hoje é dia dos Santos Reis, referindo-se aos reizados tão esquecidos em tempos da cultura dominada pela televisão.

E para completar, sem me alongar, referirei apenas brevemente a celebração de amanhã, 9/1, a festa do batismo de Jesus. Neste ano em que o Natal coincide com o domingo, algumas festas ficam atropeladas e passam para a semana. O batismo de Jesus comemora o início de seu ministério público e é tb a primeira epifania (manifestação) da Trindade, pois de acordo com o testemunho do evangelho, ao sair da água, ouviu-se a voz do Pai e o Espírito Santo foi visto em forma de pomba. Eram as três pessoas divinas saudando e oficializando o início da propagação da boa nova da salvação.

Como autênticos cristãos, aproveitemos a data para renovar os nossos compromissos de batizados na água e no Espírito Santo.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

DOMINGO DA PAZ – 01.01.2012



Caros Confrades,

Neste final de semana, dada a coincidência do domingo com o primeiro dia do ano civil, a liturgia foi mista, ou seja, no sábado (31/12), foi celebrada a Festa da Sagrada Família de Nazaré, a qual é comumente celebrada no domingo após o Natal, portanto, foi antecipada para o sábado; e hoje, dia 1/1, a Festa de Maria Mãe de Deus, coincidindo também com o dia mundial da paz.

Tem tudo a ver com a festa de Maria Mãe de Deus, porque ela é a rainha da paz, por ela chegou ao mundo a verdadeira paz. E tem tudo a ver tb com a figura do nosso Seráfico Patriarca, porque ele foi o artífice da paz no seu tempo. Basta lembrar, dentre tantos, o episódio da pacificação do lobo de Grubbio, os colegas devem se lembrar bem dessa história, que faz parte dos fioretti  de São Francisco. E a primeira leitura de hoje traz a emblemática oração da paz, contida no Livro dos Números, cap 6, 22, a qual era a saudação padrão de São Francisco, abreviada para a expressão Pax et Bonum. Mas a bênção da paz, tal qual foi dada por Javeh a Moisés para abençoar os filhos de Israel, era a oração clássica de São Francisco, principalmente quando um irmão estava em dificuldade: O Senhor te abençôe e te guarde; o Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e tenha piedade de ti; o Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz! Os colegas devem se lembrar que o nosso confrade Gregório compôs uma melodia para essa oração, a qual o Frei Higino gostava muito que se cantasse. Eram duas músicas do Gregório, que o frei Higino adotava como costume: aquela Falai, Senhor, que vossos servos vos ouvem... e a da paz.

Convém tb mencionar nesse contexto, a Oração de São Francisco: Senhor, fazei de mim um instrumento da vossa paz... essa a sua oração mais característica. Por isso, afirmei acima que São Francisco foi um artífice da paz no seu tempo.

Abordando agora um pouco o tema litúrgico de hoje - Maria Mãe de Deus, vale lembrar que esse tema é bem característico da cultura católica ocidental e perene fonte de polêmica com os seguidores de Lutero, que não acreditam nisso. Nos primeiros tempos do cristianismo, surgiu a dúvida se Maria era mesmo mãe de Deus, ou apenas mãe de Cristo enquanto homem. Um bispo daquele tempo, chamado Nestório, afirmava isso categoricamente e foi proclamado hereje, porque não abdicou desse ponto de vista, quando a Igreja reafirmou a fé em Maria como Mãe de Cristo como Deus e como homem. Está no relato bíblico de Lucas, quando Maria foi visitar Isabel e esta vaticinou: de onde me vem a dita de que a mãe do meu Senhor venha me visitar? (Lc 1, 39) A doutrina de Nestório se coloca na mesma trilha de outro Bispo daquele tempo, chamado Ario, que afirmava que Cristo sofreu apenas como homem, porque como Deus ele não podia sofrer. Ora, isso seria negar a verdadeira humanidade de Cristo, era como se Ele fosse apenas um Deus disfarçado de homem, em forma humana, mas não um verdadeiro homem. Contra essas tendências, logo nos primeiros séculos, o Concílio de Nicéia (325 d.C.) veio confirmar a dupla natureza humana e divina de Cristo.

Um outro aspecto desse tema Maria Mãe de Deus, que é tb fonte de intermináveis polêmicas contra os não católicos é a respeito de Maria ter tido outros filhos, além de Jesus. Lutero e seus seguidores dizem que sim, porque na Bíblia consta que Maria deu à luz o seu primogênito (Lc 2,7), ou seja, filho primogênito é o primeiro filho, o mais velho e, portanto, houve outros filhos de Maria. Esta passagem é combinada com outra (Mt 12, 46), que diz assim: lá fora estão tua mãe e teus irmãos, que querem te ver. Não faz muito tempo, foi divulgada na imprensa a descoberta de um túmulo onde há a inscrição: Tiago, irmão de Jesus, isso foi um prato cheio para os protestantes. Pois bem, a exegese católica explica que a palavra grega 'adélphos', que é traduzida no latim por 'frater' e em português por irmão, tem um significado mais amplo do que na nossa língua. Assim, quando o grego usava a palavra adélphos não estava se referindo necessariamente a irmão de sangue, mas a um membro da família com parentesco próximo, por exemplo, um primo. Considerando que as famílias antigas eram muito numerosas, ou seja, moravam na mesma habitação do chefe da família os filhos destes, com os respectivos genros e noras e filhos destes (netos do chefe da família), então aquele aglomerado de pessoas era considerado uma família só e assim, mesmo aqueles que não eram filhos do mesmo pai/mãe eram considerados 'adelphos' num sentido amplo.

Esta explicação, contudo, não é aceita pela doutrina protestante e por isso eles criticam os católicos, que têm essa devoção extraordinária para com Maria, que muitas vezes supera a própria figura de Cristo, que devia ser o centro das atenções. Não se pode tirar totalmente a razão dos protestantes, porque a catequese tradicional deixou mesmo essa marca, não só em relação a Maria, mas aos santos em geral, que se apresentam na mente do fiel de uma forma bem mais enfática do que a figura de Cristo. No caso de Maria, incide toda a carga cultural da figura materna, que é um arquétipo fortíssimo na nossa cultura ocidental e se transfere para a vivência religiosa, nada de admirar, portanto, que tenha toda essa penetração na piedade popular.

