quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

27º Domingo Comum - 02.10.2011 - A parreira de Javeh


Caros Confrades,

As leituras deste domingo estão em plena sintonia com a história da parreira de Javeh, primeiramente, em Isaías 5,1 e depois em Mateus 21,33. Essa repetição da história demonstra que JC conhecia bem as escrituras e, mais uma vez, tb demonstra uma predileção especial de JC pelo livro de Isaías.

Sempre é bom lembrar, para contextualizar, que o livro de Isaías foi escrito quando o povo hebreu estava cativo na Babilônia, no tempo de Nabucodonosor. O povo ficava praguejando contra Javeh e Ele, através dos seus Profetas, levava o povo a despertar a consciência para que compreendessem que tudo aquilo havia sido provocado pela infidelidade deles, não por castigo de Javeh. E tb através dos profetas, Javeh os convidava à conversão e ao cumprimento da lei, porque desse modo encontrariam a libertação.

Quando leio esse trecho, me lembro dos salmos musicados por J. Gelineau, que cantávamos no Seminário e que tem uma melodia muito bonita: "Meu amado possui uma vinha em um outeiro fertilíssimo." A música está aqui na minha cabeça, só não tem como transcrevê-la com palavras, deve brotar na cabeça de vcs tb. Pra nós do nordeste, a figura da parreira não é tão familiar, embora no jardim do Seminário sempre se encontrasse uma, obra dos nossos antecessores italianos. Mas lá no Rio Grande do Sul, na serra gaúcha, o parreiral vai além do que a vista alcança. Pois bem, aconteceu que os vinhateiros (os hebreus) não cuidaram bem do parreiral e, ao invés de uvas boas, estava produzindo uvas selvagens, frutos do mato.

Quem conhece maracujá do mato (na beira da lagoa de Messejana, tinha) sabe que é intragável, nem se compara com a fruta boa. Então, o que fez o dono? derrubou a cerca de proteção e deixou que os javalis a devastassem e os passantes a pisoteassem. Em vez de uvas, terá espinhos e carrapichos. E os vinhateiros foram parar na escravidão. A denúncia do Profeta era para que o povo hebreu abrisse os olhos para reconhecer que a desgraça que recaiu sobre eles foi consequência dos seus próprios atos e que, retornando ao cumprimento da promessa, o parreiral voltaria a ser protegido pelo seu dono.

No evangelho, JC repetiu a mesma historinha de Isaías, acrescentando alguns detalhes pedagógicos para que a lição ficasse ainda mais clara. Quando o dono do parreiral mandou verificar a colheira e viu que a produção era de uvas selvagens, mandou seus empregados (os profetas) para ajudarem no cuidado da plantação. Os vinhateiros (o povo hebreu) os espancaram e os mataram. Então o dono pensou: vou mandar meu filho, esse eles respeitarão. Que nada, foram com ele ainda mais cruéis. Então, o que resta para o dono fazer? vai arrendar a vinha a outros vinhateiros (os pagãos), para que os bons frutos sejam produzidos. E JC foi bastante ríspido com os sacerdotes e anciãos: por isso o reino de Deus será retirado de vocês e será entregue a um povo que produzirá frutos. Nesse momento, JC não estava mais falando em linguagem alegórica, era discurso direto, mesmo assim os fariseus não compreenderam.

Meus amigos, fazendo a relação transistórica, daquela msg de Isaías, reproduzida e ampliada por JC, para nós hoje, ela vem nos dizer que nós não devemos ter ouvidos surdos, como tiveram os fariseus daquele tempo, se não o reino nos será tirado para ser entregue a outro povo. Esta conclusão está na mesma linha da que tivemos no domingo passado, quando JC disse que os publicanos e as prostitutas vos precederão no reino dos céus. Daí vem aquela célebre polêmica iniciada por Lutero e continuada ainda hoje por seus seguidores, no sentido de que basta a fé para se ter a salvação. Lembremos da exortação do apóstolo Tiago: a fé sem as obras é morta. A salvação não é um ato que nos alcança de uma vez por todas como um encantamento. A redenção de JC, esta sim nos alcança por inteiro, mas a sua repercussão em nós vai depender da nossa adesão. E a adesão não significa apenas a fé, mas a fé ativa. Nesse sentido, a salvação é uma construção na qual passamos a vida inteira trabalhando, a cada dia colocando mais um tijolinho. A redenção de JC foi operada uma vez só, na perspectiva da eternidade, e sendo assim atinge todas as pessoas em todos os tempos. Mas a salvação de cada um é obra nossa.

Ninguém pode supor que já está entre os 144 mil assinalados, referidos no Apocalipse, e então deitar na rede e esperar o dia da salvação chegar, não é bem assim. Os frutos bons devem ser produzidos constantemente e para isso, a vinha deve ser cultivada sem descanso, adubada, regada, capinada, protegida. A salvação é lida diária, é compromisso que está sempre se renovando. Tanto na fabula de Isaías quando na parábola de JC, o dono da vinha é bastante duro com os vinhateiros que descuidaram da sua tarefa. Deus não é condescendente com quem não realiza o seu ofício.

Na carta aos Filipenses, Paulo nos ensina como deve ser a verdadeira oração: "apresentai as vossas necessidades a Deus, em orações e súplicas, acompanhadas de ação de graças". Rezar deve ser sempre em primeiro lugar, dar graças a Deus pelos dons recebidos. Só depois, apresentar as necessidades e fazer os pedidos. Nunca a oração deve ser um rosário de lamentações e queixas a Deus, porque os infortúnios que nos assolam, tal como na história dos vinhateiros, são fruto das nossas próprias ações. Rezar deve ser um momento de acerto da trajetória da nossa vida, concretizar na nossa vida o ensinamento de JC; o reconhecimento das nossas faltas e fraquezas é o primeiro passo para a retomada da direção correta. E então, poderemos contar com a força libertadora de Deus para continuar o trabalho na Sua vinha.


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