Polêmicas à parte, a festa litúrgica de hoje nos recorda a importância do 'sim' de Maria, para que se realizasse, através dela, o mistério da nossa redenção. Que a Rainha da Paz nos ensine a ser verdadeiros instrumentos da divina paz, tal qual nos ensina o Seráfico Pai.
Renovados votos de Feliz Ano Novo a todos.

DOMINGO DO NATAL – O PAPA E O POVERELLO – 25.12.2011



Caros Confrades,

Ainda é tempo de renovar os votos de Feliz Natal, já que estamos em pleno Dies Nathalis.

Neste domingo, coincidente com o Natal, quero partilhar com vcs um trecho da homilia do Papa na missa da vigília (24-12-2011). Não farei, portanto, comentários meus. Ao ler a homilia do Papa, achei muito mais oportuno repassá-las a vcs do que escrever minhas próprias reflexões. E por dois motivos fundamentais. Primeiro, é o Papa que está a comentar a liturgia de hoje. Segundo, o Papa faz uma homenagem muito significativa a São Francisco. Praticamente, toda a msg dele se concentra na pessoa do Seráfico Patriarca, demonstrando a importância deste para as comemorações do Natal que hoje fazemos.

Visto que o Papa não é originário de nenhuma ordem franciscana, pois é sacerdote diocesano, a homenagem que ele faz a São Francisco se torna mais significativa.

Faço uma conjetura, não sei se procede. Penso que a homilia foi escrita pelo pregador da Casa Pontifícia, Frei Raniero Cantalamesa, capuchinho. As citações que ele faz da biografia de São Francisco, sobretudo Tomás de Celano, são típicas de quem tem formação franciscana, no caso, o Frei Raniero. De qualquer maneira, oficialmente a homilia é do Papa.

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Natal é epifania: a manifestação de Deus e da sua grande luz num menino que nasceu para nós. Nascido no estábulo de Belém, não nos palácios do rei. Em 1223, quando Francisco de Assis celebrou em Greccio o Natal com um boi, um jumento e uma manjedoura cheia de feno, tornou-se visível uma nova dimensão do mistério do Natal. Francisco de Assis designou o Natal como «a festa das festas» – mais do que todas as outras solenidades – e celebrou-a com «solicitude inefável» (2 Celano, 199: Fontes Franciscanas, 787). Beijava, com grande devoção, as imagens do menino e balbuciava-lhes palavras de ternura como se faz com os meninos – refere Tomás de Celano (ibidem). 

(Homilia integral publicada no serviço informativo Zenit - http://www.zenit.org/article-29435?l=portuguese) 


 

4º DOMINGO DO ADVENTO – O 'SIM' DA REDENÇÃO - 18.11.2011



Caros Confrades,

A liturgia deste 4º domingo do advento celebra o 'sim' de Maria à mensagem do anjo Gabriel, tornando possível assim a nossa redenção. No ano litúrgico B, dedicado ao evangelho de Marcos, temos mais uma inserção de um trecho de Lucas, já que Marcos não aborda os temas específicos relacionados a Maria.

Na primeira leitura, do segundo livro de Samuel (2Sam 7,1), temos uma promessa escatológica de Javeh a Davi: "suscitarei, depois de ti, um filho teu, e confirmarei a sua realeza. Eu serei para ele um pai e ele será para mim um filho. Tua casa e teu reino serão estáveis para sempre diante de mim, e teu trono será firme para  sempre." Num primeiro momento, esta palavra de Javeh transmitida através do profeta Natan, se realizou na pessoa de Salomão, descendente de Davi, mas no contexto transistórico, trata-se de uma referência a Jesus Cristo, tb descendente de Davi, cujo reino será firme para sempre.

Interessante é observar tb que Davi estava preocupado em construir um templo para a Arca da Aliança, que estava abrigada numa humilde tenda de pano, enquanto ele (Davi) habitava um luxuoso palácio. Mas Javeh fez ver a Davi, através do profeta Natan, que naquele momento, o 'templo' que ele deveria construir não era de cedro nem de mármore, mas o templo-comunidade do povo, que vivia então um período de tranquilidade, depois da derrota dos inimigos. Javeh faz ver a Davi que, mais do que um templo de pedra, era necessário construir o templo de carne, ou seja, consolidar a fé do povo através de uma administração dedicada à união e à estabilidade social e ao cumprimento dos mandamentos. O templo-casa não é prioridade, pois Javeh quer habitar primeiro nos templos-corações dos seus fiéis. Sabemos, através dos relatos históricos, que Davi realmente se dedicou a isso durante todo o seu reinado e o seu filho Salomão foi o construtor do famoso templo de Jerusalém, o qual foi posteriormente destruído pelos exércitos romanos.

Na interpretação escatológica, futurística da promessa de Javeh a Davi, temos a anunciação do anjo Gabriel a Maria, uma jovem noiva de José, que era descendente de Davi, diz o evangelista Lucas (Lc 1,26). Pelo relato de Lucas, Maria ainda não estava casada com José, ou seja, ainda não coabitavam. Podemos imaginar o embaraço da jovem noiva quando soube que estava grávida antes do casamento, sem ter feito nada para isso. Daí o seu espanto, quando perguntou ao anjo: como pode ser isso, se não conheço homem algum? O nosso colega Bosco fez uma crônica recentemente, na qual referiu-se a essa situação incômoda de Maria, prestes a se casar. Foi quando o anjo disse que o Espírito Santo a cobriria com sua sombra, e então Maria deu o 'sim' mais célebre e fecundo de toda a história humana: faça-se em mim segundo a tua vontade.

Merece um destaque a análise textual deste verbo 'conheço' na frase 'não conheço homem algum'. Lemos no texto grego do evangelho de Lucas que o verbo original é gignósco. São Jerônimo, ao traduzir do grego para o latim o verbo gignósco escreveu cognosco. O verbo cognosco, em latim, está relacionado com o saber, a atividade intelectual. Mas o verbo gignósco em grego é bem mais profundo do que isso, tem o sentido de procurar aprender, buscar saber as coisas e tem tb o sentido de ter intimidades. Por razões culturais óbvias, a tradução jeronimiana se ateve ao aspecto intelectual da palavra, não ao seu sentido prático, conforme o contexto da conversa de Gabriel com Maria estava a sugerir. E quando fizeram a tradução da palavra para o português, manteve-se o mesmo viés intelectualizado do termo. Mas nem precisa explicar que a semântica própria do termo no contexto do diálogo tem o sentido de copular. A teologia mariana embasa-se nessa passagem para fundamentar a virgindade de Maria, um tema sempre muito caro na literatura teológica, tanto que ela é sempre tratada como a Virgem Maria.

Nesse contexto do evangelho de Lucas vemos então dois testemunhos fortes da intervenção divina na história: a virgindade fecunda de Maria e a senilidade também fecunda de Isabel, sua prima. Porque para Deus nada é impossível, arremata o anjo Gabriel. Com efeito, Isabel já tinha passado da idade geratriz e não tivera filhos. Fato semelhante já havia acontecido no antigo testamento com Sarah, esposa de Abraão. Naquela situação histórica do povo hebreu, em que todas as mulheres eram estimuladas a terem muitos filhos, porque um deles poderia ser o Messias prometido, a maior decepção ou frustração da mulher era não gerar filhos. As não geratrizes, as estéreis se consideravam castigadas por Javeh, que não lhes havia dado aquela oportunidade de gerar o Messias. Então, na concepção de Jesus Cristo, podemos constatar duas intervenções miraculosas de Javeh, em momentos bem próximos: Isabel, que era considerada estéril, estava no sexto mês de gestação e Maria, que nunca copulara, estava grávida permanecendo virgem.

Num outro trecho do evangelho, lemos o embaraço tb de José, ao saber da gravidez da noiva, antes de coabitar com ela. Pela lei de Moisés, ele (José) deveria denunciá-la aos sacerdotes por prática sexual ilícita e o resultado disso todos nós conhecemos: apedrejamento até a morte. Então, José tinha decidido 'deixá-la secretamente', ou seja, ele iria fugir para não denunciar Maria, pois estava totalmente confuso. Ao mesmo tempo em que confiava em Maria, não conseguia entender aquela gravidez. Foi quando o anjo anunciou-lhe em sonho que o filho de Maria era obra do Espírito Santo. Assim, a situação se esclareceu e José criou e cuidou do Filho como verdadeiro pai.

O 'sim' de Maria, portanto, foi totalmente preparado e administrado pelo Pai, no entanto, isso só foi possível porque ela aceitou, mesmo sem entender. Atendendo à exortação do anjo "não temas, Maria", ela, mesmo antevendo todo o conjunto de consequencias que dali adviriam, não hesitou, não pediu tempo pra pensar, não deixou pra depois. Foi um ato de fé perfeito e total, semelhante ao de Abraão, quando Javeh mandou que ele sacrificasse Isaac, seu único filho, e ele, mesmo sem entender, aprontou-se para cumprir fielmente a determinação.

Meus amigos, o 'sim' de Maria é pleno e perfeito, do tamanho da sua fé. Quando o anjo a saudou 'ave, cheia de graça' (gratia plena), ele já sabia tb que Maria não recusaria. A palavra 'cheia' em português não tem o mesmo sentido profundo e completo do que a palavra latina 'plena'. Cheia pode ser algo não tão intenso, tanto que, quando queremos enfatizar, dizemos que algo está 'cheio até a tampa'. Plena é já em si uma coisa cheia onde não cabe mais nada, porque já está totalmente lotada, impregnada (in-pregnada). Vejamos como esta palavra tb tem relação etimológica com prenhez (pregnantia, em latim). Fica até um sentido duplo, quando o anjo diz: (em latim) Ave, gratia plena. Plena aí tem tanto o sentido de completa, sem lacuna, quanto ainda o sentido de prenhez. O útero prenhe está completo e perfeito em si mesmo, não admite a presença de outro componente, porque já não há mais espaço disponível. A palavra 'cheia', em português, não tem um sentido tão amplo e profundo quando a palavra latina 'plena', mas assim podemos ver melhor as suas possibilidades interpretativas.

Que a Virgem Maria nos ensine a ter uma fé plena e sem restrições, tal como foi a atitude positiva dela diante do anjo.

3º DOMINGO DO ADVENTO – MAGNIFICAT - 11.12.2011



Caros Confrades,

A liturgia deste terceiro domingo do advento traz uma conotação de alegria: Magnificat anima mea Dominum... quantas vezes nós cantamos essa estrofe lá no Seminário. É este o tema do salmo responsorial deste domingo, aproveitando o texto do evangelho de Lucas.

Temos, na primeira leitura, outra vez um trecho do deuteroIsaías (cap 61), de grande inspiração futurística e que o próprio JC, certa vez, ao fazer uma leitura na sinagoga, escolheu de propósito este trecho para ler: "O Espírito do Senhor Deus está sobre mim, porque o Senhor me ungiu; enviou-me para dar a boa-nova aos humildes, curar as feridas da alma, pregar a redenção para os cativos e a liberdade para os que estão presos; para proclamar o tempo da graça do Senhor." Conforme Lucas testemunha, em 4,21, ao terminar de ler este trecho, JC sentou-se e todos ficaram olhando para ele, esperando o que ele iria dizer. Então Ele disse: hoje se cumpriu aquilo que o Profeta predissera. Meus amigos, JC declarou, sem meias palavras, que Ele era aquele sobre quem o profeta Isaías havia escrito aquelas palavras. É curioso como os fariseus e os mestres da lei, presentes na sinagoga, ouviram isso e não entenderam. Ou não quiseram entender, talvez.

Este trecho de Isaias (cap 61) está em total sintonia com a leitura do evangelho de João (cap 1, 19) falando a respeito do outro João. Aliás, saindo da regra básica, a CNBB coloca para nossa leitura neste domingo um trecho do evangelho de João (deveria ser de Marcos, por ser ano B), mas a justificativa deve estar ligada à reflexão teológica feita por João evangelista sobre a missão do outro João, o batista. Quando os emissários dos fariseus perguntaram ao Batista: quem és tu? o Messias, um novo Elias, outro profeta? João Batista respondeu repetindo outro trecho de Isaias: eu sou a voz que clama no deserto... Mas eles não ficaram satisfeitos e perguntaram novamente: dize quem és tu, para que possamos responder aos que nos enviaram... Esta forma inquisitorial do diálogo dos enviados dos fariseus com o Batista, que é narrada apenas por João Evangelista, denota um certo grau de oficialidade na conversa. Era como se fossem Oficiais de Justiça cumprindo mandado por ordem de um Juiz. E perguntaram mais: por que batizas, se não és nem o Messias nem algum dos profetas? E o Batista terminou não dizendo quem era ele mesmo, mas avisou: no meio de vós está o que virá depois de mim e eu não sou digno nem de desamarrar as sandálias dos pés dele.

O que se observa nesse diálogo é uma reflexão teológica bem posterior aos evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas), pois vai além de uma simples narrativa. Na verdade, João, o evangelista, está doutrinando para a sua comunidade sobre o importante papel do outro João, o batista, na preparação da atividade pública de JC. De fato, todo o primeiro capítulo do evangelho de João é uma grande reflexão teológica. O prólogo (No princípio era o Verbo, o Verbo estava em Deus, o Verbo era Deus...) durante muito tempo era lido em todas as missas, como último evangelho. Todos os Colegas devem se recordar disso. Somente com as modificações litúrgicas efetuadas após o Concilio Vaticano II, esta leitura foi retirada. Isso indica que o tema deste primeiro capítulo foi escrito pelo próprio João, ele não retirou esses ensinamentos de outros escritos (como as narrativas sobre os milagres, por exemplo), esse era o desenvolvimento das primeiras reflexões da teologia nascente, que foi muito fertilizada com as cartas de Paulo. João (o batista) veio como testemunha, para dar testemunho da luz, para que todos chegassem à fé por meio dele, diz João (o evangelista), no cap 1, 7.

De acordo com os registros históricos, Paulo foi martirizado no ano 67 d.C., portanto, as cartas paulinas foram escritas antes desta data. Já o evangelho de João foi escrito por volta do ano 100 d.C., ou seja, uns 70 anos após a morte de Cristo. Como todos sabem, João era o discípulo mais jovem, foi o único que não morreu mártir e viveu muitos anos. Se na ocasião da morte de JC João devia ter por volta de 20 anos, ao escrever o seu evangelho, ele teria em torno de 90 anos de idade. Com certeza, João tinha conhecimento e muito provavelmente teria lido pelo menos algumas cartas de Paulo (estas cartas circularam entre as comunidades cristãs, embora fossem dirigidas originalmente a uma delas), além do que João foi bispo em Éfeso, uma comunidade fundada por Paulo. João viajava muito pelas comunidades de toda a Ásia e foi nesta parte do mundo que foram fundadas as primeiras Escolas bíblicas da antiguidade (Antioquia e Alexandria). As escolas de Antioquia e de Alexandria foram as responsáveis pelos primeiros ensinamentos de exegese bíblica nos primeiros tempos do cristianismo, com certeza os ensinamentos de João Evangelista tiveram um papel muito importante na elaboração das primeiras reflexões teológicas produzidas naqueles tempos do cristianismo em expansão. Devemos nos lembrar tb que o livro do Apocalipse é da autoria de João, o que demonstra a sua grande produtividade intelectual.

Retornando ao tema deste domingo, a liturgia destaca a importância do trabalho preparatório de João Batista, neste tempo do Advento, em que a Igreja se prepara para o Natal do Senhor. O exemplo de João Batista serve de inspiração para todos nós prepararmos bem os caminhos e aplainar as veredas da nossa mente para a celebração da natividade, que se aproxima.

2º DOMINGO DO ADVENTO – BATISMO DA CONVERSÃO – 04.12.2011



Caros Confrades,

A liturgia deste 2º domingo do advento traz como tema o batismo da conversão. Mas antes de comentar diretamente o tema, gostaria de fazer umas observações preliminares.

Em primeiro lugar, ressaltar que o ano litúrgico de 2012, cujo segundo domingo ora celebramos, é classificado com a letra B, ou seja, é o ano litúrgico B. A CNBB, com o intuito de não repetir a cada ano as mesmas leituras nas missas, estabeleceu três modelos: o ano A, o ano B e o ano C. Há dois domingos, terminamos o ano litúrgico de 2011 (em 20.11.2011), que era ano A, no qual as leituras do evangelho dominical são retiradas de Mateus. Agora, iniciamos o ano B, no qual as leituras são retiradas do evangelho de Marcos. No ano C, em 2013, as leituras serão retiradas do evangelho de Lucas, com algumas inserções do evangelho de João. Depois, em 2014, retornará o ano A. Assim, as leituras só se repetem de três em três anos, porque estes três modelos fazem um revezamento.

A segunda observação se refere ao evangelho de Marcos. Conforme a pesquisa histórica, este evangelho foi o primeiro dos quatro evangelhos a ser escrito, por volta do ano 60 depois de Cristo. Portanto, o evangelho de Marcos foi escrito aproximadamente 27 anos após a morte de Cristo. Antes, pensava-se que o mais antigo era o de Mateus, mas os estudos técnicos demonstraram que o de Marcos foi o primeiro escrito. Antes dos evangelhos, havia grande quantidade de textos circulando nas primeiras comunidades cristãs, escritos por cristãos anônimos, a modo de cartas, abordando passagens diversas da vida de Cristo. Alguns destes escritos traziam os milagres, outros falavam dos discursos de JC, outros falavam das polêmicas de JC com os fariseus, outros narravam os sofrimentos de JC... então, os evangelistas Marcos, Mateus e Lucas reuniram estes escritos esparsos e deram uma sequência a eles, acrescentando aquilo que eles próprios sabiam e ouviram, formando assim os textos longos que temos hoje. Por terem utilizado basicamente as mesmas fontes, estes três evangelhos são chamados de sinóticos, ou seja, resumos. O evangelho de João, o último a ser escrito, além de ter-se baseado nas fontes dos primeiros, utilizou tb outras referências, além de ter incluído os primeiros elementos da reflexão teológica primitiva, assunto que não há nos três primeiros.

A terceira observação refere-se à pessoa do evangelista Marcos. Consta que ele era discípulo de Pedro e acompanhava a vida pública de Cristo à distância. Marcos estava presente no Jardim das Oliveiras e presenciou a prisão de JC, no momento da confusão, ele saiu correndo.

Bem, passando à análise do tema, vejamos o significado etimológico do batismo. Esta palavra deriva do verbo grego "baptizein", que significa mergulhar; batismo será assim o substantivo 'mergulho'. Era o que João Batista fazia com as pessoas que o procuravam no rio Jordão. Após as pessoas confessarem seus pecados, ele os mergulhava nas águas do rio, simbolizando com isso que o(a) pecador(a) ao mergulhar na água e retornar, é como se fosse um renascimento, uma nova pessoa. Daí o batismo da conversão. Conversão se diz em grego 'metanóia', que literalmente significa nova idéia, novo pensamento, nova mentalidade, nova compreensão. Quem se converte, passa a pensar e viver de outro modo, assume um novo estilo de vida.

Diz o evangelista que todas as pessoas da Judéia e de Jerusalém (Mc 1,5) iam ao encontro de João, confessavam seus pecados e eram 'batizados', ou seja, mergulhados no rio, para renascerem pela água. Mas João adverte (Mc 1,8) que depois virá um 'Outro' que batizará no Espírito. Isto já estava previsto tb em Isaías (Is 40, 3): preparai no deserto os caminhos do Senhor, endireitai as veredas. João pregava no deserto e as pessoas iam até ele, não era ele que ia à cidade chamar as pessoas.

Um dado interessante é que o batismo de João introduz uma novidade na ritualística do povo hebreu. Eles já tinham os procedimentos de penitência, que incluíam jejum, esmolas, orações, abluções (lavagem das mãos, sobretudo), mas João inventou algo novo: o mergulho. A novidade trazida por João era já o prenúncio das modificações que JC iria fazer na lei antiga, configurando assim a nova lei de Deus, na qual os rituais exteriores não têm valor, quando não são acompanhados da mudança interna. Os fariseus eram mestres nesse tipo de encenação, valorização da aparência, e censuravam JC e seus discípulos porque, por exemplo, não lavavam as mãos antes de comer, faziam curas no sábado, etc. E JC, por diversas vezes, fez ver a eles que o mal não é o que entra pela pessoa, mas o que sai dela; e disse tb: esse povo louva com os lábios, mas seu coração está lá longe.

E todos nós sabemos, porque o evangelho relata noutra passagem, que o próprio JC foi lá no rio Jordão para ser batizado por João, no início de sua atividade pública, deixando João muito embaraçado, mas apesar disso, Ele se submeteu ao mesmo ritual, para oficializar aquilo, ou seja, para dizer que Ele estava de acordo com aquele procedimento, embora Ele não precisasse 'renascer' como os demais batizados. Mas como Ele queria ser igual a nós em tudo, não deixou que a sua condição divina prevalecesse para ser dispensado. (Foi isso que Paulo afirmou naquele trecho já comentado aqui antes, que é traduzido por 'usurpação', tradução com a qual eu não concordo).

Meus amigos, ao falar em batismo, vem logo aquela tradicional polêmica: por que não se faz mais o mergulho? por que só derrama água na cabeça do batizado? essa é uma grande discussão que envolve católicos e não católicos, por causa da modificação feita pela Igreja de Roma no ritual, afrontando diretamente a figura do batismo de João, referendada pelo próprio JC. Efetivamente, João não batizou crianças, somente adultos. Além disso, João batizou apenas no Jordão. Como fazer isso em outras localidades distantes? qual rio devia ser escolhido no Brasil, por exemplo? Com a expansão do cristianismo, a figura original do batismo precisou ser redesenhada, para atender a novas situações fáticas. Abandonou-se, então, a ideia do mergulho direto e foi adotado o modelo simbólico de molhar a cabeça, afinal, no mergulho, esta é a última parte do corpo que entra em contato com a água e a primeira a sair dela.

Além disso, a Igreja passou a batizar tb crianças bem pequenas, inviabilizando o mergulho total, por razões óbvias. E já que se trata de um símbolo, qualquer água natural pode ser utilizada, devendo ser benzida para esta finalidade. Assim, o ritual joanino do baptizein=mergulhar foi totalmente substituído pelo novo formato. Pode-se dizer que houve 'abuso' de autoridade da Igreja nesta mudança? Os protestantes dizem que sim e continuam a utilizar o mergulho mesmo. Eu tenho um cunhado que aderiu à igreja Adventista e ele foi novamente batizado lá, mostrou-me as fotos, há um tanque cheio de água no qual entra o Pastor e, em seguida, entra o fiel, que é literalmente afundado naquele tanque, tal qual o ritual de João Batista. Ao ver as fotos, eu fiquei a pensar comigo mesmo: já que não é o rio Jordão, então pra ser na água comum, o ritual católico é bem mais conveniente para manter o simbolismo do renascimento. Além de evitar acidentes com o ato de mergulhar, conforme às vezes a gente sabe através da imprensa. Além disso, os protestantes não batizam crianças pequenas, só adolescentes e adultos, mas mesmo assim os riscos de acidentes não podem ser ignorados.

Voltando ao tema central, o segundo domingo do advento nos convida à conversão. Quando nós fomos batizados, nós já renascemos em JC para uma nova vida, um novo céu, uma nova terra. Na crisma, nós tb fomos batizados (mergulhados) no Espírito Santo. Então, através das leituras deste domingo, a liturgia nos convida a refletir sobre a nossa vida de cristãos, em constante estado de conversão. Sim, porque a conversão não é uma atitude única, que se faz uma vez e acabou. A conversão é uma tarefa de cada dia e se concretiza de forma progressiva em cada coisa boa que praticamos, em cada ato de caridade que fazemos, em cada soerguida após alguma recaída, em cada vez que damos exemplo aos outros da nossa vida de cristãos inseridos na sociedade, no trabalho, no lazer, na comunidade, na humanidade globalmente considerada. A exortação do profeta Isaías (preparai os caminhos do Senhor) é nosso chamado neste segundo domingo do advento, para reafirmarmos os nossos compromissos cristãos e para alinhar nossos passos na caminhada para o Pai.

1º DOMINGO DO ADVENTO – VIGILATE (Vigiai) - 27.11.2011



Caros Confrades,

Inicia-se, com o domingo de hoje, o ano litúrgico de 2012, com o primeiro domingo do advento. Para um melhor entendimento deste conceito, transcrevo um trecho colhido da internet: "O tempo do Advento formou-se progressivamente a partir do século IV e já era celebrado na Gália e na Espanha. Em Roma, onde surgiu a festa do Natal, passou a ser celebrado somente a partir do século VI, quando a Igreja Romana vislumbrou na festa do Natal o início do mistério pascal e era natural que se preparasse para ela como se preparava para a Páscoa. Nesse período, o tempo do Advento consistia em seis semanas que antecediam a grande festa do Natal. Foi somente com São Gregório Magno (590-604) que esse tempo foi reduzido para quatro domingos, tal como hoje celebramos."

A palavra deriva do verbo latino 'advenire' que significa 'chegar', portanto, no advento celebramos a espera daquele que vai chegar. Na liturgia, o tempo do advento prepara para o natal, assim como o tempo da quaresma prepara para a páscoa, as duas festas centrais da nossa fé católica: a encarnação do Verbo e a nossa redenção pela morte e ressurreição de Cristo.

Neste primeiro domingo do advento, o tema é a vigilância. Vigiai (vigilate) porque não sabeis a hora em que o dono da casa vai chegar. Na primeira leitura, o profeta Isaías (63, 19) anuncia: ah, se descesses dos céus, as montanhas se inclinariam diante de Ti. O cap 63 de Isaías, conforme já foi comentado aqui, faz parte do deutero-Isaías, ou seja, não foi escrito pelo próprio profeta, mas por seus discípulos, já depois do retorno do cativeiro da Babilônia. Então, o povo já havia superado aquele trauma da escravidão e vivia momentos de esperança. Por isso, diz ele no cap 64, 3 Nunca se ouviu dizer nem chegou aos ouvidos de ninguém, jamais olhos viram que um Deus, exceto tu, tenha feito tanto pelos que nele esperam. 4 Vens ao encontro de quem pratica a justiça com alegria, de quem se lembra de ti em teus caminhos.

O povo retoma seu caminho de espera do salvador prometido, já esquecendo daquele libertador temporal, que foi o rei Ciro, o responsável pela libertação deles da Babilônia. Então, agradecem a Javeh pela restituição da sua liberdade, mas continuam na espera do cumprimento da promessa. No cenário litúrgico, nós celebramos neste período o tempo de espera do Salvador, tal como os hebreus do pós-exílio.

O tema do evangelho de Marcos (13,33) complementa esta atmosfera de espera com a exortação da vigilância, aproveitando a parábola de JC sobre o patrão que foi viajar e deixou os empregados vigiando sua casa, recomendando-os para que não abandonassem o serviço, porque ele retornaria a qualquer momento. Essa recomendação de JC através do evangelho de Marcos nos adverte que a espera da chegada do 'que há de vir' não pode ser aquela atitude de displicência, de espera bocejante e sonolenta, mas espera ativa e participante. Visto que a nossa 'espera' é simbólica, porque a chegada tem data certa e prevista, mesmo assim o nosso comportamento deve ser ativo, preparando os caminhos e aplainando as veredas, como diz outro trecho de Isaías.

O tempo do natal é sempre muito explorado comercialmente, é uma das datas mais festejadas pelos lojistas, ávidos por receber o 13º de todos. Perante a fé, no entanto, esses apelos comerciais não podem ofuscar o verdadeiro sentido da preparação para a chegada do natal, meditando sobre o grande mistério da encarnação, do Verbo divino que se encarnou. É interessante lembrar aqui a expressão grega donde se traduz o conceito de encarnação: "logos sarx egéneto" (a palavra em carne se gerou). Tornar-se carne (sarx) é sinônimo de se materializar. Mas não é uma materialização qualquer, como por exemplo, uma árvore, uma pedra, um líquido, mas a materialização na forma de carne quer dizer na forma humana, na forma de todos nós. A palavra de Deus é tão poderosa que se desprende dele em transforma em um ser autônomo, o Verbo, e este cumprindo a promessa se torna um de nós para nos ensinar a ser mais humanos, para nos humanizar, para mostrar que através da nossa humanização plena, nós estaremos conquistando a vida plena com Ele.

Daí o sentido de vigiar sempre, porque esta humanização é uma tarefa permanente, que dura a vida toda. Cada dia da nossa existência deve ser utilizado para conseguir ascender mais um degrau no caminho da humanização plena. No seminário, nos diziam que nós somos chamados à santidade, e para isso nós devíamos realizar determinadas tarefas de orações, práticas virtuosas e repressão dos sentidos. Hoje nós podemos compreender melhor que a santidade se alcança com uma vida sempre mais humanizada. É a lição que nos traz o mistério da encarnação. Se a carne (humanidade) não fosse valiosa, JC não teria se tornado um de nós, teria tomado a forma de um anjo, um ser incorpóreo. Portanto, nós não precisamos renunciar ao corpo para chegar à santidade, o que precisamos é viver a nossa humanidade de forma equilibrada e justa. Quanto mais nós nos humanizamos, quanto mais aprendemos a ser gente de verdade, mais próximos nós chegamos do ideal da santidade. Por isso, a necessidade da vigilância permanente.

Que Maria, o mais eloquente símbolo da espera do Salvador, nos ensine a vigiar.

34º Domingo Comum – Discurso Escatológico – 20.11.2011



Caros Confrades

Neste 34º domingo comum, último domingo do ano litúrgico, a liturgia nos apresenta o discurso escatológico de JC e no-Lo apresenta como rei do universo (Cristo Rei).

Trata-se de uma curiosa designação, neste tempo em que já não há mais reis e rainhas como nos tempos bíblicos, mas somente reis e rainhas de última grandeza: rei da juventude, rei da música, rei do carnaval... o conceito de realeza está totalmente desfigurado. Prevalece aquela idéia romântica do rei vestido com um longo manto, um cetro na mão e uma coroa na cabeça, é assim que a arte sacra traça a figura de Cristo Rei. Não me parece que tenha sido este o conceito que JC quis expressar quando falou aos discípulos que estaria 'sentado no seu trono glorioso'. Mas foi a figura clássica do rei medieval que ficou retratada na visualização de Cristo Rei do Universo.

Mas a msg mais importante do evangelho deste domingo não é exatamente esta. Foi apenas um comentário paralelo que fiz. A sua leitura traz uma descrição bastante pormenorizada feita por JC acerca das 'coisas que haverão de vir', o que os teólogos classificam como realidades escatológicas. O fim do mundo, o fim de cada um de nós, o julgamento supremo, a recompensa, o castigo, são os temas centrais da escatologia teológica.

Esta imagem do Cristo que voltaria glorioso ficou tão forte nas primeiras comunidades cristãs que alguns fiéis nem queriam mais trabalhar nem assumir nenhuma responsabilidade, porque Ele chegaria a qualquer momento, como se fosse em breves dias. São Paulo teve de pegar pesado com esses cristãos imediatistas. Esse tema, aliás, foi por demais explorado ao longo do tempo pelos comentaristas bíblicos, muitas vezes confundindo a dimensão temporal com a dimensão da eternidade, gerando interpretações insustentáveis acerca do 'tempo' que alguém demoraria no purgatório (por exemplo) até conseguir se purificar de todas as culpas: um ano, cinco anos, dez, cem anos?? já tive oportunidade de expor minha idéia acerca disso em uma msg anterior, quando tratei da antropologização do tempo divino. A Igreja oficializou tal idéia criando o conceito das indulgências parciais e plenárias. Lembro que, naquele tempo, havia um dia do ano em que passávamos o dia inteiro entrando e saindo da capela, porque São Francisco tinha recebido uma visão e pediu a Deus que todos os que entrassem naquele templo e rezassem pelos defuntos, salvariam uma alma. Então, a gente entrava, rezava e saía; entrava de novo, rezava e saía... assim o dia todo, porque a cada vez estaríamos salvando uma alma. Como se a nossa contabilidade terrena, temporal tivesse alguma validade nos páramos da eternidade.

JC é bastante didático no seu discurso escatológico e podemos ver que não tem nada com o que escrevi acima. Na verdade, ele descreve a 'receita', se é que podemos assim dizer, que deve cumprir quem quer ser digno de ser chamado seguidor dele: os benditos (ou bem aventurados, como fala no sermão da montanha). E a receita é esta: "Vinde benditos de meu Pai! Recebei como herança o Reino que meu Pai vos preparou desde a criação do mundo! Pois eu estava com fome e me destes de comer; eu estava com sede e me destes de beber; eu era estrangeiro e me recebestes em casa; eu estava nu e me vestistes; eu estava doente e cuidastes de mim; eu estava na prisão e fostes me visitar'." E os malditos perguntaram: Senhor, quando foi que te vimos assim e não te socorremos? Resposta: todas as vezes que deixastes de fazer isso ao irmão mais pequenino.

Meus amigos, JC está fazendo um pré-julgamento, ou melhor, ele está dizendo claramente sob que critérios nós seremos julgados. Ele não disse: aquele que assistir mais missas, nem aquele que comungar mais vezes, nem aquele que rezar mais pai-nossos de joelhos... Por favor, não me entendam mal, não estou dizendo que isso não vale nada. Estou apenas tentando esclarecer o que JC colocou como paradigma para o julgamento dos cristãos: a caridade, a partilha, a paciência, o serviço, a doação, o amor principalmente para aqueles mais humildes e carentes. É muito fácil 'ver' JC na hóstia consagrada, na figura do Papa, nas imagens religiosas; mas Ele quer que nós o 'vejamos' no irmão e façamos para este irmão o que nós faríamos se o próprio JC estivesse na nossa frente.

Outra coisa. Este 'julgamento' não vai acontecer num determinado dia, num determinado ano, como alguns 'profetas' de antes e de hoje tentam nos fazer crer. Quantas vezes já foram previstas datas para o 'fim do mundo' e nada aconteceu? O ressoar da trombeta vindo do mais alto dos céus não será um fenômeno cósmico e universal, mas uma realidade particular para cada ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus. A colocação das ovelhas à sua direita e dos cabritos à sua esquerda, simbolizando os benditos e os malditos respectivamente, a recompensa e o castigo eternos, não é algo que irá ocorrer num dia determinado de um ano determinado para todos os homens ao mesmo tempo, mas é um enfrentamento que cada um de nós deverá fazer, quando passarmos pelo portal que dá acesso à eternidade. Lá, as fileiras já estão formadas e quem for chegando já vai sendo direcionado para a sua devida posição.

Alguém pode perguntar: por que, então, JC usa uma linguagem tão direta, tão concreta para explicar isso? ao meu ver, a resposta é simples: porque ele se dirigia a pessoas de poucos conhecimentos, pessoas simples, numa linguagem de fácil compreensão. Tanto assim que, nos primeiros tempos, isso era interpretado de forma absolutamente literal e os primeiros cristãos pensavam que esse dia seria amanhã, depois de amanhã talvez... com o passar dos anos, a reflexão teológica foi aprendendo a compreender esta lição de um modo mais erudito e menos temporalizado, quanto dá a entender a metáfora à primeira vista.

Neste último domingo do período litúrgico, a leitura do evangelho nos ensina duas lições, que eu considero fundamentais: primeira lição, que nós devemos sempre enxergar JC no irmão, no próximo, no semelhante, quanto mais isso possa nos parecer impossível. Enxergando JC no irmão e fazendo por ele o que faríamos por JC em pessoa estará nos habilitando como cristãos autênticos; segunda lição, que o nosso 'cartaz' diante de JC vai depender da nossa capacidade de percebê-LO nos irmãos e agir gratuitamente, sem almejar recompensa, conforme o próprio JC já nos ensinou noutro discurso, a saber: não saiba a tua mão direita o que faz a tua esquerda, nos lembrando que devemos agir por amor e não em espera de alguma recompensa.

Que o Mestre nos ensine a ser verdadeiras 'ovelhas' e nos favoreça com a mágica de poder transformar cabritos em ovelhas, com o nosso exemplo de um agir verdadeiramente cristão.

33º DOMINGO COMUM – NOSSOS TALENTOS - 13.11.2011



Caros Confrades,

A liturgia deste domingo (33º comum) nos convida a refletir sobre os nossos talentos. Importa, de início, esclarecer que 'talento', na época de JC, era um conceito financeiro, um padrão monetário que correspondia a aproximadamente 35 kg de ouro. Se avaliarmos no mundo atual, corresponderia a uma elevada soma, pois um grama de ouro custa em torno de $50 reais, desse modo, um talento valeria na nossa moeda cerca de $175.000 reais. Portanto, JC vai se aproveitar de um linguajar da economia para relacionar com o anúncio do reino de Deus.

Na primeira leitura, temos a referência à mulher forte (Provérbios 31,10), que trabalha habilmente com o fuso e com os tecidos, que administra a casa e não deixa faltar nada, mas ao mesmo tempo, também atende o pobre e o necessitado. Bela, trabalhadora e caridosa. É a sabedoria antiga elogiando as qualidades da mulher virtuosa, num contexto simbólico da autêntica economia (em grego, oikos-lar e nomos-regra formam o verbo oikonomeô=administrar a casa, comandar a casa). É o que corresponde à designação dos dias atuais da profissão 'do lar' daquela mulher que exerce sua atividade laborativa dentro de casa, administrando o lar, uma profissão em declínio, mas ainda muito comum no nosso sertão. Por outras palavras, o conceito de mulher forte não está ligado à força muscular, mas à competência com que ela gerencia as tarefas domésticas, sob a plena confiança do seu marido. Sob um certo aspecto, ela está pondo pra render os talentos ($$$) da casa, enquanto o marido exerce uma atividade externa para o sustento da família. Com suas mãos hábeis e sua capacidade produtiva, ela multiplica as reservas financeiras adquiridas pelo marido. Podemos dizer, portanto, que a figura da mulher forte tem total relação com a parábola dos talentos, narrada no evangelho de Mateus (25,14). Curiosamente, essas imagens da mulher exemplar, presentes em outras passagens do AT (por ex: Sarah, Débora, Judite, Ester) não foi igualmente reverenciada no NT. Afora a figura ímpar de Maria, as demais citadas sempre exerceram papéis de coadjuvantes (Madalena, Marta e sua irmã Maria). Podemos observar nesse fato um incremento do machismo na comunidade judaica no tempo de JC, ao ponto de não se abrirem espaços para a 'mulher forte' do AT.

No evangelho, temos a conhecida parábola dos talentos. O patrão, antes de viajar, distribuiu com seus empregados certa quantidade de talentos, de acordo com a competência de cada um. Os dois, que ganharam mais, também conseguiram tirar maior proveito do que receberam, enquanto o que recebeu um só o enterrou e apenas o devolveu, fato que desagradou bastante o chefe.
Não poucas vezes, JC faz uso de exemplos ligados ao mundo econômico-financeiro para tirar conclusões relacionadas com a sua doutrina, por ex: os trabalhadores da vinha, o administrador infiel, a moeda de Cesar... mas nesta parábola foi introduzido um conceito novo, até contraditório em relação ao que o cristianismo sempre ensinou: a usura. O que recebeu cinco talentos 'lucrou' outros cinco; o que recebeu três 'lucrou' outros três; ao que devolveu o único talento recebido, o chefe diz: por que não entregaste a um banco, para que eu recebesse os juros? Aos meus ouvidos, soa de uma forma estridente esse linguajar. Com certeza, JC estava fazendo uso de conceitos mais fáceis de serem entendidos pelo povo, pois não se pode concluir que ele estivesse aprovando o depósito de capital a juros bancários.

Pois bem, abstraindo dessa conotação monetarista, temos na parábola dos talentos o estímulo e o reconhecimento daqueles que trabalham e administram com competência os bens recebidos, semelhante à imagem da mulher forte, do livro dos Provérbios. Não quero me referir ao conceito de 'talentos' no sentido intelectual, como muitas vezes nos ensinaram no seminário. Penso que JC estava se referindo mesmo aos bens materiais, que algumas pessoas têm mais do que outras. Todos se lembram que, em outra passagem, quando Judas comentou: por que não vendemos esse perfume e distribuímos o dinheiro com os pobres? JC discordou e disse que 'pobres sempre tereis entre vós' (João 12,8). Entendo que JC admitiu ali que a distribuição dos bens materiais nunca seria feita de modo isonômico.

Pois bem, os talentos ou os recursos materiais, com os quais Deus nos favorece, devem nos ajudar a trilhar com mais serenidade e firmeza o caminho da virtude, não para nos afastar dele. Podemos associar com isso o conceito de 'pobres de espírito' exposto no sermão da montanha, no domingo passado. Atualmente, há um conceito sociológico bem apropriado para essa situação, que é o de responsabilidade social. Ter uma boa condição de vida, materialmente falando, deve nos dar a consciência do dever de contribuir com aqueles que, por diversas conjunturas, não obtiveram tanto quanto nós. Numa forma bem radical, foi o que fez Francisco em relação aos bens de seu pai Pedro Bernardoni. Se nós não temos essa mesma virtude, pelo menos devemos ter a disponibilidade para servir, a oferta financeira para as ações sociais da Paróquia e de entidades que atuam em trabalhos assistencialistas, o apoio aos menos aquinhoados da nossa própria família, a ajuda aos irmãos através das obras de caridade. Não podemos deixar que a ganância e a avidez do lucro nos tornem escravos dos nossos bens materiais, porque assim os estamos enterrando.

E aqui entra a exortação do apóstolo Paulo, na segunda leitura (1 Tessalonisences 5,1): não deixeis que o dia do Senhor vos surpreenda como um ladrão, de noite. Vós sois filhos da luz e do dia, não somos filhos da noite nem das trevas. Quando nos tornamos escravos dos nossos bens, estamos enterrando nossos talentos, então já não somos mais filhos do dia.

Esses fatos nos fazem lembrar de outra advertência de JC noutra passagem, quando o jovem rico não quis se desfazer dos seus bens, e Ele comentou: é mais fácil um camelo passar no fundo de uma agulha... Ele sabia o quanto os bens materiais podem servir de empecilho à prática das virtudes cristãs. Mas nós, que tivemos acesso a uma formação humana e intelectual diferenciada, mercê de nossa passagem pelo seminário, formação esta que, aliada ao esforço de cada um, nos fez alcançar condições dignas de vida na sociedade, devemos também ter aprendido a administrar esses talentos, sem jamais os enterrar, mas sempre os colocando à disposição dos irmãos. Vale outra vez recordar a exortação de Paulo aos Tessalonicenses: Portanto, não durmamos, como os outros,mas sejamos vigilantes e sóbrios, para que o dia do Senhor não nos surpreenda.